5 anos depois: o legado da pandemia no consumo e no retalho

Goncalo Lobo Xavier, diretor geral da APED
Goncalo Lobo Xavier, diretor geral da APED

Em 2025, recordamos cinco anos desde o início da pandemia de Covid-19 – um acontecimento que alterou radicalmente a forma como vivemos, trabalhamos, consumimos e nos relacionamos. Levou a confinamentos, ao teletrabalho e a medidas sem precedentes na área da higiene e segurança.

No sector do retalho, e em especial no universo da distribuição, este foi um momento de transformação estrutural, cujos impactos ainda hoje moldam o presente e desenham o futuro. Foi um dos poucos sectores de contacto direto com a população, que teve de manter sempre as suas portas abertas, para garantir que os bens essenciais não faltariam às pessoas.

A pandemia funcionou como um verdadeiro “acelerador histórico” de tendências que já estavam a emergir: a digitalização dos processos, a omnicanalidade, a sustentabilidade como imperativo estratégico e uma maior consciencialização do consumidor para temas sociais e ambientais. Em poucos meses, assistimos a uma alteração de comportamentos que, em circunstâncias normais, teriam levado uma década a consolidar. Não sou apenas eu que o digo: são os inúmeros estudos académicos e papers que temos lido sobre esse período sem precedentes na nossa história mais recente.

Hoje, olhamos para trás e reconhecemos o papel fundamental que a distribuição (alimentar e não alimentar) teve na resposta à crise: garantir o abastecimento, manter a confiança dos consumidores e adaptar-se, de forma quase instantânea, a novos padrões de consumo. Esta capacidade de adaptação – ágil, responsável e centrada nas pessoas – é, provavelmente, um dos maiores legados da pandemia.

 

O que mudou e o que ficou

O consumidor de 2025 é mais digital, mais exigente, mais informado e mais consciente. A procura por conveniência e segurança acelerou a adoção do comércio eletrónico e dos modelos híbridos de compra, como o click & collect ou a entrega rápida. A omnicanalidade deixou de ser uma opção para se tornar uma necessidade estratégica.

Por outro lado, a pandemia reforçou a ligação emocional entre consumidores e marcas. Sejam elas as marcas de “indústria” ou as marcas “próprias”.

A autenticidade, a responsabilidade social e a transparência ganharam peso real na decisão de compra. A confiança, que sempre foi central na relação entre retalho e consumidores, tornou-se ainda mais valiosa – e mais desafiante de conquistar e manter.

Contudo, alguns comportamentos que surgiram de forma reativa, como o excesso de stock ou o consumo por impulso, deram lugar a tendências de consumo mais racionais e planeadas, refletindo uma maior maturidade dos consumidores e uma maior reacão face a tantas incertezas.

 

As grandes lições

Se há algo que a pandemia nos ensinou foi a importância da resiliência das cadeias de abastecimento, da agilidade organizacional e da inovação constante. Também ficou claro que o investimento em pessoas – a valorização e capacitação das equipas – é tão estratégico quanto o investimento em tecnologia.

A sustentabilidade, que já era uma prioridade antes de 2020, ganhou uma dimensão inadiável. Hoje, ser sustentável não é apenas uma questão reputacional – é um imperativo de sobrevivência e competitividade. E pode e deve ser medida.

Outro ensinamento fundamental é a necessidade de colaboração entre todos os atores do ecossistema económico. Nenhuma empresa, sector ou país pode, isoladamente, enfrentar os desafios globais que temos pela frente. Estes primeiros meses de 2025 são bem demonstrativos disto mesmo!

Finalmente, a pandemia obrigou a tomadas de decisão muito ágeis, com enorme risco e com base de conhecimento relativamente baixa.

Hoje, mais do que nunca, essa agilidade e risco mantêm-se, mas o imperativo da “avaliação de impacto” (ou impact assessment, se quisermos usar a expressão inglesa) ganhou uma nova dimensão: é fundamental avaliar o impacto de muitas decisões e recomendações, sobretudo do ponto de vista ambiental e legal, pois, se não o fizermos, podemos estar a pôr em risco a sobrevivência das empresas, sobretudo as PMEs, em nome de uma sustentabilidade que todos queremos e pela qual todos lutamos, mas com propósito, eficiência e eficácia. Para o bem comum.

 

O futuro: desafios e oportunidades

Olhando para a frente, as empresas de distribuição enfrentam um contexto simultaneamente desafiante e entusiasmante. O impacto da inteligência artificial generativa, a personalização em escala, as novas exigências regulatórias em matéria de sustentabilidade e direitos dos consumidores e a pressão sobre custos e margens obrigam-nos a reinventar modelos de negócio, a acelerar a transição digital e a reforçar o foco na criação de valor partilhado.

O consumidor do futuro quererá marcas que sejam relevantes, mas também responsáveis. Procurará experiências de compra fluidas, personalizadas e integradas – sem nunca abdicar dos princípios de ética, inclusão e sustentabilidade.

É neste contexto que a APED, enquanto associação mais representativa do sector, assume, uma vez mais, o seu papel de catalisador da transformação, promovendo a inovação, a formação contínua dos profissionais e o diálogo construtivo com os decisores políticos, com os sindicatos e a sociedade.

O APED Retail Summit 2025 foi, precisamente, um espaço de reflexão e projeção sobre esta nova era do retalho. O evento reuniu líderes nacionais e internacionais para discutir os caminhos de um futuro mais resiliente, mais inclusivo e mais sustentável para o sector. Vamos estar atentos às suas indicações e conclusões.

Cinco anos depois da pandemia, a distribuição moderna em Portugal não é apenas mais forte: é mais próxima, mais inovadora e está mais preparada para os desafios de uma sociedade em transformação.

As empresas responderam ao desafio. E quem ganhou foi o consumidor. Todos nós.

A APED continuará assim a exercer o seu papel agregador e demonstrador de boas práticas, para colaborar com as empresas e com o sector, para liderar o futuro!

Gonçalo Lobo Xavier, diretor geral APED
Gonçalo Lobo Xavier
diretor geral APED

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