“A inovação foi, é e terá que, cada vez mais, fazer parte do nosso ADN”

Bruno Calvão, Country Manager Pernod Ricard Portugal ©Sara Matos
Bruno Calvão, Country Manager Pernod Ricard Portugal ©Sara Matos

Portugal é o segundo mercado, a nível mundial, onde a Pernod Ricard aposta na introdução da chamada categoria de “low-alcohol” com o lançamento de duas referências com menos álcool e menos calorias nas categorias de whisky e gin. Uma resposta às mais recentes tendências de consumo e a um consumidor que privilegia, cada vez mais, estilos de vida mais saudáveis e consumos equilibrados, que não tardará a encontrar eco noutras categorias de bebidas espirituosas. Lançamento que ocorre no rescaldo de um ano muito complicado para a companhia, sabendo-se a importância que o canal On-Trade tem, em Portugal, para este sector, mas que, por isso mesmo, ganha ainda mais pertinência. É esta “customer centricity” que tem permitido à Pernod Ricard Portugal reagir e adaptar-se a este contexto mais adverso, ao ponto de conseguir continuar a conquistar quota de mercado em valor. O desafio, diz-nos Bruno Calvão, recentemente nomeado country manager da filial portuguesa, é, precisamente, continuar a escutar o que o consumidor quer e a entregar a inovação de que necessita, cumprindo aquela que é a visão da companhia.  

 

Grande Consumo – A que se deve a aposta na introdução de duas novas referências “low-alcohol” no mercado nacional? Era o lançamento certo, na altura certa? Quais os objetivos quantitativos e qualitativos associados a este lançamento?

Bruno Calvão – Este lançamento vem no sentido de, como empresa, estarmos sempre muito atentos ao que o consumidor procura e às novas tendências. A procura do consumidor por um estilo de vida saudável, em todos os aspetos, não é de agora, está instalada desde há alguns anos. O Grupo Pernod Ricard sentiu que era uma tendência de consumo e iniciou um processo de desenvolvimento de produtos para oferecer experiências muito aproximadas, mas adaptadas a um estilo de vida mais saudável e a um consumo mais equilibrado.

Estes dois lançamentos surgem em cima de duas marcas fortes e com notoriedade nas duas principais categorias em Portugal: whisky e gin. Nesse sentido, o objetivo foi oferecer um produto que trouxesse o sabor com metade do álcool e das calorias, que são mensagens às quais o consumidor, neste momento, está muito recetivo.

Sentimos já muito interesse no retalho moderno, com os clientes a quererem a dar espaço em linear. Quando assim acontece de forma natural, é uma garantia de que os produtos vão ter uma muito boa recetividade.

Em termos de objetivos, no espaço de três a cinco anos, consideramos que estas duas referências podem assumir um peso entre 10% a 15% destas marcas, o que é algo relevante, tendo em conta que estamos a falar de duas marcas já com uma penetração e uma notoriedade muito elevadas junto dos consumidores portugueses.

 

GC – Beefeater e Ballantine’s são as duas marcas do vasto portfólio da Pernod Ricard para o arranque desta categoria. Não teria feito mais sentido avançar com Jameson, marca estrela da companhia em Portugal, para introduzir esta categoria nos hábitos de consumo?

BC – Efetivamente, Jameson é o nosso primeiro “battleground”. É marca líder em valor na categoria de whisky em Portugal. 

No entanto, somos uma multinacional e, orgulhosamente, fomos o segundo mercado no mundo a receber estas duas referências, a seguir a Espanha. E no mercado espanhol, é Ballantine´s que assume essa posição de liderança na categoria de whisky, daí ter feito sentido a opção por essa marca, sendo um mercado com a dimensão que tem. Em Portugal, é também uma marca fortíssima, sobretudo no retalho moderno. 

 

GC – A inovação está muito associada a Ballantine’s que, no passado, já introduziu algumas variantes de sabor à sua oferta base, como, por exemplo, Ballantine’s Brasil. É este ADN, posicionamento e ecletismo que fizeram de Ballantine’s a marca adequada para introdução do “low-alcohol”, numa categoria de espirituosas tão representativa como a do whisky?

BC – A inovação foi, é e terá que, cada vez mais, fazer parte do nosso ADN, como grupo e como filial que aproveita a inovação do grupo para perceber o que é que o consumidor está à procura e lançar novos produtos.

Hoje, falamos de uma inovação de produtos light dentro destas duas categorias, whisky e gin; amanhã, o nosso objetivo, enquanto filial, é espalhar esta inovação e esta tendência para outras categorias, às quais o consumidor também vai estar atento e em busca de versões que permitam desfrutar da experiência, mas com um consumo mais equilibrado.

Temos um portfólio vasto, somos das companhias em Portugal com a gama mais extensa, com todas as categorias, incluindo brandy, com uma marca local que é Macieira, e champanhe. 

 

“Em termos de objetivos, no espaço de três a cinco anos, consideramos que estas duas referências podem assumir um peso entre 10% a 15% destas marcas, o que é algo relevante, tendo em conta que estamos a falar de duas marcas já com uma penetração e uma notoriedade muito elevadas junto dos consumidores portugueses”

 

GC – A quem se dirigem estas propostas de valor? O que mudou no seu método de produção?

BC – No caso de Beefeater, estamos a falar de um produto que, na sua base, tem Beefeater Dry, constituído por nove botânicos e é composto por ingredientes 100% naturais e que, depois, através do processo, se consegue uma redução de álcool. Não é simples conseguir um produto que satisfaça o objetivo e que tenha exatamente o sabor, cumprindo o ciclo do que o consumidor de hoje está à espera. 

 

©Sara Matos

 

GC – Consumir melhor, não consumir mais, é esta a premissa base associada a este lançamento?

BC – Efetivamente, sim. Continua a ser um dos nossos pilares a promoção de um consumo responsável. Quando temos produtos num segmento mais “high end”, trata-se de beber com melhor qualidade, em vez de beber mais. Quando estamos a falar de produtos que permitem um consumo mais equilibrado, é exatamente esse equilíbrio e nunca beber demais.  

 

GC – Não receiam a canibalização de outras referências do portfólio? 

BC – Em todas as categorias, existe sempre um risco de canibalização. Agora, as empresas que dão estes passos primeiro são também as que colocam estas referências de que o consumidor está à procura em primeiro lugar. São marcas que, depois, ficam no “top of mind”. Daí ser, também, muito importante ser a Pernod Ricard Portugal a lançar esta categoria, através destas duas marcas. 

 

GC – Como se gere o espaço em prateleira, cada vez mais diminuto e concorrido?

BC – É sempre um espaço conquistado. Obviamente, quando temos clientes que mostram interesse na proposta, e porque também querem ser os primeiros a oferecê-la ao consumidor, torna-se tudo mais fácil e rápido. O próprio retalho quer promover e, muitas vezes, a forma de o fazer é dar espaço de linear a produtos que, no futuro, vão ter o seu espaço, mas que têm um caminho a trilhar, em termos de rotação e experimentação.  A experimentação é decisiva, é o fator crítico de sucesso de qualquer inovação.

GC – O que representa para a Pernod Ricard Portugal o facto de o mercado nacional ter sido o segundo, a nível europeu, a acolher o lançamento destas novidades?

BC – Estamos a falar de uma Pernod Ricard que é colíder mundial em bebidas espirituosas e Portugal tem uma dimensão pequena, enquanto mercado. Mas há estudos recentes que dizem que os portugueses são dos consumidores da Europa mais recetivos a experimentar coisas novas. Isto, dá-nos argumentos para sermos um mercado de teste. 

Além disso, a Pernod Ricard Portugal já deu provas de que tem uma equipa que faz com que as coisas aconteçam. Em termos de execução e nas práticas de grupo, já o demonstrámos. É mais um motivo de orgulho sermos o segundo país a testar esta inovação.

 

©Sara Matos

 

GC – O país aguarda a reabertura da atividade económica em pleno. A restauração é um dos pilares da nossa economia. Como é que a companhia observou o fecho generalizado da restauração? 

BC – A Ibéria é um dos mercados de bebidas espirituosas onde o canal On-Trade pesa cerca de 70%. O negócio foi altamente penalizado. 

No fundo, o consumo de bebidas espirituosas, na sua generalidade, teve uma queda drástica, porque, embora os consumidores se voltassem um pouco para o consumo dentro do lar, não compensou, nem de perto nem longe, o que é cultural. O canal alimentar cresceu em muitas categorias, fruto dessa transferência forçada, mas contranatura. No fundo, as bebidas espirituosas estão associadas a convívio em grupo e isso deixou de existir. 

 

GC – A parceria com a Univum.pt foi a forma encontrada para levar as marcas da companhia até onde estavam os consumidores? É um canal onde pretendem continuar a apostar? Retirar a experiência de consumo, do “perfect serve” e do mixing é retirar a “alma” do que é a companhia e as suas marcas?

BC – O digital cresceu três dígitos, mas a partir de uma base muito pequena, e a sua participação nas bebidas espirituosas continua a ser reduzida.

Convém não esquecer que, mesmo na compra “on-demand”, através das plataformas de delivery, havia restrições de horários de venda, o que fez com que se refreasse um pouco a compra de bebidas espirituosas. 

A Pernod Ricard, atenta e reativa, também fez as suas parcerias e cresceu no digital, mas, mais uma vez, a partir de uma base pequena, que continuou reduzida. Com as perspetivas de abertura do On-Trade, o consumo voltará a acontecer fora de casa, independentemente de continuarmos a estar atentos e a desenvolver as nossas parcerias, até porque o online vai ter sempre mais impacto nas gerações mais jovens e tecnológicas. 

 

GC – Vamos assistir a uma desvalorização do PVP médio das bebidas espirituosas em Portugal, tendo em conta a crise que se avizinha?

BC – Sinceramente, penso que não. Obviamente, sabemos que as consequências da pandemia são graves para todas as fileiras de agentes económicos, quando falamos de hotelaria e restauração. 

Como as outras empresas do sector, fazemos parte da ANEBE, que é a associação que, em Portugal, representa os interesses das pequenas, médias e grandes empresas de bebidas espirituosas, e o esforço tem sido sempre no sentido de conseguir apoios para os agentes económicos mais lesados. Convém não esquecer que, pela atomização que existe na hotelaria em Portugal, a maior parte dos negócios é familiar. É a isso que devemos estar atentos. É uma preocupação não só em termos de negócio, mas sobretudo social. As entidades competentes têm que perceber que estamos a falar do sustento de famílias, não estamos a falar de grupos empresariais. 

 

GC – A Pernod Ricard é uma empresa mais vocacionada para trabalhar o canal Horeca ou o canal alimentar?

BC – A Pernod Ricard Portugal demonstrou que está vocacionada para trabalhar os dois canais, de forma muito competente. Sendo certo que onde fazemos o “brand building” das nossas marcas é no On-Trade, quando os consumidores estão a desfrutar da experiência de consumo. Proporcionar bons momentos de consumo faz parte do nosso ADN. 

Mas descobrimos também, nesta pandemia, onde a única janela que ficou aberta, durante o tempo todo, foi o Off-Trade, que conseguimos crescer acima da categoria e ganhar quota de mercado em valor. O que significa que, independentemente da estratégia e de sabermos que as marcas se constroem no On-Trade, percebemos onde estavam os consumidores e soubemos reagir. 

 

“Em termos de objetivos, no espaço de três a cinco anos, consideramos que estas duas referências podem assumir um peso entre 10% a 15% destas marcas, o que é algo relevante, tendo em conta que estamos a falar de duas marcas já com uma penetração e uma notoriedade muito elevadas junto dos consumidores portugueses”

 

GC – O Bruno Calvão está há dez anos na companhia, tem tido um percurso ascendente, passando por diversas áreas de negócio. Enquanto Country Manager da Pernod Ricard Portugal, qual é o maior desafio que considera ter pela frente?

BC – Já ando no mundo das bebidas espirituosas há mais anos e na Pernod Ricard há dez, desde 2015 como diretor de marketing, os últimos dois anos como diretor comercial e agora como Country Manager. Fiz parte daquilo que foi o desenvolvimento da estratégia, da visão de onde queríamos e como queríamos ir. No fundo, o nosso percurso, desde essa altura, foi conseguir ganhar quota de mercado e aproximar da liderança e, neste momento, estamos a 2,7 pontos. Isso mostra-nos que tem sido um caminho bem feito.

Agora, nesta nova posição, o desafio é o de dar continuidade a esta ambição. É continuar a crescer e a fazer com que as nossas marcas sejam as favoritas dos consumidores e, com isso, consolidarmos o nosso negócio.

 

©Sara Matos

 

GC – Alguma vez lhe passou pela mente estar à frente da companhia num contexto adverso à economia e à sociedade, como o presentemente vivido?

BC – É um desafio para todas as pessoas. Na Pernod Ricard, o meu desafio é, também, como vamos viver daqui para a frente, sabendo que há coisas que vão mudar. Temos muito presente aquilo que é o consumidor e é olhando para ele que conseguimos pivotar a nossa estratégia, saber o que é inovação relevante. Como todos nós, o consumidor mudou, está-se a readaptar e ainda não se sabe bem como será o chamado “novo normal”. Esse é o desafio individual de cada um de nós e estamos todos a aprender.

Só na partilha e na aprendizagem de todos os dias é que conseguiremos todos fazer com que o mundo seja melhor, depois de tudo isto. Há coisas importantes no negócio, mas um negócio sem os valores que tínhamos, sem o nosso convívio, também não faz sentido. Pessoas isoladas em casa não são pessoas felizes. A nossa visão, escrita antes da pandemia, talvez faça, hoje, ainda mais sentido, que é impactar positivamente as pessoas: a nossa equipa, os nossos clientes, os nossos consumidores. Esse é o meu desafio como líder, mas também como indivíduo.

 

GC – O que seria um bom exercício de 2021 para a Pernod Ricard Portugal?

BC – A Pernod Ricard trabalha em anos fiscais que vão de julho a junho. O ano fiscal terminado em junho ficou marcado pelo impacto do encerramento do On-Trade, durante os primeiros três meses, e por muitas restrições também em novembro e dezembro. Isso fez com que tivesse sido pior que o anterior.

A forma como olhamos para o novo ano fiscal, iniciado agora em julho, é positiva. Poderemos voltar, de forma gradual, para um cenário onde vai ser possível, com moderação e respeitando as regras, voltar à nossa vida um bocadinho mais normal e, quando isso acontece, o nosso negócio tem um impacto positivo direto. 

No entanto, ainda não perspetivamos que, neste ano fiscal, possamos estar ao nível do de 2019, onde a pandemia não teve qualquer impacto e em que Portugal registou dos melhores indicadores económicos dos últimos anos. Terá de ser um caminho gradual, até podermos estar em linha com 2019. Quando for possível tornar a receber, de forma segura, turistas, Portugal será, por todos os motivos e mais alguns, um destino privilegiado e essa reta de aceleração será mais rápida. 

 

Este artigo foi publicado na edição N.º 69 da Grande Consumo.

 

Por Bruno Farias

Diretor na revista Grande Consumo. Um eterno sonhador, um resiliente trabalhador. Pai do Afonso e do José.

Da necessidade, à felicidade

Ivan Mellado, diretor geral da Puratos Portugal ©Sara Matos

“A Puratos é líder do mercado português no total dos três sectores de atuação, com o dobro da quota do segundo ‘player’”