A retenção de talento no retalho

Talento no retalho
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A retenção de talento é um sinal de sucesso para uma organização. Afinal, assim pode reduzir os custos de recrutamento e de formação inerente à entrada de novos colaboradores e melhorar a moral e a produtividade das equipas. No contexto do retalho, onde as taxas de rotatividade tendem a ser mais elevadas em comparação com outras indústrias, a retenção de talento é particularmente importante. Os retalhistas investem recursos no recrutamento e na formação dos colaboradores, pelo que a sua retenção é crucial para manter a eficiência operacional, a satisfação do cliente e, em última análise, a rentabilidade. Esta é uma gestão de recursos humanos que engloba várias práticas e iniciativas que, dizem-nos as principais insígnias a operar no mercado português, incluem a promoção do equilíbrio entre a vida profissional e pessoal, a remuneração competitiva, o fomento de uma cultura de trabalho positiva e a oferta de oportunidades de progressão na organização.

 

Para o retalho e a gestão das suas forças de trabalho, 2024 não chega sem os seus desafios. De acordo com José Pedro Fernandes, vice-presidente da Sisqual, criadora do produto de software de Workforce Management – WFM, a transformação digital e a automatização são dos principais desafios e tendências deste ano para os retalhistas, sendo essencial providenciar formação adequada para a utilização de novas ferramentas digitais. “A adoção da inteligência artificial para a otimização de operações e a tomada de decisões pode levar a novas competências e formação para a equipa”, diz o responsável.

“A gestão de uma força de trabalho diversificada requer especial atenção à inclusão, necessitando de formação sensível à diversidade e do fomento de um ambiente de trabalho equitativo, algo que apenas pode ser conseguido com as ferramentas certas. Além disso, a escassez de mão-de-obra qualificada pode representar um desafio e as empresas devem insistir na retenção dos seus colaboradores, apostando em oferecer-lhes uma melhor qualidade de vida. Mudanças nas expectativas dos trabalhadores em relação a benefícios, equilíbrio entre trabalho e vida pessoal e flexibilidade no local de trabalho impactam esta dinâmica. Por fim, a implementação de uma estratégia omnicanal torna-se crucial, à medida que os consumidores procuram experiências de compra integradas em diversos canais, exigindo uma gestão eficaz para oferecer um serviço consistente em todos os pontos de contacto”, assegura José Pedro Fernandes.

 

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Novas competências

Para o Pingo Doce, insígnia do Grupo Jerónimo Martins, a formação da força de trabalho é uma das apostas para o futuro. “Estamos a fazer o ‘reskilling’ da nossa força de trabalho, equipando-a com competências técnicas, tecnológicas e digitais. Assim, o tempo de trabalho de um colaborador é cada vez menos ocupado com tarefas de preparação e mais direcionado para tarefas que acrescentam valor ao serviço, principalmente o atendimento ao cliente”, refere Marísia Giorgi, diretora de Recursos Humanos do Pingo Doce. “Continuamos a apostar na evolução do negócio no Pingo Doce, principalmente na área de restauração e da comida pronta. Neste contexto, estamos a melhorar os nossos processos e métodos de trabalho, otimizando e melhorando o dia-a-dia das nossas pessoas, mas garantindo sempre que damos formação adequada e que as equipas estão confortáveis com os procedimentos”.

“As nossas pessoas estão no centro de tudo”, diz a responsável do Pingo Doce, um dos maiores empregadores em Portugal, no âmbito da distribuição alimentar, com mais de 31 mil colaboradores. A insígnia acredita no desenvolvimento através da formação, potenciada pela Escola de Formação Jerónimo Martins, que conta com 170 formadores e que, só no ano passado, deu mais de um milhão e 650 mil horas de formação.

Para a insígnia, a atratividade e a retenção do talento começam pela diversidade de funções oferecida, para perfis e níveis de experiência muito variados. “Acreditamos que o sucesso se faz através de conhecimento específico da nossa área de atuação e este conhecimento vem muito de pessoas que cresceram connosco. A grande maioria dos diretores executivos do Pingo Doce é fruto de mobilidades internas e exemplo de percursos diversificados, que inspiram os nossos colaboradores. Apostamos na mobilidade interna como principal instrumento de desenvolvimento e na construção de ‘pipelines’ de sucessão”.

Assim, o Pingo Doce aposta em oferecer oportunidades de crescimento e desenvolvimento profissional e incentiva os colaboradores a candidatarem-se a oportunidades de mobilidade interna, para poderem crescer com a empresa. “Identificamos potencial e traçamos planos de desenvolvimento personalizados para os nossos colaboradores, tendo inclusive programas de formação específicos para quem pretende abraçar desafios de maior responsabilidade, tanto que mais de 90% das nossas funções de liderança nas operações é fruto de progressões internas”.

A insígnia investe ainda em programas de apoio direto aos colaboradores, suportando-os em momentos de vulnerabilidade, com ações direcionadas para três eixos: saúde, educação e bem-estar familiar. Nomeadamente, em programas de responsabilidade social com diversas iniciativas, tais como campos de férias para os filhos dos colaboradores, tratamentos dentários, creches gratuitas nos armazéns, oferta do “meu primeiro kit” (que inclui um cartão-presente no valor de 150 euros e uma mochila com várias ofertas para o bebé e a mãe) e kit escolar, serviços de enfermagem e cuidados médicos para famílias com membros portadores de deficiência, apoio a famílias em caso de situação de doença oncológica, entre outras medidas. Criou ainda, em 2011, o Fundo de Emergência Social, para apoiar os colaboradores em momentos críticos.

Ao nível do bem-estar, temos inúmeros serviços que estão disponíveis para todos os colaboradores, como serviço de teleconsulta, programa de nutrição clínica, programa de saúde mental, Centros de Prevenção e Reabilitação Física nos nossos centros logísticos na Azambuja e em Alfena e Curso de Preparação para a Parentalidade, apenas para nomear alguns exemplos”, afirma a diretora de Recursos Humanos do Pingo Doce. “O grupo tem uma forte consciência social e um dos pontos que nos diferencia, enquanto empregador, é o facto dos nossos colaboradores saberem que podem contar connosco em todas as fases da sua vida”.

“Identificamos potencial e traçamos planos de desenvolvimento personalizados para os nossos colaboradores, tendo inclusive programas de formação específicos para quem pretende abraçar desafios de maior responsabilidade, tanto que mais de 90% das nossas funções de liderança nas operações é fruto de progressões internas”

 

Progressão de carreira

Apesar do sector da distribuição alimentar ser visto como um sector de elevada rotatividade para os colaboradores de loja e centros de distribuição, no Pingo Doce, 81% é efetivo e tem uma senioridade média de nove anos, adianta Marísia Giorgi, o que se traduz numa força de trabalho com um bom equilíbrio entre conhecimento, experiência e novos colaboradores. Este mix garante a continuidade da cultura e a partilha dos valores pelas equipas. “Temos cinco gerações na nossa força de trabalho e mais de 60 nacionalidades com diferentes expectativas, formas de trabalhar e necessidades”, sendo que a principal causa de saída voluntária de colaboradores é a procura de oportunidades de emprego na área de formação. “Este é um motivo que nos deixa muito confortáveis, porque percebemos que muita gente confia no Pingo Doce para ser seu empregador, enquanto estuda ou está a fazer formação noutras áreas, e precisa de um emprego que seja flexível e que se adapte a horários menos convencionais, para que possa prosseguir com os estudos”.

Na Auchan, atualmente, o “turnover” é de 18%, sendo que em 2008 era de 5%. “Sabemos que é uma realidade transversal a Portugal, e até ao mundo, pelo que nos cabe adaptar ao contexto que vivemos: sabemos que o ‘turnover’ veio para ficar e o mais importante é garantir que este nos é saudável”, confirma Clara Costa, diretora de Pessoas, Cultura e Transformação da Auchan.

A responsável destaca que o sector do retalho é desafiante. No entanto, para ser atrativo, tem de responder a alguns critérios essenciais. “Para nós, os valores da empresa, a sua cultura organizacional, as políticas que promovem a diversidade (quatro gerações, culturas e origens diferentes, integração de pessoas com deficiência, entre outros aspetos), a igualdade de género, a sustentabilidade e a certificação em responsabilidade social – norma SA 8000 – , o estilo de liderança, o equilíbrio entre a vida pessoal e profissional, que fomos implementando ao longo dos últimos 20 anos, são peças essenciais para nos afirmarmos como uma empresa que atua por um propósito, para um bom clima social, uma relação mais solidária entre todos os colaboradores e um nível de envolvimento com a empresa muito elevado”. De acordo com Clara Costa, ronda aproximadamente 80%.

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A aposta da Auchan passa pela promoção de uma cultura que integra os princípios da igualdade e da diversidade. Adianta Clara Costa que há mais de 20 anos que o grupo desenvolve um conjunto de práticas que promovem uma empregabilidade responsável e inclusiva, sendo a única empresa do sector da distribuição, em Portugal, certificada em responsabilidade social desde 2006, segundo a norma SA8000, um referencial que promove boas práticas laborais e de direitos humanos, interna e externamente, junto dos fornecedores e parceiros. Adicionalmente, desenvolve ações de integração e de inclusão social de pessoas em situação de vulnerabilidade no mercado de trabalho, nomeadamente com deficiência ou incapacidade, em situação de desemprego e refugiados. “A assinatura do Compromisso com a Inclusão, em 2021, representou um marco significativo para a Auchan, promovendo uma mudança fundamental na nossa consciencialização e abordagem em relação à inclusão. Ao refletir sobre este compromisso, identificámos as áreas em que poderíamos apostar e implementámos iniciativas destinadas a aprimorar a integração de pessoas com deficiência”.

Na Auchan, atualmente, o “turnover” é de 18%, sendo que em 2008 era de 5%. “Sabemos que é uma realidade transversal a Portugal, e até ao mundo, pelo que nos cabe adaptar ao contexto que vivemos: sabemos que o ‘turnover’ veio para ficar e o mais importante é garantir que este nos é saudável”

 

Equilíbrio entre a vida profissional e pessoal

Na raiz da saída voluntária de colaboradores, em particular os colaboradores de loja, estão essencialmente dois fatores: o facto de não pretenderem trabalhar por turnos e o facto de não pretenderem trabalhar aos sábados e domingos, dias considerados de descanso por excelência. E, além disso, a preocupação crescente em conseguir um maior equilíbrio entre a vida pessoal e a profissional, enumera a diretora de Pessoas, Cultura e Transformação da Auchan. “Naturalmente que os horários de trabalho podem ser um desafio, que tentamos compensar com práticas de conciliação. Afinal de contas, mais de metade do país trabalha por turnos. A cultura de proximidade e de abertura da empresa, e o facto de ser a melhor escola em diversas profissões, pode e deve ser a âncora da atratividade, apoiando os colaboradores nesta gestão, tornando-a o menos desafiante possível”.

A alta rotatividade de funcionários é algo que assistimos em vários sectores e a Auchan lida com esta questão com naturalidade. Com um mercado em constante movimento, a empresa acredita que é sua responsabilidade definir bem as prioridades e trabalhar sob essa base. “Assim, é importante reter os nossos talentos, as nossas pessoas, mas também ser cada vez mais ágeis e eficazes a dar resposta a esta rotatividade. Na Auchan, temos vindo a investir na simplificação e otimização de processos, nomeadamente através da aposta na tecnologia, mas reforço que priorizamos e investimos – de forma indiscutível – na experiência do colaborador, pois é evidente o impacto positivo na sua integração e fidelização a curto-médio prazo”.

Outra mudança veio com a pandemia de Covid-19 e a forma como este período alterou a perceção de satisfação e bem-estar dos colaboradores. Segundo Clara Costa, se há 10 anos a preocupação com a saúde das equipas eram os acidentes de trabalho e garantir um seguro de saúde para as famílias, atualmente, é conhecer e atuar na sua saúde mental.

Aliado a tudo isso, hoje, o suporte tecnológico tomou conta de muitos processos e da forma como se comunica, destaca. “Acreditamos que o teletrabalho tem o seu papel, nomeadamente como um meio para facilitar o equilíbrio entre a vida pessoal e profissional. Na verdade, tudo mudou, mas as prioridades continuam as mesmas: as pessoas – os colaboradores, os clientes e os nossos parceiros”.

“Somos muito atentos ao nosso ‘employee experience’ e, ao longo do tempo, temos identificado iniciativas que visam aumentar a satisfação dos nossos colaboradores. Sabemos que ‘one size doesn’t fit all’ e, por isso, as nossas iniciativas são endereçadas a diferentes colaboradores”

 

Transparência e consistência

Por sua vez, a MC, dona da insígnia Continente, tem como foco conhecer os seus colaboradores e ter muito bem mapeado e identificado aquilo que mais valorizam. “Conhecemos os pontos onde somos já muito fortes e aqueles que temos possibilidade de desenvolvimento. Somos muito atentos ao nosso ‘employee experience’ e, ao longo do tempo, temos identificado iniciativas que visam aumentar a satisfação dos nossos colaboradores. Sabemos que ‘one size doesn’t fit all’ e, por isso, as nossas iniciativas são endereçadas a diferentes colaboradores, para desta forma garantirmos uma maior abrangência de satisfação e, consequentemente, diminuição da saída voluntária”, explica Sara Dias, Area Leader of People da MC.

As principais motivações e expectativas dos colaboradores do retalho, geralmente, incluem variáveis como a remuneração e os benefícios, o reconhecimento, as oportunidades de desenvolvimento, o equilíbrio entre a vida pessoal e profissional, bem como um ambiente de trabalho positivo. Por isso, a MC mantém-se atenta às necessidades dos colaboradores e tem definido um conjunto de iniciativas que pretendem abranger as diferentes realidades. “Em primeiro lugar, valorizamos a importância do reconhecimento e o impacto do feedback constante no desenvolvimento pessoal e profissional das nossas equipas. Desta forma, reconhecemos o trabalho das nossas pessoas através de momentos onde celebramos as pequenas conquistas do dia-a-dia”, refere a responsável. “Outro aspeto muito valorizado é a possibilidade dos nossos colaboradores poderem ter diferentes experiências profissionais, ainda que dentro da mesma empresa. Nesse sentido, promovemos a mobilidade interna através do nosso programa ‘Damos asas ao talento’. Comunicamos de forma clara e transparente todas as oportunidades de mobilidade interna, incentivamos a que o próprio seja o principal responsável pelo seu desenvolvimento profissional e clarificamos, junto do mesmo, o vasto leque de oportunidades que temos internamente”.

Outro ponto é a questão do desenvolvimento de novas competências. Atualmente, a MC disponibiliza um conjunto de ferramentas de “self-learning”, que permite que o colaborador desenvolva diferentes competências, seja através de “resklling” ou “upsklling”, o que leva, consequentemente, a que experiencie diferentes funções e responsabilidades dentro da empresa. “Sabemos que nada disto é possível sem a promoção de políticas e práticas que incentivem um equilíbrio saudável entre a vida pessoal e profissional dos nossos colaboradores. Nesse sentido, promovemos medidas de trabalho flexível e a possibilidade de diferentes modelos de trabalho para uma melhor gestão da vida pessoal e profissional”, assegura.

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Tecnologia

As soluções tecnológicas são vistas como opções extremamente válidas para acrescentar valor ao dia-a-dia das empresas da distribuição alimentar. “A MC conta com uma plataforma que permite gerir e otimizar uma melhor distribuição dos horários de trabalho, contribuindo para o melhor desempenho da equipa. Estas ferramentas permitem criar horários de trabalho tendo por base diferentes variáveis, como o nível de atividade, tipo de contrato, número de colaboradores por loja e momento do ano em que estamos. Estes sistemas são configurados de forma a gerar horários com base em regras predefinidas, minimizando o tempo e o esforço necessário para o planeamento”, explica a Area Leader of People da MC.

Outra vantagem desta solução, adianta a responsável, é que os colaboradores conseguem consultar de forma mais rápida os horários de trabalho e solicitar alterações, o que também ajuda a aumentar o seu envolvimento na gestão dos horários, promovendo a transparência e comunicação entre as equipas. Este sistema de horários de trabalho também permite que a MC tenha uma perceção de possíveis ajustes que devem ser feitos na gestão dos horários através de indicadores, garantindo uma boa utilização dos horários, e de que forma se pode agir diferentemente, no caso de haver necessidade.

 

“Retalhistas que não adotam uma gestão eficaz de horários, alinhada às expectativas de tráfego nas lojas, e que não proporcionam voz aos colaboradores nas decisões sobre os seus horários, correm o risco de ficar para trás”

 

Para os retalhistas que buscam implementar ou aprimorar as práticas de gestão de força de trabalho, a Sisqual ressalta a necessidade de lidar com a alta rotatividade no sector, apontando que as razões para o elevado “turnover” frequentemente estão associadas às novas gerações, turnos desafiadores e salários baixos. “Atualmente, retalhistas que não adotam uma gestão eficaz de horários, alinhada às expectativas de tráfego nas lojas, e que não proporcionam voz aos colaboradores nas decisões sobre os seus horários, correm o risco de ficar para trás. É precisamente nesse cenário desafiador que atuamos diretamente, oferecendo soluções de ‘forecasting’, dimensionamento e um portal de comunicação entre colaboradores. Essas ferramentas facilitam a humanização das escalas de trabalho, tornando-se essenciais para o sucesso e competitividade no atual panorama do retalho”, afiança José Pedro Fernandes. Através da utilização de ferramentas de WFM, “todos os colaboradores podem ter acesso aos seus horários e conseguem ajustá-los de forma a poderem gerir melhor as suas vidas pessoais, alterando dias de descanso ou turnos. Isto resulta, naturalmente, numa equipa mais feliz, com melhor qualidade de vida e mais fidelizada à empresa”, conclui.

Este artigo foi originalmente publicado na edição n.º 85 da Grande Consumo

Por Bárbara Sousa

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