Apesar da desaceleração da inflação em várias regiões, o impacto acumulado dos últimos anos ainda pesa sobre o orçamento das famílias. Embora alguns consumidores estejam a conseguir recuperar a sua estabilidade financeira, uma parte significativa da população continua a sentir os efeitos do aumento dos preços e da redução do poder de compra. A desigualdade económica torna-se, assim, um fator crucial para entender os padrões de consumo e as estratégias das empresas na conquista e retenção clientes.
Esta é uma das conclusões da NielsenIQ (NIQ), no seu relatório “Mid-Year Consumer Outlook: Guia para 2025”, divulgado nos últimos meses de 2024, que apresenta uma análise detalhada sobre o comportamento dos consumidores e as tendências emergentes que devem moldar o mercado nos próximos meses. O estudo destaca a forma como os consumidores enfrentam os desafios económicos, redefinem as suas prioridades e adotam novas abordagens na hora de comprar. Além disso, a pesquisa oferece insights estratégicos para as marcas que desejam fortalecer o seu posicionamento e adaptar-se a um cenário de crescente incerteza.
Resiliência em tempos incertos
Nos últimos seis meses, a perceção negativa sobre a situação financeira pessoal apresentou uma leve melhoria. Atualmente, 32% dos consumidores globais afirma estar financeiramente pior do que no ano anterior, um número inferior ao registado no início de 2024.
Apesar dessa recuperação, os desafios permanecem, uma vez que a inflação dos últimos anos impactou permanentemente o custo dos bens essenciais. Para ilustrar essa mudança, a NIQ aponta que um carrinho de compras que custava 100 dólares (aproximadamente 93 euros) em 2022 agora exige pelo menos 117 dólares (aproximadamente 109 euros) para ser preenchido com os mesmos produtos.
A desigualdade no impacto financeiro da crise também se reflete no facto de que 27% dos consumidores globais se considera financeiramente seguro, um aumento em relação aos 21% registados no ano anterior.
Entretanto, este dado não significa que a estabilidade financeira seja uma realidade para a maioria. A crescente busca por novas fontes de rendimento mostra que muitas pessoas ainda enfrentam dificuldades para manter o seu nível de consumo: 64% dos consumidores entrevistados afirma ter procurado maneiras de complementar os seus rendimentos, seja através de trabalhos adicionais ou de investimentos.
Novo significado do “desconto”
A forma como os consumidores percebem o valor das suas compras está a mudar. Antes, o termo “desconto” estava fortemente associado ao menor preço absoluto, mas agora há uma preocupação crescente com o equilíbrio entre custo e benefício. O estudo da NIQ revela que 65% dos consumidores globais prefere comprar embalagens maiores para reduzir o custo por unidade, enquanto 52% opta por embalagens menores devido ao menor desembolso inicial. Esta tendência reforça que, mais do que apenas procurar preços baixos, os consumidores avaliam se a compra oferece um real valor em termos de quantidade e qualidade.
De facto, o comportamento do consumidor está cada vez mais híbrido. As promoções tradicionais continuam a ser um fator relevante na decisão de compra, mas há uma crescente exigência de transparência e flexibilidade na oferta. Empresas que conseguirem oferecer produtos e serviços adaptáveis, permitindo ao consumidor otimizar os seus gastos sem comprometer a qualidade, terão mais possibilidades de se destacar nesse novo cenário.
4 tendências que vão moldar o consumo em 2025
O relatório da NIQ aponta quatro tendências emergentes que devem transformar a forma como consumidores e marcas interagem este ano. A primeira é o impacto dos medicamentos para perda de peso baseados em GLP-1, que estão a afetar os padrões de consumo alimentar, reduzindo a procura por determinados produtos e alterando hábitos de compra.
Por outro lado, o crescimento do comércio social e das experiências gamificadas está a redefinir o relacionamento entre consumidores e marcas, tornando as compras mais interativas e personalizadas.
Além disso, e apesar dos avanços tecnológicos, 56% dos consumidores globais diz evitar partilhar dados pessoais online devido a preocupações com privacidade e segurança digital. Essa resistência pode impactar as estratégias de marketing personalizadas e a adoção de novas tecnologias pelas marcas.
A quarta e última tendência é o aumento dos custos das commodities. A alta nos preços das matérias-primas impacta diretamente os preços finais dos produtos e a oferta no retalho, exigindo novas estratégias das empresas para manter a competitividade.
Como as marcas devem responder às mudanças?
Diante desse novo cenário, a NIQ destaca algumas ações estratégicas que podem ajudar as empresas a manterem o crescimento e conquistarem consumidores num ambiente de alta concorrência.
Primeiramente, as marcas devem evitar depender excessivamente de promoções, pois o relatório indica que as reduções de preços muitas vezes não impulsionam o crescimento sustentável do volume de vendas. Em vez disso, as empresas devem focar em maximizar o sortido, oferecendo opções acessíveis para consumidores com diferentes níveis de poder de compra.
A inovação também será um diferencial competitivo. Empresas que investem constantemente no desenvolvimento de novos produtos e soluções têm 1,8 vezes mais possibilidades de aumentar as suas vendas totais, segundo a NIQ. Desta forma, a diversificação de portefólio e a adaptação às tendências de consumo serão fundamentais para manter a relevância no mercado.
Além disso, com a crescente digitalização do consumo, as marcas precisam de atingir os consumidores onde eles estão, seja no e-commerce tradicional, nas redes sociais ou em experiências de compra híbridas. O aumento das compras via redes sociais, por exemplo, reforça a necessidade de estratégias digitais mais eficientes e personalizadas.
Por fim, a NIQ destaca a importância do bem-estar como fator de decisão de compra. Com o aumento do interesse dos consumidores por produtos saudáveis e sustentáveis, as marcas que conseguirem posicionar-se de forma autêntica nesse segmento terão uma vantagem significativa.
Adaptação é a chave para 2025
O estudo da NielsenIQ deixa claro que o comportamento do consumidor continuará a evoluir rapidamente nos próximos meses, exigindo das marcas uma abordagem mais flexível e orientada por dados. A resiliência financeira dos consumidores, as novas definições de valor e o impacto das tecnologias emergentes moldarão o futuro do retalho e da indústria de bens de consumo.
As empresas que conseguirem antecipar essas mudanças e adaptar as suas estratégias terão uma posição privilegiada no mercado. Investir em inovação, criar ofertas mais segmentadas e compreender as verdadeiras motivações dos consumidores serão fatores decisivos para alcançar o sucesso num cenário de desafios, mas também de grandes oportunidades.