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Ó tempo volta para trás…

Foi indiscutivelmente uma década feliz e muito marcante. A música, a moda ou mesmo a comida e bebida deixaram saudades e, mais de 20 anos depois, estamos a fazê-los regressar. Falamos de coisas como os Adidas Stan Smith, os míticos gelados Rol e Fizz da Olá ou os relógios da Casio. Um dos maiores fenómenos a despoletar este revivalismo é a Revenge Of The 90s, a “festa” que revolucionou Lisboa e está a percorrer o país.

Porque é que os anos 90 estão tão na moda? “É a memória! Não existe nada mais forte na vida que a memória”. Quem o diz é André Henriques, um dos criadores da Revenge Of The 90s, um conceito que ultrapassa a festa comum e é uma verdadeira viagem no tempo.

Num jantar de amigos surgiu a ideia de reativar um conceito de festa que já tinha sido feito há cerca de oito anos, mas sem grande sucesso, o “Let’s Control The 90s”. “Somos duas produtoras de eventos que trabalham juntas há muitos anos e somos essencialmente amigos há mais de 20 anos. Julgámos que era altura de fazermos uma festa que fosse mais que uma música dos anos 90 a ser passada. Começámos a dar ideias, ao mesmo tempo que pensávamos ‘isto nunca vai acontecer’, mas fomos apontando tudo, escolhemos o nome e avançámos”. Para lançar o mote, começaram com algo que seria impossível na década de 90: um movimento digital. “Através de um hashtag digital, chamado ‘RevengeOfThe90s’, começámos. Colocávamos uma fotografia nossa com este hashtag e um texto que desafiava três amigos a colocarem também uma fotografia sua dos anos 90, sob pena de terem de pagar um Capri-Sonne. Em pouco tempo tornou-se viral, desde a nossa concorrência a figuras públicas a aderir, de norte a sul do país. Uma semana e meia mais tarde decidimos revelar ao mundo que aquilo não era um desafio de Facebook ou Instagram, mas sim uma festa”, explica.

Foi assim que a discoteca A Lontra recebeu a primeira festa Revenge of The 90s, a 11 de fevereiro do ano passado. 500 pessoas estiveram presentes. No passado mês de abril, na FIL, deram a sua maior festa, para 12 mil pessoas. Valor só ultrapassado com a presença no Rock in Rio Lisboa. Desde os músicos, com convidados como os Anjos, Santamaria ou os Vengaboys, aos brindes oferecidos, como os Pega Monstros ou as Peta Zetas, à indumentária dos convidados, que retiraram os casacos da Adidas e as calças subidas dos armários, tudo respira anos 90. Mas, afinal, o que é que os anos 90 têm de tão interessante?

Regresso ao passado
Diversas marcas, de diferentes sectores de atividade, parecem estar a apostar num regresso aos anos 90. Algumas gerações depois, a (agora) coreana FILA está a infiltrar-se no guarda-roupa dos Millennials, com os seus Disruptor. Também os Superstar ou os Stan Smith da Adidas vieram para ficar, em diversas cores e novos modelos. Outro regresso é o das máquinas fotográficas instantâneas, ao estilo Polaroid. A Fujifilm lançou diversos modelos, como a Instax Mini 8 ou a Instax Mini 70. Já a HP optou por aliar o desejo de voltar a ter as fotografias fisicamente à qualidade fotográfica dos smartphones. Com a HP Sprocket, é possível imprimir uma fotografia instantânea, diretamente através da galeria do smartphone.

Na área alimentar, os desejos dos consumidores foram ouvidos e algumas marcas fizeram regressar produtos marcantes da década de 90. É o caso dos gelados Rol e Fizz da Olá, que voltaram a fazer parte da carta da marca. No caso do Rol, chegou inclusive a circular uma petição online para trazer o gelado de chocolate e baunilha de volta.

Também a Nestlé ouviu atentamente os seus consumidores e recuperou o Milo. Começou a ser vendido em Portugal na década de 50 e rapidamente se tornou num dos achocolatados preferidos dos portugueses. Na década de 90 desapareceu do mercado, mas em 2013, depois dos muitos pedidos dos portugueses, voltou às prateleiras dos supermercados. Em 2015, depois de menções no Twitter, Youtube e petições online, a PepsiCo anunciava o regresso temporário da Pepsi Crystal. Nos últimos três anos a empresa tem lançado edições limitadas deste produto, lançado pela primeira vez em 1992, que se têm revelado um sucesso. Infelizmente, neste caso, o regresso ainda não chegou a Portugal.

Outro regresso de peso é o da máquina de furos Regina. Inicialmente lançada nos anos 40, a máquina que acompanhou gerações desapareceu do mercado na década de 90. Em 2013, por hora da celebração do 85.º aniversário da marca, a Imperial, detentora da Regina, voltou a colocar estas máquinas no mercado. O processo é o mesmo: carregar num dos furos faz cair uma bola colorida que garante sempre um chocolate. O que muda é a moeda, uma vez que agora tem de pagar em euros, e não em escudos, para receber o “prémio”.

Se o revivalismo está na moda, as marcas não podem, nem devem, querer ficar de fora desta febre. Prova disso são as marcas associadas à Revenge Of The 90s. Se a verdade é que começaram sozinhos, hoje, as marcas parceiras saltam à vista no evento. “Nós começámos sem ninguém, recusámos tudo. Tivemos algumas propostas, mas fomos orgulhosamente sós. Apesar de fazermos eventos há muitos anos e de termos marcas parceiras, tínhamos alguma confiança nisto, não que chegasse a esta dimensão, claro, mas fomos sós para ter alguma margem negocial. Desde a terceira festa que temos a Sagres Mini, que investiu e acreditou em nós, deixando nas nossas mãos uma parte muito importante, que é a liberdade de nos deixarem sugerir a ativação para que esta entre de forma natural. Temos ainda a G-Shock, ou seja, a Casio, a Bacardi Martini, a Adidas, a Gazela e a Seven Up, que infelizmente já não tem o Fido. As marcas que estão connosco sentem que estamos a crescer e que estão a crescer connosco. Fomos bater às portas e estas, felizmente, têm-se aberto”, explica André Henriques.

Do imaginário coletivo dos anos 90 fazem parte artistas, programas, locais e sabores. Foi por isso mesmo que a organização decidiu que, mais do que uma festa, teria de ser uma experiência sensorial. O bilhete, em formato de CD ou disquete, os balões com alusões à Baywatch ou ao Gameboy, a banda vestida de Power Rangers ou as imagens que passam do Big Show SIC e d’O Juiz Decide provam isso mesmo. Um verdadeiro “playground para adultos”, que quer ir mais longe e conquistar a Europa.

O sucesso da festa é um exemplo da oportunidade que existe para as marcas em trazer de volta sucessos que remetem para uma década marcante a vários níveis. Se é comum dizer-se que a moda é cíclica, e isso pode explicar o regresso de peças como os óculos Ray Ban, os Stan Smith ou os Converse All Star, no que diz respeito à área alimentar, musical ou a objetos como consolas e máquinas fotográficas, o fascínio pode residir apenas na vontade de “ter coisas”, num mundo onde cada vez mais tudo é efémero. “Vivemos atualmente no imaterial. Não temos VHS ou DVD em casa, estamos menos com as pessoas, trocamos mais mensagens, é tudo mais ‘aéreo’. Penso que a nostalgia dos anos 90 vem muito daí: as coisas eram palpáveis. Por isso, é que existe um regresso ao vinil, à cassete, à Polaroid. Hoje, é tudo muito rápido e menos consistente, as pessoas estão tão dispersas que, quando lhes apresentam um conceito que permite ser digital, mas material ao mesmo tempo, existe uma união tão grande em torno de algo”, remata André Henriques.

Este artigo foi publicado na edição n.º 51 da Grande Consumo.

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