O mercado nacional de café e chá apresenta-se, este ano, com algum dinamismo, embora o crescimento não tenha abrangido todos os seus segmentos. Assim o dizem os últimos dados Nielsen Market Track que reportam, no ano móvel findo na semana 32/2017, decréscimos acentuados, em valor e em volume, na categoria dos chás e dos cafés solúveis. Por outro lado, o segmento de café torrado, principalmente dinamizado pelas vendas de cápsulas, apresenta um aumento em valor ao longo do período analisado.
O consumo de café e chá em Portugal está a evoluir e a indústria ligada a este universo mostra-se cada vez mais dinâmica. Contudo, o consumo continua a ser predominantemente feito dentro de casa. Segundo os dados da Nielsen, os portugueses consumiram 12 milhões de quilogramas de café no ano móvel findo na semana 32/2017. Este volume de vendas representa um acréscimo de apenas 1% em relação ao período anterior para a categoria de cafés, misturas e sucedâneos torrados. O desempenho do segmento está principalmente marcado pelas vendas em valor, numa categoria presente em 81% dos lares em Portugal Continental e que atinge, no período em análise, 233,8 milhões de euros, o que representa um crescimento de 8%.
Por seu turno, a categoria de cafés, misturas e sucedâneos solúveis apresenta um decréscimo discreto em ambos os indicadores. Ao longo do período analisado, foram comercializados 3,8 milhões de quilogramas, o que representa uma diminuição de 3%, e as vendas em valor desceram 1%, para os 55,7 milhões de euros.
Tiago Aranha, Client Business Partner da Nielsen, comenta que a categoria de cafés torrados, assim como as infusões, dois motores de crescimento deste mercado, têm sido dinamizadas pelas cápsulas. “Este formato é não apenas o mais importante como também o que apresenta as maiores variações no último ano. O aparecimento das cápsulas alterou e continua a alterar a forma como consumimos café. Se, por um lado, as cápsulas têm um esforço promocional superior à média dos bens de grande consumo e são cada vez mais promocionadas, por outro, há mais lares a consumi-las, em detrimento do café em grão, em pastilhas ou moído. Este é o único formato responsável por simultaneamente trazer mais lares compradores, colocá-los a ir mais vezes às compras e a gastarem mais em cada ida”.
Cápsulas
No entender de Rui Miguel Nabeiro, administrador do Grupo Nabeiro/Delta Cafés, a evolução significativa do consumo dentro do lar nos últimos anos, tanto em volume como em valor, deve-se, sobretudo a duas variáveis “Por um lado, fatores macroeconómicos que fizeram com que os consumidores retraíssem o seu consumo fora do lar, por outro lado, a capacidade do sector de se reinventar e inovar, conseguindo criar novas soluções e produtos que replicassem facilmente a mesma tipologia de consumo de café no canal Horeca para dentro do lar”.
Este desempenho e dinamismo do sector beneficiou do surgimento de um segmento de mercado ao qual os consumidores continuam rendidos. “Quando falamos de consumo de cápsulas de café, verificamos um crescimento significativo nos últimos anos devido à qualidade dos equipamentos disponíveis para consumo no lar, à excelente qualidade do café e ao conforto associado a este tipo de consumo. Hoje em dia, o café consumido em casa tem uma excelente qualidade e o preço é muito competitivo. O mercado de cápsulas, tal como o consumo no lar, está com crescimento acima de dois dígitos no que diz respeito à colocação de máquinas de café encapsulado. Na minha opinião, a tendência é que este crescimento se mantenha, tendo em conta a transferência do consumo de café em grão para café em cápsulas, em ambos os canais”, reforça, por sua vez, Pedro Henriques, diretor comercial e de marketing da Kaffa.
Desempenho que tem potenciado o aparecimento de cada vez mais marcas a ter as cápsulas na sua gama de produtos, a apresentação de novos produtos e referências e a criação de novas experiências para os consumidores que estavam habituados a apenas consumir café. “A venda das máquinas de café em cápsula tem vindo a ganhar peso ano após ano e, de acordo com os dados da GfK, nos últimos três anos, estas já representaram mais de 80% do total das vendas dos sistemas de máquinas de café em Portugal”, detalha Victor Manuel Martins, Business Executive Officer da direção Cafés da Nestlé Portugal. “Esta transformação no mercado de máquinas refletiu-se numa transformação da categoria de café. O segmento de cápsulas é hoje um dos maiores segmentos de bens de grande consumo no retalho alimentar (de acordo com a Nielsen no TAM de agosto este segmento vale aproximadamente 187 milhões de euros e está a crescer a 12%), já representa 68% do total das vendas em valor da categoria de bebidas quentes e continua a ser o segmento mais dinâmico desta categoria. Neste momento, de acordo com os dados fornecidos pela Kantar, as cápsulas já estão presentes em mais de 64% dos lares de Portugal Continental”.
Mas isto não significa que o consumo fora de casa não venha a recuperar. Aliás, esta é a perspetiva do responsável da Nestlé, que se mostra otimista quanto ao desempenho do Horeca. “Durante vários anos, com o aparecimento das cápsulas e com a crise económica, registou-se uma transferência do consumo fora de casa para o consumo dentro do lar. Atualmente, com a recuperação da economia e o ‘boom’ do turismo em Portugal, o consumo fora do lar voltou a aumentar. A Nestlé tem apresentado resultados positivos de forma global, e em cada um dos seus canais, e em 2017 destacamos a boa performance das marcas Nescafé Dolce Gusto, Mokambo e Sical, tal como no Horeca das nossas quatro marcas locais Buondi, Sical, Christina e Tofa e da nossa marca internacional Nescafé. As nossas vendas (sem Nespresso) estão divididas entre retalho e Horeca numa proporcionalidade de 58% para 42%”.
Crescimento
É a inovação no segmento de cápsulas que está, no entender da Nestlé, a reforçar este movimento para o interior de casa. “A inovação representa a alavanca deste mercado, trazendo valor acrescentado ao panorama nacional. A Nestlé reinventou a forma de tomar café e bebidas em casa com os lançamentos da Nespresso e de Nescafé Dolce Gusto, imprimindo novas dinâmicas a este mercado e continua a fazê-lo”, afirma Victor Manuel Martins.
Já o aparecimento das marcas próprias veio dinamizar o sector, porque contribuiu para trazer novos consumidores a este mercado. “O crescimento das MDD’s é uma oportunidade para os produtores de cápsulas de café, onde o desafio é não apenas o de democratizar o seu consumo, mas também de apresentar inovação como produtos de mono origens específicos e qualidade indiscutível”, diz Pedro Henriques. “São uma oportunidade que se transforma num desafio”, reforça Rui Miguel Nabeiro. “O mercado está em constante mutação e todas as marcas nele inseridas pretendem que o seu produto seja o escolhido. Logo a presença das MDD+PP abre caminho a mais qualidade na oferta, a mais variedade e deixa a certeza que há mais rigor e atenção na elaboração do produto, neste caso concreto do café, seja em cápsula, seja moído”, acrescenta.
Quanto ao futuro, a componente de inovação e valor acrescentado serão o pilar de um mercado em que o consumidor procura e demonstra a necessidade de qualidade e diferenciação. “O mercado de café é extremamente dinâmico e existem disponíveis inúmeras marcas de grande qualidade. Tratando-se de um mercado de grande envergadura, é natural que surjam regularmente novas referências, mais inovadoras e sofisticadas. É preciso estar atento ao mercado, entender o consumidor e inovar. É o que fazemos na Kaffa: anualmente investimos cerca de 500 mil euros em análise, investigação e desenvolvimento”, conclui o diretor comercial e de marketing da Kaffa, para quem o futuro passa pelo contínuo crescimento do mercado de cápsulas, não só ao nível do tipo de cápsula, como também no que se refere ao tipo de máquina e de bebidas que podem ser extraídas desses equipamentos.
Fora do universo estrito das cápsulas, o consumo das especialidades de café com leite terá tendência a aumentar, assim como as novas formas de consumo como o Ready to Drink ou o Cold Brew, entre outras.
A inovação desempenha, assim, um papel crucial no desenvolvimento desta categoria, onde, de acordo com Tiago Aranha, quase 10% do negócio no último ano fez-se com novos SKU’s.
Chás
Inovação que tem sido, assim como no negócio do café, fundamental para o segmento de chás e infusões. “A inovação continua a ser um dos principais pilares do Grupo Nabeiro/Delta Cafés, no que diz respeito ao lançamento de novos produtos. Consideramos que é um dos principais fatores para o crescimento das nossas marcas. É preciso ser diferente, inovar, estar próximo dos consumidores, criar tendências, acrescentando valor e proporcionando experiências únicas”, defende o administrador do grupo.
No período analisado pela Nielsen, o segmento dos chás foi, principalmente, alavancado pelas infusões. Os chás perderam 8% em volume e 9% em valor, ao passo que as infusões cresceram 5% em volume e 9% em valor.
Os dados da Kantar Worldpanel indicam que perda de compradores e as cestas menores como a principal razão para a quebra do mercado de chás quentes. O chá verde e as infusões de plantas estão a impactar a dimensão da cesta e apenas as infusões de fruta escapam à perda de compradores.
A aposta na inovação torna-se, assim, fundamental para a sustentabilidade do negócio, uma vez que traz valor acrescido ao mercado. “A Delta Q continua a ser uma marca que oferece qualidade, simplicidade e proporciona momentos de partilha. Ao mesmo tempo, a marca tem-se reinventado constantemente ao lançar novos produtos para além do café, como é o caso das tisanas e, mais recentemente, a primeira cápsula de cevada”.
Este artigo foi publicado na edição n.º 47 da Grande Consumo, já disponível online para consulta e a chegar, em breve, na sua versão em papel.