Primeiro introduziu-se a máquina a vapor, em 1784. E houve uma revolução na indústria. Depois, surgiu a energia elétrica e a produção em massa, em 1870. E uma nova revolução na indústria. As fábricas automatizaram-se e, em 1969, deu-se a terceira revolução industrial. Agora, caminha-se para a quarta, com as fábricas a tornarem-se verdadeiramente inteligentes. 2017 é o ano da chamada Indústria 4.0. Ou melhor, é o ano em que o conceito, que já anda pelas bocas do mundo há algum tempo, ganha nova visibilidade, pelo menos em Portugal. No total, são 60 as medidas estratégicas anunciadas pelo Governo que colocou a Indústria 4.0 na sua agenda, com três objetivos essenciais em mente: atrair investidores, promover a digitalização da economia e o conhecimento.

Três metas que, no entender do Executivo, irão garantir a sobrevivência dos sectores mais tradicionais e, por outro lado, viabilizar os investimentos em empresas mais sofisticadas, como os 100 milhões de euros direcionados pela Bosch a Portugal. A indústria portuguesa está em plena revolução, protagonizada pela tecnologia, que está a alterar fileiras inteiras. Tudo está a tornar-se verdadeiramente mais inteligente, seja na forma como se produz, seja na operação logística e distribuição e venda dos produtos ao cliente final.

O Governo quis definir uma estratégia para a indústria e, nesse sentido, rodeou-se das empresas. Foram mais de 200 as empresas convidadas a participar numa estratégia que resulta em 60 medidas compiladas pela Deloitte, cuja aplicação será supervisionada pela Associação Empresarial para a Inovação (COTEC) e que, segundo João Vasconcelos, secretário de Estado da Indústria, é adaptada à realidade portuguesa. “Porque não se pode caminhar para o 4.0 sem resolver o 2.0. O segredo são as competências que cada um terá, tanto o operário como o diretor e o empresário. E é de acordo com o nível de competências que conseguirmos adaptar nas próximas gerações que nos vamos posicionar nesta revolução”, disse numa entrevista ao Dinheiro Vivo.

A vontade do Governo é tocar diretamente 50 mil empresas nos próximos quatro anos e formar 20 mil trabalhadores em competências digitais. Dos fundos a disponibilizar, 4,5 mil milhões de euros no total, entre investimento público e privado, metade dos quais via fundos europeus, a grande parte será destinada a aquisição e formação em tecnologia. Além disso, mais de 60% das medidas previstas no plano estratégico do Governo são orientadas para a mobilidade e qualificação dos recursos humanos.

Áreas prioritárias, porque ainda há um caminho importante a percorrer no sentido da digitalização das empresas portuguesas, sobretudo as de pequena e média dimensão. De acordo com um estudo da PwC, apresentado no último seminário da Associação Portuguesa de Leasing, Factoring e Renting, apenas 17,7% das PME portuguesas apresentam um elevado nível de digitalização, o que contrasta com os 35,5% das suas congéneres finlandesas e 25,3% das espanholas. O trabalho serviu de arranque para a discussão dos desafios da indústria em Portugal, que a consultora concluiu serem os mesmos de há quatro anos, mas com a nuance adicional da digitalização, dos talentos e da sustentabilidade. De acordo com António Brochado Correia, partner da PwC, dentro da revolução industrial, as PME nacionais estão abaixo da média da União Europeia e ultrapassar o atual nível de Espanha apenas será possível em 2025. Ao nível da Finlândia só cinco anos depois.

Os dados da PwC indicam que o número de indivíduos que utilizam a Internet para interagir com os serviços públicos online atingiu os 45% em Portugal, o que compara com os 50% da União Europeia e 48% de toda a Europa. A este respeito, a Estónia, com 77%, e a Finlândia, com 82%, são os mais avançados. As projeções indicam que, em 2030, 90% dos portugueses utilizarão a Internet para interagir com os serviços públicos online.

Meros indicadores dos desafios, mas também das oportunidades que se abrem com a digitalização, que permitiu, por exemplo, que Portugal tenha o segundo par de sapatos mais caro do mundo. A indústria do calçado está apostada em ser líder mundial na relação com os seus clientes e pretende fazê-lo através da sofisticação do produto, do incremento da resposta rápida e da melhoria do nível de serviço. Conta com 49 milhões de euros para o fazer no âmbito do projeto Footure 4.0, escolhido pelo Governo como uma das medidas do programa Indústria 4.0. A robotização inteligente ou a aplicação das novas tecnologias ao desenvolvimento de produto e prototipagem são algumas das áreas prioritárias.

Mas este não é o único sector a navegar esta tendência. Também o sector agroalimentar está a procurar beneficiar da Indústria 4.0, até porque Portugal foi o único país da União Europeia que englobou, na definição da sua estratégia nacional, um grupo de trabalho para o agroalimentar. A Federação das Indústrias Portuguesas Agroalimentares (FIPA) teve um papel ativo na fase de audições e acompanhou todo o trabalho com a CIP ao nível do conselho estratégico.

A Cerealis, a Centauro, a Delta Cafés, a Fruclact, a Lusiaves, a Nestlé, a Sogrape, a Sovena, a Sumol+Compal, a Ramirez, a Trivalor, a Unicer e a Vitacress foram algumas das empresas chamadas pelo Governo na definição da estratégia para a Indústria 4.0. “O agroalimentar é um dos que mais podem beneficiar desta revolução industrial, porque, ao ser um sector que incorpora atividades primárias, secundárias e terciárias, tem uma margem de transformação mais ampla. Podemos falar da componente agrícola, onde o poder da recolha de tratamento de dados sobre espécies, solos, clima, etc. nunca conheceu tanto avanço. Podemos falar também de toda a transformação industrial, onde as novas tecnologias estão a transformar profundamente a forma como a indústria opera, permitindo tempos de planeamento menores, séries de produção mais curtas e maior produtividade das máquinas. E, por fim, na componente de serviços, na relação com o cliente e na distribuição e logística, o poder do digital tem sido amplamente reconhecido pelo sector. Se hoje temos consumidores mais informados e que exigem mais transparência e celeridade, então a incorporação de tecnologias características da Indústria 4.0 no agroalimentar permite oferecer aos clientes informação fidedigna”, disse João Vasconcelos ao Vida Económica.

No 6.º Congresso da FIPA, o secretário de Estado lembrou que esta é a primeira revolução industrial em que a localização geográfica e a falta de recursos naturais não prejudica Portugal. E os benefícios que o país pode colher pelo facto de ter um tecido empresarial pequeno e, portanto, mais versátil e facilmente adaptável são relevantes.

O conceito de Indústria 4.0 vem, efetivamente, revolucionar o futuro das indústrias transformadoras. Mas o que é, em boa verdade, este conceito? “A Indústria 4.0, ou a fábrica inteligente, consiste na interconectividade digital permanente de todos os passos do processo, tornando-os mais eficientes, flexíveis, rápidos, transparentes e fáceis de manusear e permite aumentar a produtividade das empresas em mais de 30%”. A garantia é dada por Detlef Kranich, diretor geral da TRUMPF Portugal e Espanha. Da mesma maneira que os smartphones mudaram o quotidiano das pessoas, devido à “interligação inteligente de todas as aplicações num sistema conjunto”, algo semelhante está a passar-se nas fábricas. “Todas estas ferramentas permitem às empresas pouparem tempo, dinheiro e recursos e, acima de tudo, colocando-as ainda mais focadas nos principais desafios que a indústria hoje enfrenta, e que as empresas em Portugal tão bem sabem, que são as encomendas cada vez mais customizadas, em quantidades mais pequenas e com um prazo de entrega cada vez mais curto”.

Este artigo foi publicado na edição 45 da Grande Consumo. Leia o desenvolvimento aqui.

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