Seca histórica ameaça comércio europeu

Reno com baixo nível de água, causado pela seca prolongada em 2018, Renânia do Norte-Vestefália, Alemanha Foto Shutterstock

Do Reno ao Danúbio, as vias navegáveis estão a secar, à medida que a crise climática se agrava, o que poderá causar uma séria ameaça ao comércio na Europa.

Uma reportagem do Bloomberg dá conta de que, por exemplo, o Reno, pilar das economias alemã, holandesa e suíça durante largos, deverá ainda esta semana tornar-se praticamente intransitável num dos seus pontos de passagem fundamentais, causando perturbações nos fluxos comerciais de gasóleo e carvão. Já o Danúbio, que percorre através da Europa Central até ao Mar Negro, também está a secar, o que poderá dificultar o comércio de cereais, entre outras mercadorias.

Em toda a Europa, o transporte é apenas um dos elementos do comércio fluvial que tem sido prejudicado pelas alterações climáticas. A crise de energia em França agravou-se porque o Ródano e o Garona estão demasiado quentes para arrefecer eficazmente os reatores nucleares e o Pó está demasiado baixo para permitir regar os campos de arroz e sustentar as amêijoas para ‘pasta alle vongole’”, descreve o Bloomberg. No extremo sul do Desfiladeiro do Reno, uma área conhecida pelos vinhos Riesling, as vinhas tornaram-se castanhas.

Embora as perturbações nas vias navegáveis sejam um desafio em qualquer altura, acontecem numa altura em que a Europa se debate com as dificuldades causadas pela invasão russa da Ucrânia alimenta a inflação, nomeadamente, ao nível do fornecimento de alimentos e de energia. A situação acontece apenas quatro anos após uma paragem histórica do transporte marítimo no Reno e, diz o Bloomberg, acrescenta urgência aos esforços da União Europeia para tornar o transporte interior mais resiliente.

 

Contributo de 80 mil milhões de dólares

De acordo com os dados Eurostat citados na referida reportagem, os rios e os canais do Europa transportam anualmente mais de uma tonelada de carga para cada residente da União Europeia e contribuem com cerca de 80 mil milhões de dólares para a economia da região, apenas como modo de transporte.

As más condições deverão arrastar as economias da região para valores muito piores do que os cinco mil milhões de causados pelos problemas de trânsito no Reno em 2018, segundo Albert jan Swart, economista de transportes do ABN Amro Bank NV citado pelo Bloomberg.

O Reno é o rio mais importante da Europa e desempenha um papel fundamental no transporte de mais carvão para as centrais elétricas alemãs, de modo a compensar o impacto da pressão da Rússia no fornecimento de gás. “A administração do chanceler Olaf Scholz receia que os problemas de transporte marítimo possam minar os planos de revitalização de algumas instalações, de acordo com pessoas familiarizadas com a situação”, descreve o Bloomberg.

Colónia, Alemanha, 10 de agosto de 2022: um barco de excursão no Reno quase seco
Foto gerd-harder/Shutterstock

 

Crise energética

A reportagem nota que a França, que normalmente exporta energia, não pode, neste momento, ajudar a aliviar a crise energética, porque apenas metade dos reatores nucleares do país estão disponíveis. Os restantes estão em manutenção. A Noruega também está a preparar-se para limitar as exportações de eletricidade, ao priorizar o reenchimento de reservatórios sobre a produção de energia.

A escassez de água nas bacias hidrográficas da Europa afeta um quarto do território da região, revela a Agência Europeia do Ambiente.

O Reno, que está ligado ao Danúbio através de um canal, percorre cerca de 1.300 quilómetros através de zonas industriais suíças e alemãs, antes de se desaguar no Mar do Norte, no porto de Roterdão, nos Países Baixos. De acordo com o Bloomberg, para algumas empresas, esta via é insubstituível. “A rede ferroviária alemã enfrenta um congestionamento crónico, ao mesmo tempo que a mudança para a estrada também não é tarefa simples. São necessários mais de 110 camiões para transportar a mesma carga que uma barcaça média e a Alemanha sofre de uma escassez de cerca de 80 mil camionistas, que se torna mais severa à medida que os ucranianos regressam ao seu país para combater a invasão da Rússia”, lê-se na reportagem.

 

Perda das vantagens competitivas

Juntamente com o aumento dos preços do gás, à medida que a Alemanha termina as importações da Rússia, as dificuldades de transporte através de rios como o Reno podem potencialmente representar a perda das vantagens competitivas de muitas fábricas. “No mínimo, significa ter de fazer mais stock e, na pior das hipóteses, pode significar que a produção se aproxime dos portos marítimos, onde há água suficiente para o transporte marítimo e infraestruturas energéticas, como terminais de gás natural liquefeito”, nota o Bloomberg.

O Reno está atualmente a um nível inferior do que estava nesta altura do ano em 2018, quando a água baixa, durante o outono, reduziu cerca de 0,4% da produção total alemã, de acordo com um estudo do Instituto Kiel para a Economia Mundial citado na reportagem. Nils Jannsen, um dos autores, diz que a estimativa é um bom começo para aferir os danos este ano.

No vale do Pó, em Itália, onde se concentra cerca de 30% da produção agrícola do país, o calor o e as condições excecionalmente secas prejudicaram já a produção de milho e de girassol e obrigaram os produtores de arroz a cortar as plantações, após o rio ter caído para o nível mais baixo em 70 anos. O estado de emergência foi declarado em cinco regiões do norte e centro de Itália, que já alertou que cerca de um terço da sua produção agrícola, uma das maiores da União Europeia, está em risco.

No Danúbio, estão em curso operações de dragagem de emergência na Bulgária, Roménia e Sérvia e os navios estão parados à espera que os canais sejam limpos. Os pontos mais críticos são na área de Zimnicea, ao longo da fronteira entre a Roménia e a Bulgária, e mais abaixo em Cernavoda, o que afeta o transporte para a Ucrânia.

Delta do Danúbio, em agosto de 2022
Foto Shutterstock

Impacto no turismo

Além do transporte, o turismo também está a sentir o impacto da seca nos rios europeus. Diz o Bloomberg que, no final de julho, o navio de cruzeiro Adora, de 135 metros, estava a caminho de Passau, na Alemanha, a partir do delta do Danúbio, com mais de 130 passageiros. Com o nível da água a baixar, os turistas tiveram de apanhar um voo de Bucareste.

A reportagem salienta, ainda, que as vias navegáveis são parte fundamental dos esforços da União Europeia para combater as alterações climáticas. Nos seus planos de transição verde, a Comissão Europeia aponta para um aumento de 25% no transporte por via navegável interior e navegação marítima de curta distância, até 2030. O esforço é apoiado pelo fundo Horizonte Europa, de 95,5 mil milhões de euros, que apoia o investimento em embarcações de águas pouco profundas e trabalhos de engenharia para tornar as rotas mais fiáveis.

Seca sem precedentes no rio Pó, devido à falta de chuva. Turim, Itália, julho 2022
Foto Shutterstock

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