Elsa Veloso, CEO DPOConsulting
Elsa Veloso, CEO da DPOConsulting
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“A credibilidade, notoriedade e ‘goodwill’ são o ativo mais valioso e crítico de qualquer marca e organização”

Elsa Veloso, advogada, especialista em privacidade de dados e segurança da informação e CEO da DPO Consulting, aborda os desafios presentes e futuros da proteção de dados e segurança da informação no digital.

 

Grande Consumo – À medida que a introdução do digital nos hábitos quotidianos se apresenta como uma realidade incontornável, existem, contudo, alguns riscos associados à sua proliferação. Quais são, de forma resumida, os principais desafios colocados às transações digitais no presente momento?

Elsa VelosoSão várias as esferas sobre as quais poderemos analisar este tópico, pelo que irei cingir-me aos desafios referentes aos dados e informações pessoais.

A União Europeia está a regular cada vez mais a transferência de dados, na qual assenta a Indústria 4.0. A circulação de dados – de informação pessoal ou de negócio –, que acontece aquando de qualquer transação digital, vem, efetivamente, colocar um conjunto de desafios, cujo entendimento antecipado do alcance, dimensão e oportunidade constituirá um fator decisivo para qualquer organização, podendo dar origem a uma reorganização da cadeia de valor da indústria, nomeadamente, ao nível dos “players”.

Na verdade, no panorama regulatório atual, temos em vigor no espaço europeu o Regulamento Geral de Proteção sobre Dados (RGPD) que impõe medidas que obrigam a definir, documentar e implementar processos, a implementar estruturas de “governance”, bem como formar e sensibilizar os colaboradores da necessidade de alteração de comportamentos de risco face às ameaças da segurança da informação e às ainda mais críticas ameaças cibernéticas provenientes da interligação global, do fim das fronteiras e perímetros físicos das organizações e da reduzida maturidade das organizações face a estes riscos.

Estão em vigor leis que vêm obrigar à adoção de um conjunto de medidas que garantam a resiliência e uma mitigação do risco de ataques, em conjunto com a capacidade de responder adequadamente e repor os níveis de serviço num espaço de tempo definido e aceitável.

Foi já apresentado pelo Centro Nacional de Cibersegurança o quadro de referência de Cibersegurança, que é a base da conformidade para as organizações e empresas europeias (Programa de Certificação da ENISA – Agência Europeia de Cibersegurança), de forma a poderem demonstrar evidências na chamada “Digital Trust” ou confiança digital, perante os seus parceiros de negócio no mercado único europeu, medida basilar da Comissão Europeia para o aumento da competitividade da Europa face ao panorama EUA/China.

Cumprir toda esta regulamentação pelas organizações é o maior de todos os desafios no presente momento.

 

“O constante aumento do número de ataques cibernéticos, com consequências financeiras significativas, alerta para a necessidade de incluir o risco de ataques cibernéticos e violações de dados (pessoais, de negócio ou de propriedade intelectual) na análise de risco corporativa”

 

GC – Black Friday, Cyber Monday e Natal são algumas das efemérides que geram inúmeras transações de bens e serviços. São, igualmente, alturas de risco acrescido, no que diz respeito à integridade dos dados dos consumidores? Ou o risco é algo que existe, independentemente do pico de utilização das infraestruturas?

EVO constante aumento do número de ataques cibernéticos, com consequências financeiras significativas, alerta para a necessidade de incluir o risco de ataques cibernéticos e violações de dados (pessoais, de negócio ou de propriedade intelectual) na análise de risco corporativa, sob pena da estratégia das empresas estar a ser definida ignorando um crescente fator de disrupção.

As maiores empresas do sector, maduras nas suas políticas e processos internos, mais poderosas financeiramente, estão progressivamente a aumentar o grau de rigor no processo de seleção dos seus parceiros e fornecedores (por exemplo, novos contratos e adendas para subcontratantes com base no RGPD e realização de auditorias), o que se traduz numa crescente exigência, baseada em evidências de responsabilidade demonstrada, confiança e resiliência. As empresas maiores sabem que o risco é algo que existe sempre, talvez acrescido no pico de utilização das infraestruturas.

 

GC – É possível pensar no comércio eletrónico e na sua expansão crescente sem pensar, igualmente, na coexistência com ameaças que serão, necessariamente, mais complexas mediante a evolução dos sistemas transacionais?

EVEste desafio externo vem colocar o repto às empresas, independentemente da sua área de negócio, de assumirem a decisão estratégica de serem inovadoras e proativas perante os requisitos de segurança da informação provenientes da regulação europeia e internacional.

Esta proteção, cada vez mais necessária, estende-se, naturalmente, aos parceiros e clientes de cada empresa, dada a interligação crescente dos sistemas de informação. A decisão dos líderes não é sobre “se” ,mas sim “como” e “quando” e “hoje” já não é cedo.

 

GC – Fishing, smishing, entre outros, são expressões que começam, pelas razões erradas, a fazer parte do nosso dia-a-dia. Que medidas podem, e devem, as empresas implementar para fazer da experiência de compra digital uma experiência positiva e segura?

EVCumprir todas as regulamentações existentes em matéria de privacidade, proteção de dados e segurança da informação, terem fornecedores conhecedores das melhores soluções e constituírem equipas mistas, internas e externas, altamente qualificadas nesta área.

 

“Só uma excelente reputação pode ser o alicerce da confiança e a chave para a fidelização de consumidores, conquista de novos clientes e para o aumento da quota de mercado”

 

GC – A promoção de uma experiência de compra segura é um fator crítico para que os operadores mantenham a sua reputação? Pode-se retirar o fator reputação da dimensão de serviço prestado por um determinado operador? Comprar na Internet é também um fator de confiança? A credibilidade de um operador é um fator crítico de sucesso na era digital?

EVA credibilidade, notoriedade e “goodwill” são o ativo mais valioso e crítico de qualquer marca e organização. Só uma excelente reputação pode ser o alicerce da confiança e a chave para a fidelização de consumidores, conquista de novos clientes e para o aumento da quota de mercado.

 

GC – A profusão dos serviços prestados baseados em plataformas tecnológicas irá, igualmente, potenciar mudanças no mercado de trabalho? Novas necessidades de resposta obrigam a outro tipo de qualificações e, por consequência, novas competências ao nível da formação, do ensino e da empregabilidade?

EVSem dúvida. Julgo que o principal desafio diferencial estará sempre mais ao nível das “soft skills”, desde logo, competências aparentemente simples, como sejam a gestão do tempo, a autonomia, a capacidade de gerar ao empregador confiança. Todas estas competências vão ser cruciais na valorização dos profissionais.

Paralelamente, é intrínseca a necessidade de um domínio absoluto das tecnologias, quer as existentes, quer a adaptação às novas tecnologias. É obrigatória uma plasticidade mental para aprender e ensinar, a capacidade de gerar empatia com a intermediação dos ecrãs, para além do entendimento de ferramentas específicas, como é o caso atual, por exemplo, de routers, VPN´s e todas as tecnologias de trabalho à distância. 

 

GC – A implementação do RGPD já se encontra devidamente concretizada em Portugal?

EVO RGPD veio regular, no âmbito da União Europeia, o tratamento de dados pessoais e a segurança dos sistemas de informação. Este regulamento acarreta mudanças e avanços significativos na segurança e gestão da privacidade individual e coletiva, afetando todas as organizações no espectro do tratamento de dados de cidadãos europeus. Falamos de um contributo essencial para a reputação e credibilidade das organizações, ao fornecer bases e diretrizes essenciais para implementarem.

Em Portugal, existem graus de maturidade bastante distintos entre as organizações e nos diversos sectores do nosso tecido empresarial. De forma geral, as empresas de maior dimensão e as multinacionais estão já em fase de melhoria contínua, de auditorias a terceiros e com uma performance avançada nesta área. Por oposição, as pequenas e médias empresas apresentam uma maior variação nos níveis de preparação e nos processos de implementação.   

O caminho percorrido neste campo está a ser globalmente positivo, contudo, temos ainda um longo percurso conjunto pela frente. Há que continuar a ter como bússola a literacia tecnológica, a segurança e a obrigatoriedade do RGPD, dado que as multas são reais e estão a ser aplicadas. Apenas desta forma poderemos continuar a seguir o rumo certo.

Por Bruno Farias

Diretor na revista Grande Consumo. Um eterno sonhador, um resiliente trabalhador. Pai do Afonso e do José.

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