Empatia: uma vantagem colaborativa e competitiva

Margarida Partidário, Fundadora do Arboreall Group
Margarida Partidário, Fundadora do Arboreall Group

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Uma empresa é um conjunto de relações de interdependência e, quanto maior é a empresa, mais relações de interdependência congrega. Pensar uma empresa como um conjunto de relações de interdependência evidencia os milhões de interações que ocorrem ao longo de um ano, não só internamente (entre os colaboradores da empresa), como externamente (entre os colaboradores da empresa e os seus parceiros e clientes e, ainda, entre a marca, produtos e serviços da empresa e os seus clientes).

Controlar cada interação não está ao alcance de nenhuma empresa. O que está ao alcance de todas as empresas é entender o valor de cada interação, humana ou não-humana, por menor ou maior que seja, como uma oportunidade para despoletar uma impressão positiva que plante uma emoção positiva e gere uma associação positiva que conduza a uma decisão positiva.

 

Experiências positiva paras recordações positivas

Por sua vez, espera-se que se siga uma experiência positiva que derive numa recordação positiva que abra espaço ao início de uma relação significativa. Esta relação será tanto mais desafiante quanto a sua duração, devido às implicações da manutenção deste círculo virtuoso que tem, sempre, como objetivo culminar numa, ou várias, recomendações positivas. Isto porque, como diz António Damásio, o neurocientista português cuja obra de vida defende que por detrás do processo racional inerente à tomada de decisão do ser humano está um processo emocional que tem a última palavra, “we are not thinking machines that feel, rather, we are feeling machines that think”.

Deste modo, só a partir do momento em que a empresa compreende que tanto os seus colaboradores como os seus clientes são movidos pelo seu processo emocional tem a possibilidade de se conectar aos seus sentimentos e influenciar, através destes, os seus pensamentos e comportamentos.

 

Conduta empática interna e externamente

Para incidir no processo emocional dos seus colaboradores e clientes, as empresas têm ao seu dispor a empatia que, quando embebida na sua realidade empresarial, permite aspirar à construção, ou transição, de/para uma empresa com: 1. conduta empática (a nível estrutural e transversal); 2. mecanismos empáticos (a nível funcional e operacional) e 3. sensibilidade empática (a nível relacional e experiencial). E todas as empresas querem ser empáticas, até mesmo aquelas que ainda não sabem que querem, para:

Internamente: promover um ambiente laboral assente na inteligência emocional, aumentar a satisfação e retenção dos colaboradores qualificados e aumentar a produtividade e inovação da empresa;

Externamente: aumentar a satisfação dos clientes e parceiros, aumentar as vendas da empresa, aumentar o contributo e responsabilidade social da empresa e aumentar a reputação da empresa no mercado.

Por outras palavras, a empatia está na base de um modelo de gestão empresarial sustentável e permite trabalhar tanto a cultura como o negócio da empresa. No que à cultura da empresa diz respeito, as duas métricas mais relevantes são satisfação e rotatividade dos colaboradores. Já no que ao negócio da empresa diz respeito, as duas métricas mais relevantes são satisfação dos clientes e vendas da empresa.

 

Return on empathy

No entanto, para se apurar o que possa ser considerado como return on empathy, deverá existir por detrás um projeto de empatia, idealmente, que abrace tanto a cultura como o negócio da empresa, dado que se retroalimentam mutuamente.

Mas o que poderia ser considerado o exponencial máximo da empatia para uma empresa? Para ilustrar, partilho o único caso que encontrei que contempla tanto a cultura como o negócio da empresa. Em 2019, o gigante de retalho americano Costco alcançou a terceira posição na classificação anual realizada pela Comparably, que procura apurar as empresas americanas com os colaboradores mais satisfeitos. Com base em 11.117 avaliações e 651 participantes, a Costco alcançou uma pontuação de cultura de 84/100, uma pontuação de satisfação dos colaboradores de 71/100 e uma pontuação de equipa de 85/100. A Costco, antes de ter o seu cliente no centro do seu modelo de negócio, tem os seus colaboradores, o que lhe tem permitido uma estabilidade e desempenho invejáveis. Em 2022, ano em que foi distinguida como Empresa do Ano pela Yahoo Finance, apresentava uma rotatividade dos seus colaboradores inferior a um sétimo da média dos retalhistas americanos (8% numa força de trabalho de 304 mil colaboradores) e uma produtividade que lhe permitia ser o terceiro maior retalhista americano (217 mil milhões de dólares em vendas). Os fatores e medidas que têm proporcionado estes resultados têm permitido à Costco ser reconhecida no mercado como uma das empresas americanas mais empáticas.

 

Maximizar negócio e cultura empresarial

No entanto, a maior parte das empresas ainda desconhece a efetividade da empatia para maximizar tanto a cultura como o negócio da empresa. Outras tantas caem mesmo na armadilha do empathy-washing, ao assumir compromissos de cultura e/ou negócio imprecisos ou falsos, acompanhados de comunicação imprecisa ou falsa.

Mas trabalhar a empatia não tem de ser dificultoso ou enganoso, existem duas abordagens possíveis para enveredar nesta jornada: uma progressiva e outra transformadora. Numa abordagem progressiva, podem proporcionar-se conferências, sessões de trabalho, sessões de formação e/ou projetos piloto de empatia, não só para ir sensibilizando e dotando os colaboradores de ferramentas empáticas, como para se perceber a oportunidade diante da empresa e reunir informação que permita delinear o plano de ação indicado. Numa abordagem transformadora, podem realizar-se programas de empatia e/ou criarem-se laboratórios de empatia para definir e implementar uma estratégia holística e de continuidade. Uma abordagem progressiva assume uma visão e ação estratégicas de curto-médio prazo, enquanto uma abordagem transformadora se centra no médio-longo prazo, sendo que é possível realizar um caminho estruturado desde uma abordagem progressiva até uma abordagem transformadora.

 

Case-study

Para ilustrar um projeto de empatia focado no negócio da empresa, recorro ao caso da companhia aérea irlandesa Ryanair, que verificou um crescimento do lucro líquido de 867 milhões de euros para 1.240 milhões de euros, que atribuiu à realização do seu programa “Always Getting Better”. Segundo foi possível apurar, este programa teve a duração de dois anos e dedicou-se a identificar as atividades e comportamentos da empresa que demonstravam falta de empatia para com o cliente e a reformular cada um deles com sensibilidade empática.

O importante é começar, pois, à medida que as empresas da linha da frente se tornam mais empáticas, demarcam o caminho que todas as outras empresas, em algum momento, terão de fazer se quiserem manter-se ativas num mercado de colaboradores e clientes que exigem ser, cada vez mais, ouvidos, sentidos, compreendidos e correspondidos. A minha recomendação às empresas é que não subestimem o poder da empatia, uma vez que se trata de uma vantagem colaborativa e competitiva que é revolucionária, justamente, por aliar ambas as forças.

 

Este artigo foi publicado na edição N.º 88 da Grande Consumo.

 

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