Logo na primeira vez que Daniel Roullier pisou a Vinha do Convento, encantou-se pela mesma. E não é para menos, esta é mesmo uma vinha especial. O calhau rolado que cobre os solos desta vinha única em Portugal testemunha a passagem do rio Tejo por ali, há 400 mil anos, como atestou o estudo geológico logo mandado fazer por Daniel Roullier. Estamos, mais concretamente, na sub-região da Charneca, que é, segundo Antonina Barbosa, aquela dentro da Região dos Vinhos do Tejo que mais potencial tem para gerar vinhos de grande qualidade. A enóloga e diretora geral da Falua não esconde também o brilho no olhar ao falar desta vinha de 40 hectares, que se prepara para ser ampliada com mais 80 recentemente adquiridos. É que a Falua quer crescer, mas apostando em vinhos de excelência. Adquirida pelo Grupo Roullier, em 2017, é o primeiro projeto vinícola deste grupo francês que atua na área da nutrição vegetal e que, com esta aposta, escolheu Portugal como ponto de partida para um negócio internacional na área dos vinhos.
2023 vai ser um ano altamente desafiante para a Falua, que se prepara para lançar novas referências e abordar novas regiões vinícolas. “Temos muito para fazer e fazer bem”, conta-nos Antonina Barbosa, enóloga e diretora geral da empresa. Seis anos após a entrada no seu capital por parte da Vitas Portugal, filial do Grupo Roullier, um gigante da Bretanha que atua no universo da nutrição vegetal, pode-se dizer que há um antes e um depois na Falua. “A partir de 2017, começou-se a trabalhar a sério na construção de marca e a fazer desta uma empresa de referência no país”, introduz Antonina Barbosa.
O grupo francês investiu na Região dos Vinhos do Tejo já a pensar que seria apenas o primeiro de outros projetos. Os cinco milhões de euros de investimento na aquisição de vinha recentemente anunciados, a aplicar até 2024, são um sinal inequívoco da ambição do Grupo Roullier, que, entretanto, já expandiu a sua atuação também para a Região dos Vinhos Verdes. “O senhor Roullier encantou-se pela Vinha do Convento e acredita, tal como nós acreditamos, que a diferenciação se faz com projetos diferentes. Temos tido esse privilégio. No Tejo, temos esta vinha única em Portugal; em Monção e Melgaço, foi adquirida uma quinta cuja origem remonta ao século XII, precisamente, para termos marcas de referência, de prestígio, com uma grande qualidade”, sustenta.
Pensar diferente
Estamos em plena Charneca, a sub-região dentro da Região dos Vinhos do Tejo que, acredita Antonina Barbosa, tem maior potencial para produzir vinhos de elevada qualidade. Trata-se de uma região com uma grande diversidade e onde se podem produzir muitos vinhos diferentes. “Aqui estamos, na minha opinião, no local onde se podem fazer os grandes vinhos em termos de concentração e elegância. Os solos são mais pobres e concentram menos água e, nesta vinha em particular, por causa das pedras. No resto da Charneca, há 80% a 90% de areia e algum calhau à mistura. Aqui é ao contrário. A vinha tem de ter raízes muito mais profundas, adaptadas a um modo de sobrevivência completamente diferente. Sente mesmo o terroir”, descreve.
A vinha estende-se por 40 hectares que vão ser ampliados com mais 80 com um perfil muito semelhante. Nela estão plantadas castas brancas como o Arinto, Fernão Pires, Chardonnay e Verdelho e tintas como Touriga Nacional, Cabernet Sauvignon, Aragonez, Trincadeira Preta, Alicante Bouschet e Castelão. Aliás, a área de Castelão vai ser até aumentada, avança a enóloga.
Desta vinha saem as referências Vinha do Convento, cuja colheita anterior resultou em 4.300 garrafas de tinto e 1.300 de branco, Conde Vimioso Reserva, com 30 mil garrafas de tinto e oito mil de branco, e Conde Vimioso Sommelier, que ultrapassou as 100 mil garrafas e de que grande parte ainda vem da Vinha do Convento. “Ainda fazemos aqui os Unoaked da marca Falua, vinhos sem barrica que são a expressão máxima da casta. Quase sem qualquer intervenção enológica, é quase como transportar a vinha para dentro da garrafa”.
“Esta aquisição materializa a vontade do grupo se expandir para outras regiões demarcadas, vontade esta que levará a Falua a viajar para mais uma outra, ainda neste primeiro semestre. Sem indicar qual, Antonina Barbosa avança, contudo, que Alentejo e Douro são “sonhos realizáveis”
Mas o objetivo é que, cada vez mais, a Vinha do Convento seja a vinha do Conde Vimioso Reserva, um dos néctares mais emblemáticos e mais premiados desta casa e aquele pelo qual, quando se abordam os mercados de exportação, todos perguntam. Daí também a ampliação que será feita, para que a vinha de calhau rolado se estenda por um total de 120 hectares, numa altura em que a estratégia da Falua está concentrada no crescimento. “Hoje, temos produções muito baixas, de quatro toneladas por hectare. Num ano muito bom vai às cinco toneladas por hectare. Daí esta necessidade de ganhar alguma escala, que nos permita produzir mais vinhos. Estamos a crescer, e bem, nos vinhos mais premium e queremos continuar a fazê-lo, mantendo a qualidade e a consistência”, sublinha Antonina Barbosa.
A mesma leitura pode ser feita para a Região dos Vinhos Verdes, onde mais recentemente foi adquirida uma quinta na sub-região de Monção e Melgaço. “Quando se adquiriu a Quinta do Hospital, já se sabia que tinha potencial para duplicar a produção. Vamos concretizar esse aumento em 2024 e apostar numa região que acreditamos ser uma das com mais futuro para os vinhos brancos”.
Mais uma vez, o objetivo é ganhar escala e ter autonomia para produzir mais, mas sempre com a mesma qualidade, numa busca por “um caminho diferente do que já existe”. Daí que Antonina Barbosa considere que, também aqui, a aposta recaiu numa propriedade e num projeto igualmente diferenciadores.
Localizada na freguesia de Cervães, no concelho de Monção, a Quinta do Hospital vê as suas origens remontarem ao século XII, período em que D. Teresa terá doado as terras à Ordem Hospitalária de São João de Jerusalém, ou Ordem do Hospital, para que os Hospitalários se instalassem no Condado Portucalense. É este o legado que a Falua pretende recuperar através da marca Barão do Hospital, lançando vinhos que contam e respeitam a história da região.
Esta aquisição materializa a vontade do grupo se expandir para outras regiões demarcadas, vontade esta que levará a Falua a viajar para mais uma outra, ainda neste primeiro semestre. Sem indicar qual, Antonina Barbosa avança, contudo, que Alentejo e Douro são “sonhos realizáveis”.
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Além-fronteiras
O desafio é comercial e enológico, ao ter sob a mesma alçada várias regiões do país. “Interessante”, “espetacular” e “muito sedutora” são as expressões utilizadas pela enóloga e diretora geral da Falua para descrever a possibilidade de conhecer e ter nas mãos outros terroirs. Faça-se, no entanto, o parêntesis para relembrar que a Falua tem também vinhos de outras regiões, para além do Tejo e Vinhos Verdes, embora sejam exclusivos dos mercados de exportação.
Mercados esses que cresceram de 56% para 86% das vendas da empresa, não porque Portugal tenha caído, mas, simplesmente, porque a Falua vende mais. E isto é algo de que Antonina Barbosa e toda a equipa da Falua se orgulham muito, o facto de, a partir do Tejo, se conquistar não só mercado nacional como o internacional. “Há muitos anos que a Falua leva a região também internacionalmente, com qualidade e uma comunicação muito dirigida. Consideramos que, muitas vezes, estamos a trabalhar para os nossos objetivos, levando a região atrás. Temos sido uma das empresas que têm ajudado a construir um Tejo diferente”.
“A visão da Falua é que o crescimento fora de portas, que é encarado como fundamental para que a empresa atinja os seus objetivos, só é possível quando já tem referências no mercado nacional. E é este também o grande trabalho das suas equipas: a construção de marcas”
Isso deve-se também à aposta que a Falua tem vindo a fazer na criação de equipas, especialmente após a aquisição pelo Grupo Roullier. “Para além da equipa de viticultura, que não existia, a equipa comercial foi uma aposta brutal, nos últimos três anos. No mercado nacional pretendemos duplicá-la. Para fazer o trabalho de marca que queremos fazer junto do ponto de venda, temos de fazê-lo nós próprios”.
A visão da Falua é que o crescimento fora de portas, que é encarado como fundamental para que a empresa atinja os seus objetivos, só é possível quando já tem referências no mercado nacional. E é este também o grande trabalho das suas equipas: a construção de marcas. Marcas que trazem consigo uma história, sempre ligada ao terroir contada por uma equipa focada em procurar um caminho diferente. “Podendo nós investir em zonas mais baratas, mais fáceis, mais mecanizadas, acabámos por comprar mais 80 hectares na Vinha do Convento, onde sabemos que vai ser mais difícil, mais caro e que vai demorar mais tempo ter uma vinha a funcionar a 100%. Mas acreditamos que este local permite obter resultados de excelência. O terroir faz a diferença. É o número um, quando temos de pôr por ordem as características dos grandes vinhos. As pessoas são o número dois e a Falua tem uma equipa inacreditável”, conclui.
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Este artigo foi publicado na edição N.º 79 da Grande Consumo