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Se pretendemos criar marca e ser reconhecidos, não podemos pensar em vender nos mercados externos de vez em quando

As exportações representam, hoje, mais de 65% do volume de vendas da José Maria da Fonseca. Presente em cerca de 70 países, da China ao Equador, o segredo está no fornecimento consistente de vinhos de qualidade. Em entrevista à Grande Consumo, Renata Abreu, diretora de exportação da JMF, faz um balanço da estratégia da empresa que, desde o século XIX, tem vindo a afirmar a sua vocação internacional.

Grande Consumo – A que se deve a aposta da José Maria da Fonseca (JMF) na exportação dos seus vinhos? Quando começou e quanto já representa?
Renata Abreu –
A José Maria da Fonseca sempre apostou na exportação desde o início da sua atividade. Está no ADN da empresa e da família. Os registos que temos na empresa mostram que a marca Periquita começou a ser exportada para o Brasil no século XIX. Desde essa época que nunca mais parámos de procurar novos mercados para as nossas marcas, representando, hoje, mais de 65% do volume de vendas. Ao todo, a JMF exporta para cerca de 70 países

GC – Quais são os principais mercados de exportação? Quanto representam em termos de volume?
RA –
O top 10 de países para onde a José Maria da Fonseca exporta são a Suécia, Brasil, Itália, Canadá, Estados Unidos da América, China, Luxemburgo, Holanda, França e Noruega e representaram quase 80% do volume de exportação no primeiro semestre.

GC – Como é que se gera uma presença tão lata e dispersa à escala mundial?
RA –
A dispersão de mercados tem vindo a ser feita ao longo dos anos de atividade da José Maria da Fonseca. O carácter exportador é muito forte, a relação com alguns mercados externos é de longa duração e temos conseguido manter a nossa posição em muitos desses mercados. Estes resultados conseguem-se com um trabalho consistente de fornecimento de vinhos de qualidade, regularidade e perseverança. Se pretendemos criar marca e ser reconhecidos, não podemos pensar em vender nos mercados externos de vez em quando, ou aparecer às vezes. Temos que manter esse contacto regular para reforçar a proximidade com o cliente.
Hoje em dia, estamos presentes nos cinco continentes e esta representação a nível mundial é fruto de um trabalho de prospeção contínuo feito por uma equipa de exportação profissional, investimento de tempo e financeiro, visitas aos vários países e participação em feiras e provas profissionais do sector.
 

GC – A Ásia, em concreto a China, é um destino “obrigatório” para as marcas de vinhos portugueses? É um universo apelativo para a JMF?
RA –
A China é um mercado desafiador, tem um potencial enorme, mas é difícil de trabalhar devido a dificuldades de comunicação, à distância que nos separa e as diferenças culturais. Apesar destas dificuldades, é possível apostar neste mercado, desde que os produtores estejam preparados para enfrentar estas barreiras e tenham disponibilidade para investir em tempo na criação de relações humanas e de estabelecer relações de confiança com os importadores chineses. Além disto, a necessidade de adaptação dos produtos ao mercado é permanente.
A José Maria da Fonseca iniciou as exportações para a China há mais de quatro anos e tem vindo a crescer as vendas ao longo deste período. Desde 2016 que este mercado já se encontra entre os 10 primeiros, havendo potencial para chegar ao top 5.

GC – As marcas comercializadas nos mercados de exportação são as mesmas comercializadas a nível interno? Como é que se gerem esses ativos da empresa nesses mesmos mercados de destino?
RA
A José Maria da Fonseca tenta preservar um dos maiores ativos da empresa, que são as suas marcas. Somos detentores de marcasfortes e históricas em Portugal, como Periquita (a primeira marca de vinho tinto engarrafado em Portugal, de 1850), Lancers (o vinho estrangeiro mais vendido nos Estados Unidos da América, de 1970/80) e José de Sousa que são reconhecidas em vários mercados e não podemos descurar o valor que representam. São as marcas principais da empresa que estão representadas em todos os mercados para onde exportamos, embora, em alguns, como a China, Brasil, Estados Unidos da América e Canadá, tenhamos sucesso também com algumas marcas desenvolvidas em exclusivo para alguns clientes. 

GC – Branco ou tinto? Rosé? O que é “que se bebe” lá fora?
RA –
O vinho tinto ainda representa a maior percentagem de produção e de vendas, mas há tendências que têm alterado ao longo dos anos. Os vinhos brancos e rosés têm vindo a conquistar cada vez mais consumidores que reconhecem a sua qualidade e momento de consumo. O Lancers é um exemplo de sucesso no segmento dos vinhos rosés, inclusivamente, não nos podemos esquecer que nos anos 70/80 era a marca de vinho mais vendida nos Estados Unidos da América.
Há diferentes comportamentos de consumo, dependendo da localização geográfica e também do estado de maturidade do próprio mercado e consumidor. Por exemplo, na China e na Rússia, os consumidores ainda não têm um conhecimento muito alargado no consumo de vinhos, então, têm uma preferência maior por vinhos tintos. No Brasil, pensámos que, por ter um clima mais quente, o que se adaptaria melhor seriam os vinhos brancos e rosés; mas, como a maior parte dos consumidores de vinho consome por status e não por conhecimento, a preferência também recai nos vinhos tintos. Em contrapartida, no Canadá, um dos vinhos que mais vendemos no monopólio do Québec é branco. E nos Estados Unidos da América, temos uma percentagem elevada de vendas de vinho verde, pois é uma categoria bastante reconhecida naquele mercado.

GC – A “screwcap” nos mercados internacionais é uma opção ou nem tanto? O “bag-in-box” integra-se na vossa oferta? A embalagem é um dos aspetos que tem que ser tido em conta nos mercados internacionais?
RA –
A diversificação de embalagem e forma de fechar a garrafa são mais do que uma opção, são quase uma obrigação para nos adaptarmos aos diversos mercados, quando queremos estar presentes nesses mercados. Na Suécia e Noruega, o consumo de vinhos em “bag-in-box” representa mais de 60%, logo, se queremos estar no mercado com um volume de vendas interessante, temos de ter oferta de vinhos neste formato. Outro exemplo, principalmente nos segmentos de entrada, vinhos de consumo regular e rápido, que por vezes também são vinhos servidos a copo nos bares e restaurantes, é quase uma obrigação a oferta de garrafas com uma abertura mais fácil e rápida para quem serve, daí a necessidade de produzirmos vinhos com ” screwcap”. A funcionalidade da embalagem é valorizada por muitos mercados, como a Holanda, Estados Unidos da América e Canadá, mercados onde a relação com a rolha de cortiça não é tão forte, mas sim a funcionalidade e a forma prática de abrir a garrafa.

GC – Quanto pesam as vendas de “screwcap” ou “bag-in-a-box” no cômputo geral das exportações?
RA –
Não temos dados relativamente às exportações portuguesas. No nosso caso, estamos a falar de um valor de cerca de 15% das exportações.

GC – Os vinhos sem álcool conquistaram o seu espaço no universo da exportação?
RA –
Sim, os vinhos sem álcool são uma oportunidade de mercado. Consideramos ter uma vantagem competitiva face à nossa concorrência por termos investido na tecnologia de desalcoolização de vinhos, através de um método chamado “spinning cone”, que permite retirar o álcool do vinho.
Os vinhos sem álcool já têm uma expressão nas nossas exportações e vendemos em mercados como a Suécia, Austrália, Canadá e Brasil. Nestes países, valorizam a possibilidade de consumir vinho, mas sem o perigo de consumir álcool antes de conduzir, em situações de aconselhamento médico por toma de medicamentos ou mulheres grávidas que apreciam um copo de vinho à refeição, mas estão limitadas pela sua condição de gestantes. Os mercados do Médio Oriente são uma prioridade em termos de prospeção para este tipo de produtos dadas as limitações que têm no consumo de bebidas alcoólicas.

GC – Há ambição de entrar em novos mercados? É esse o objetivo? Ser uma empresa global?
RA –
Neste momento, a maior prioridade é consolidar as vendas nos mercados onde estamos presentes. Devemos reforçar a presença das nossas marcas através de alargamento de distribuição e também da introdução de novas referências nos clientes já existentes, mas não descuramos a prospeção contínua em mercados onde ainda não estamos. De salientar que, este ano, iniciámos a exportação para mercados menos explorados, como a Coreia do Sul e o Equador, onde estamos surpreendidos pela positiva com os resultados obtidos neste arranque.

GC – Esses novos mercados serão alvo de abordagens específicas, nomeadamente com novas marcas ou com o portfólio atualmente detido?
RA –
A José Maria da Fonseca produz mais de 30 marcas e continuamos a contruir novas marcas, entre vinhos de mesa e generosos. A abordagem depende do mercado e da quantidade de marcas que já estamos a comercializar nesse país. Normalmente, em mercados novos, tentamos iniciar a introdução com as nossas marcas mais conhecidas, como Lancers, Periquita, José de Sousa ou Alambre nos moscatéis de Setúbal. 

GC – O que determina a criação de uma nova marca ou uma nova rotulagem de um produto já detido? Escala, possível volume de negócio?
RA –
Em primeiro lugar, a criação de uma nova marca implica a criação de uma nova história. Para vendermos vinho, necessitamos de ter um suporte, que nos ajude na divulgação do produto. As marcas não podem ser vazias de história nem de factos. Há sempre uma razão para cada marca criada dentro da José Maria da Fonseca. Dou como exemplo a marca Twin Vines, exclusiva para o mercado dos Estados Unidos da América, criada com base no nascimento das filhas gémeas de António M. Soares Franco, para celebrar a oitava geração da família.
Ao desenvolvermos novos produtos, a escala e volume de negócio também são tidos em conta, pois é dessa forma que o negócio se torna rentável e sustentável.

GC – O rebranding de Periquita tem sido bem aceite no exterior, nomeadamente em mercados onde é uma “love brand”, como, por exemplo, no Brasil?
RA –
Nesta fase inicial, o rebranding da marca Periquita foi um sucesso. Os elementos visuais nos rótulos, como o símbolo de mérito e qualidade e a assinatura do enólogo Domingos Soares Franco, concedem ao Periquita mais legitimidade e um regresso às origens; os acabamentos reforçados enobrecem a marca e recuperam o brasão de Ordem e Espada, distinção atribuída pelo rei D. Pedro V a José Maria da Fonseca, em 1856, pelo valor, lealdade e mérito no âmbito da indústria portuguesa. Os importadores e distribuidores em vários países reagiram positivamente, o que permitiu um impulso significativo nas vendas da marca, nos últimos três meses, para países como Brasil, Suécia, Holanda, Estados Unidos da América e China. Ainda é prematuro analisar o resultado das vendas junto dos consumidores, tendo em conta que o produto com a nova imagem, começa agora a chegar às prateleiras dos vários mercados.

GC – O que seria um bom fecho de ano no que às exportações diz respeito?
RA –
Um excelente fecho de ano nas exportações seria terminar o ano 2018 com o crescimento registado a julho, na ordem dos 10%, face a 2017.

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