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Um estudo da Rabobank explora as implicações potenciais da escalada das restrições comerciais entre os Estados Unidos da América, a China e os seus respetivos aliados, através de três cenários.
Estas restrições poderão levar a grandes mudanças nas rotas comerciais. Se a Europa e a América do Sul se unirem, a mudança de alianças poderá criar desequilíbrios significativos no abastecimento mundial, desde excedentes a carências extremas de produtos essenciais.
Desequilíbrios na oferta global
Tendo por base a recente escalada das restrições comerciais, na sequência da guerra tarifária entre os Estados Unidos e a China, a RaboResearch conduziu o que chamou de “experiência de reflexão” para “explorar os potenciais extremos de fortes restrições comerciais e as suas implicações para a indústria alimentar e agroindustrial global em vários cenários”, segundo explica Stefan Vogel, diretor geral da RaboResearch para a Austrália e Nova Zelândia.
O executivo acrescenta que a considerável incerteza global provocada pela guerra tarifária poderá levar outros países a (re)alinharem-se estrategicamente, numa tentativa de criar alguma estabilidade e mitigar o impacto nas cadeias de abastecimento globais. “Estas alianças mutáveis entre as principais potências mundiais poderão representar ameaças significativas para as cadeias de abastecimento alimentar e agroindustrial mundiais. E se as tensões comerciais aumentarem ao ponto de a Europa ser obrigada a aderir à aliança dos Estados Unidos para proteção militar, mesmo que isso limite a sua possibilidade de negociar livremente com a China? Com quem é que a América do Sul poderia unir forças”, questiona.
O estudo conclui que estas alianças mutáveis, associadas a fortes restrições comerciais, poderão conduzir a desequilíbrios globais substanciais no fornecimento de alimentos e de fatores de produção agrícola, oscilando entre excedentes e escassez grave de produtos essenciais. São três os cenários possíveis.
Cenário 1: Grandes custos de reencaminhamento para as exportações de produtos lácteos e carne dos Estados Unidos e da Oceânia
Num cenário em que a América do Sul e a Europa permanecem neutras e continuam a negociar com todas as nações, a situação para a maioria dos produtos alimentares básicos seria controlável, mas implicaria um redirecionamento dispendioso.
“A aliança dos Estados Unidos poderia enfrentar pequenos excessos de abastecimento de sementes oleaginosas e proteínas animais. Um desafio mais significativo seria redirecionar os sólidos do leite da Oceânia e as exportações de lactose e soro de leite dos Estados Unidos para outros produtos e mercados, o que aumentaria os custos”, explica Stefan Vogel.
Além disso, as exportações de carne de ovino e de lã da Austrália e da Nova Zelândia, os maiores exportadores mundiais destes produtos, seriam gravemente afetadas.
A aliança com a China, por outro lado, teria uma oferta escassa de sementes oleaginosas, o que levaria a um aumento dos custos do óleo vegetal e dos alimentos proteicos para o sector pecuário.
Cenário 2: Excesso de oferta na aliança com os Estados Unidos e escassez de alimentos para a China
Mary Ledman, estrategista global de Lácteos da RaboResearch, descreve um segundo cenário, em que a América do Sul e a Europa cedem à pressão e alinham-se com os Estados Unidos, restringindo o comércio com a China e os seus aliados. “O cenário prevê um enorme excedente comercial de 120 milhões de toneladas métricas de sementes oleaginosas e 40 milhões de toneladas métricas de grãos na aliança dos Estados Unidos, prejudicando as margens de cultivo”.
Entretanto, a aliança com a China enfrentaria uma grave escassez de alimentos para animais, o que constituiria uma ameaça substancial à segurança alimentar. “É igualmente provável que se verifiquem perturbações significativas no mercado dos produtos lácteos, com mais de 80% do comércio mundial de produtos lácteos afetado”, acrescenta.
Cenário 3: Produtos agrícolas de base controláveis, mas fatores de produção em dificuldades
No último cenário, a Europa junta-se à aliança com os Estados Unidos e a América do Sul à aliança com a China. “Os produtos agrícolas de base seriam controláveis, mas exigiriam uma remodelação significativa. Os fatores de produção agrícola enfrentariam grandes dificuldades”, explica Mary Ledman.
A aliança dos Estados Unidos enfrentaria pequenos excessos de oferta de sementes oleaginosas, enquanto a aliança da China sofreria uma grave escassez de lactose, soro de leite e proteínas do soro de leite.
Impacto das tarifas americanas na segurança alimentar mundial
Segundo Stefan Vogel, os Estados Unidos parecem estar a utilizar os direitos aduaneiros para atingir objetivos que vão além dos económicos. “Não pretendem apenas obter benefícios económicos através da reformulação das suas relações comerciais, mas também reforçar a sua hegemonia global, numa altura em que a China se esforça por aumentar a sua influência na Ásia e no mundo”.
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