Produtos biológicos: moda ou valores?

Quando se pensa em produtos alimentares, é recorrente a ideia encaminhar-se para o momento de compra, local de compra e, naturalmente, conveniência, conforto, serviços associados, bem-estar e ainda, claro está, o preço nas suas mais criativas, divertidas e, por vezes, confusas fórmulas de descontos, bem como na notoriedade da marca. Raras são as vezes em que emergem espontaneamente conceitos alinhados com os agricultores, modos de produção, origem, nutrientes, humanização agroalimentar, biodiversidade, ecologia e felicidade nutritiva. Na verdade, dever-se-ia entender a cultura do marketing agroalimentar como algo muito mais amplo do que tentar entender os momentos de consumo.

A função do marketing agroalimentar na atualidade e no futuro considerará, mais do que a gestão competitiva e eficiente dos portfólios, os relacionamentos a montante e a jusante da cadeia de valor, tornando-a integrada, sincronizada e, evidentemente, colaborativa. Ora, é exatamente neste aspeto que ainda há um longo caminho a percorrer – cadeia de valor agroalimentar colaborativa. Possibilitar que o consumidor colabore, desenhe e opine sobre os produtos que vai degustar e que o industrial abra as portas ao diálogo e demonstre os processos de transformação, justificando os seus valores empresariais – valores, esses, amplamente difundidos neste sector, como a naturalidade e a transparência – será algo exigível. Infelizmente, poucos desses valores correspondem à verdade operativa.

No marketing de hoje, o consumidor, antes de ser visto como tal, deverá ser considerado como um ser humano. A este respeito, apenas o conceito dos alimentos e produtos oriundos do modo de produção biológico e biodinâmico e, em certa medida, os DOP – Denominação de Origem Protegida, IGP – Indicação Geográfica Protegida, Comércio Justo, Slow Food, entre outros, é que serão capazes de fazer corresponder a origem à estratégia, que é o mesmo que dizer à missão e visão, mais do que ao posicionamento e à segmentação. A visão holística do marketing agroalimentar irá emergir naturalmente. Que factos quantitativos nos podem fazer antever esta dinâmica da produção e do mercado dos produtos biológicos?

Em apenas 15 anos (1999-2014), no mundo, o volume de negócios teve um aumento de 15,2 mil milhões de euros para os atuais 72 mil milhões de euros, dos quais 40% se situam na União Europeia. Por terras lusas, embora com uma dinâmica inferior, ainda assim é positiva. É um mercado em valor com crescimentos muito significativos a rondar os 24 milhões de euros. Por outro lado, quer a produção quer a área agrícola útil têm acompanhado estes crescimentos. Um outro indicador são os inúmeros conceitos de canais exclusivos, que, ano após ano, abrem portas à proliferação dos mercados de proximidade. Destaca-se ainda o interesse dos grandes operadores da distribuição moderna, tais como o El Corte Inglés, supermercados Brio, supermercados Celeiro e, agora, mais recentemente, a Sonae Distribuição.


O risco de junção de portfólios e conceitos de alimentação saudável, dietética, nutracêutica e dos suplementos alimentares com a biológica e biodinâmica será um caminho perigoso. Cada segmento, cada referência, cada classe de produtos e modos de produção, no seu devido lugar. Considerando que o marketing agroalimentar é um conjunto de metodologias, técnicas e ações de procurement, production, logistics, marketing & sales e services, de que uma organização dispõe para promover a alteração de comportamentos que favoreçam a realização de objetivos comuns, o que se espera necessariamente é que os avultados investimentos e capacidade orçamental destes grupos económicos sejam um importante contributo para reeducar o consumidor e, mais do que isso, sejam potenciadores do acesso mais generalizado a estes tipos de alimentação. A “pressão positiva” de preços que se instalará neste “cluster” deverá ser cautelosa e deverá ser vista como uma oportunidade de crescimento e de mais maturidade empresarial.

Rui Rosa Dias
Docente do IPAM,
Especialista em consumo agroalimentar

Este artigo foi publicado na edição 42 da Grande Consumo

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