A maioria das organizações não está a conseguir satisfazer as necessidades dos colaboradores e tem dificuldade em enfrentar os desafios de um panorama laboral e económico complexo, conclui o “Relatório Kelly Global Re:work 2023”.
No entanto, o mesmo documento mostra que existe uma pequena fração de colaboradores ainda altamente motivada, o que explica como proceder daqui para a frente com o restante talento. Foi realizado com uma amostra de 4.200 profissionais e 1.500 líderes em 11 países diferentes, entre eles Portugal.
Carreira
Com um quadro de uma comunidade de talentos inquieta, 34% dos trabalhadores portugueses pondera abandonar a sua empresa nos próximos 12 meses, em comparação com 28% a nível mundial. Como principais razões, apontam a falta de oportunidade de progressão na carreira e de desenvolvimento das suas competências e, ainda, a falta de ferramentas e de tecnologias.
“Num momento em que muitos afirmam estarmos perante o fim do conceito de ‘carreira’, as pessoas continuam a precisar de perspetivas e objetivos no trabalho. Tem de haver espaço para crescerem a nível profissional e pessoal e a empresa deve ter um valor acrescentado na vida dos colaboradores, da mesma forma que acontece o contrário”, afirma Rui Barroso, VP da Kelly International e CEO da Kelly em Portugal.
Escassez de recursos
A escassez de talento tem sido um tema pulsante no mundo dos recursos humanos, especialmente em Portugal. Este estudo vem confirmar que o cenário de falta de recursos tem um impacto não só nos colaboradores, como também no negócio. Nestes parâmetros, Portugal regista valores ligeiramente superiores a outros países europeus, com 26% dos portugueses inquiridos a afirmar que, nos últimos 12 meses, foram perdidas oportunidades de negócio devido à falta de pessoas, assim como 21% diz que isto fez com que a qualidade do trabalho diminuísse.
Na perspetiva dos executivos de empresas portuguesas, a contratação temporária parece ser uma das soluções com maior destaque entre os vários países (51% da amostra global), mas, em Portugal, é o reforço das estratégias de formação e de desenvolvimento dos colaboradores que requer um maior investimento para contribuir para a resiliência das equipas (60% dos portugueses).
No que toca a reforçar a aquisição de talento, Portugal regista níveis consideravelmente mais baixos de investimento em aumentos salariais e em benefícios do que os restantes países. O mesmo acontece com a transparência salarial. Aquilo que é mais oferecido pelas organizações nacionais é a possibilidade de progredir dentro da empresa, registando neste aspeto valores acima de todos os outros.
Bem-estar, diversidade, equidade e inclusão (DEI)
A Alemanha e Portugal são os dois países com valores mais baixos (36%), face a todos os restantes e à média global (41%), no que toca ao facto de os empregadores respeitarem o “work-life balance”. Além disto, em Portugal, apenas 37% dos inquiridos considera que existe uma comunicação eficaz com os colaboradores e apenas 39% afirma que a empresa tem o cuidado de criar um ambiente de segurança psicológica. Este dado ganha maior importância considerando que apenas 3% dos portugueses se sente confortável em falar sobre os desafios que enfrentam na sua saúde mental como justificação de uma pausa no trabalho.
Sobre este tema, Vanda Brito, diretora de Recursos Humanos da Kelly em Portugal, explica que “tem sido feito um trabalho no sentido de normalizar o bem-estar psicológico no trabalho, no entanto, dados como este mostram que todos estes esforços são ainda necessários, para eliminar preconceitos e estigmas”.
No que a DEI diz respeito, os inquiridos portugueses consideram que ainda existe um “gap” entre o que é prometido e o que é efetivamente feito. Portugal é o país que menos considera que a entidade empregadora cumpre este tipo de compromissos, registando valores de resposta muito inferiores a todos os outros e abaixo da média global.
Performers Sedicados
Apesar de muitos trabalhadores se sentirem insatisfeitos a nível europeu, não deixa de existir um pequeno grupo de pessoas, a que se dá o nome de “Performers Dedicados”, que está a contrariar esta tendência. Ao analisar as reações destes trabalhadores mais motivados – pessoas que provavelmente permanecerão nas suas funções durante os próximos 12 meses – os líderes europeus podem compreender melhor como motivar os restantes.
“Este grupo de talentos empenhados apontou níveis mais elevados de flexibilidade por parte dos seus empregadores, cargas de trabalho mais fáceis de gerir e uma maior atenção à saúde mental. Ao analisarmos de perto os fatores que impulsionam este grupo de pessoas que se mantêm nas empresas, podemos apontar qual o conjunto de decisões mais poderosas que as organizações podem tomar hoje para reter os melhores talentos e durante mais tempo“, afirma Rui Barroso.
Estes fatores, mais gerais, que podem estar a fazer com que este grupo se mantenha motivado, são a saúde mental, o sentimento de pertença, o desenvolvimento de competências e a preocupação com diversidade, equidade e inclusão.
88% destes colaboradores acredita que os seus empregadores se preocupam com a sua saúde mental, em comparação com apenas 2% dos que tencionam abandonar uma função, o que sugere que esta tem um impacto significativo na satisfação do trabalhador.
Por outro lado, mais de metade dos trabalhadores “Performers Dedicados” (54%) afirma ter um sentimento de pertença à sua empresa atual e 53% diz que trabalha num ambiente psicologicamente seguro, em comparação com apenas 12% dos que procuram uma nova oportunidade.
Quando questionados sobre as razões mais importantes para não abandonarem as suas funções atuais, os trabalhadores portugueses atribuem a maior importância às boas oportunidades de desenvolvimento de competências (36%), seguidas de uma boa progressão na carreira (32%) e de um bom equilíbrio entre a vida profissional e a vida pessoal (20%).
Finalmente, o nível de empenho de uma organização na DEI pode ter um impacto significativo na decisão da permanência. Os trabalhadores que tencionam ficar na sua empresa atual têm mais do dobro das probabilidades de afirmar que os líderes adotam comportamentos inclusivos (44%) e que existe diversidade a todos os níveis da sua organização (49%).
É assim que o relatório permite também traçar as principais tendências para ajudar os líderes a navegar mais eficazmente o panorama laboral. Além destes fatores que contribuem para a motivação, um outro é a conclusão de que “a grande demissão” pode não ter acabado, com previsões de abandono do emprego no próximo ano.
O facto da escassez de pessoal estar a colocar os trabalhadores sob pressão é também um aspeto a ter em conta e, por fim, apesar de estarmos num mundo cada vez mais tecnológico, existem ainda muitas reticências por parte dos colaboradores relativamente à automatização do trabalho.