A Associação Portuguesa de Empresas de Distribuição (APED) e mais cinco associações empresariais apelam aos decisores europeus e nacionais para alargarem o período de transição do Regulamento Anti-Desflorestação, de modo a garantir todas as condições necessárias à sua correta e atempada implementação.
A complexidade dos processos operacionais, incluindo o atraso no desenvolvimento de um sistema informático próprio a cargo da Comissão Europeia, e as insuficientes informações e orientações para as empresas se prepararem atempada e adequadamente para esta nova regulamentação podem colocar em causa o funcionamento da cadeia de abastecimento e afetar os consumidores.
Num manifesto sobre o tema, também subscrito pela CAP (Confederação de Agricultores de Portugal), FIPA (Federação das Indústrias Portuguesas Agro-Alimentares), Centromarca (Associação Portuguesa de Empresas de Produtos de Marca), IACA (Associação Portuguesa dos industriais de Alimentos Compostos por Animais) e APEL (Associação Portuguesa de Editores e Livreiros), associações de sectores diretamente visados pelo regulamento, pede-se não apenas o alargamento do período de transição, mas continuar a cooperação com os diferentes elos da cadeia de valor.
Regulamento Anti-Desflorestação
O Regulamento Anti-Desflorestação impõe um conjunto de obrigações aos operadores económicos, a partir de 30 de dezembro, que visam garantir que os bens comercializados na União Europeia e os que são exportados para fora do espaço comunitário não são produzidos com matérias-primas provenientes de áreas que tenham sofrido desflorestação após dezembro de 2020. Na lista de produtos abrangidos estão, por exemplo, a carne de bovino, o café, o cacau, a palmeira-dendém, a soja, a borracha, a madeira ou os produtos impressos.
Uma das obrigações principais é a emissão de declarações de diligência, que devem ser introduzidas num sistema de informação próprio, cuja criação e manutenção está a cargo da Comissão Europeia, mas encontra-se num patamar manifestamente atrasado.
Para se verificar se os bens provêm, ou não, de zonas desflorestadas é exigido que sejam emitidas, ao longo de toda a cadeia de produção e distribuição, múltiplas “declarações de diligência devida” (DDD), que identificam o produto e o seu local de origem ao nível da parcela de produção. São também exigidas evidências de que foi cumprida a legislação em vigor no país de produção para o produto abrangido, nomeadamente em termos de direitos de propriedade, consentimento livre, prévio e informado, direitos humanos e legislação ambiental.
A complexidade dos processos operacionais em causa e a falta de informação e orientações que ajudem as empresas a esclarecer dúvidas sobre a aplicação do regulamento impedem que se adaptem devidamente às novas regras e aos respetivos procedimentos, colocando em risco o cumprimento dos objetivos do próprio regulamento, que, por sua vez, afeta toda a cadeia de fornecimento e, em última escala e com consequências sérias, os consumidores.
Além do aumento da carga burocrática e dos encargos financeiros, existe um risco real de as micro e pequenas empresas não conseguirem cumprir o regulamento por incapacidade de adaptação, com impacto em toda a cadeia, designadamente no que se refere à produção nacional.
Disrupções na cadeia de fornecimento
Outro importante alerta assinalado pelos subscritores do manifesto são os sinais de que fornecedores de países terceiros poderão vir a redirecionar a sua oferta para outros destinos que não a União Europeia por incapacidade ou falta de disponibilidade para cumprir com as obrigações que o regulamento impõe, bem como para o risco real de se poder assistir a disrupções na cadeia de fornecimento, de que poderão resultar escassez e aumento do preço dos bens à disposição dos consumidores.
“Totalmente comprometidos com a execução progressiva dos objetivos do regulamento como parte do esforço global para travar a desflorestação, preservar a biodiversidade e cumprir com as metas do Pacto Ecológico Europeu”, os signatários do manifesto consideram inevitável e urgente o alargamento do período de transição para a implementação para, pelo menos, seis meses após os sistemas informáticos e os critérios de classificação de risco de os países estarem totalmente operacionais e harmonizados e dar seguimento a um trabalho de cooperação com os diferentes elos da cadeia de valor, em conjunto com as entidades oficiais, que garanta um alinhamento claro com as necessidades práticas das empresas e a sua implementação sustentável.
“A iniciativa reflete a preocupação crescente de um conjunto de sectores estruturantes da economia nacional face à aproximação da data de implementação do Regulamento Anti-Desflorestação e tem um objetivo claro: apelar aos vários intervenientes políticos que intercedam junto da Comissão Europeia para que esta reconsidere os termos de implementação do regulamento e alargue o período de transição do diploma, até estarem asseguradas as condições de prontidão e eficácia dos requisitos técnicos que permitem às empresas cumprirem as suas obrigações, sem colocar em causa a sua atividade e a cadeia de valor”, declara o diretor geral da APED, Gonçalo Lobo Xavier.
“A indústria agroalimentar tem sido parceira na implementação das medidas políticas que visam a proteção do planeta e reconhece que o combate à desflorestação deve ser um desígnio mundial. Não pode, no entanto, deixar de exigir que as medidas atualmente previstas sejam implementadas com transparência, permitam uma adaptação de toda a cadeia de valor e não coloquem em risco o abastecimento nacional”, acrescenta Jorge Henriques, presidente da FIPA.
“Para a CAP, esta iniciativa é demonstrativa de que toda a cadeia de valor pode ser impactada com um regulamento que não tem em conta a realidade dos produtores, da indústria e da distribuição e que, por isso, tem de ser repensada e recalendarizada para não pôr em causa toda a cadeia e, assim, os consumidores”, afirma Luís Mira, secretário-geral da CAP.