O outono é a estação certa para metáforas políticas: as folhas caem, os discursos ganham tons de amarelo e castanho e as sondagens mudam de cor como as árvores no parque. No dia que escrevo este artigo, e à medida que o país se prepara para as eleições autárquicas, é inevitável pensar que, tal como nas prateleiras do supermercado, também na política há produtos de confiança, novidades com rótulos vistosos e algumas promoções que deixam o consumidor desconfiado.
Se os partidos fossem marcas, Portugal seria um hipermercado cheio de carrinhos a bater uns nos outros, entre corredores de promessas e caixas automáticas que nunca funcionam.
Comecemos pelo PS, o eterno campeão de fidelização. Está em todo o lado, conhece bem o consumidor médio e aposta no equilíbrio entre conveniência e previsibilidade. É o género de marca que lança uma campanha “Poupe metade no próximo ciclo eleitoral” e consegue que o público volte sempre, mesmo quando o produto já perdeu alguma frescura. O espírito da casa mantém-se: confiança, continuidade e aquele conforto de quem, entre o arroz e as massas, prefere o que “a experiência de compra habitual”.
O PSD seria a marca rival, ligeiramente mais arrumada e de tons contrastantes, mas que insiste em parecer próxima do povo. Adora slogans curtos, fala de poupança e aposta num tom familiar e próximo de quem promete “boas contas e bons preços”. A marca tenta gerir o espaço entre a nostalgia dos antigos folhetos e a urgência de reconquistar clientes perdidos para rótulos mais barulhentos. É aquela marca que até pode liderar as vendas, mas agora disputa a atenção com novidades mais picantes e embalagens mais agressivas.
E por falar em agressividade, o Chega seria a insígnia das campanhas ousadas, cheia de cor, sons e frases que se ouvem até no parque de estacionamento, uma cadeia nascida no pós-guerra e em rápido crescimento por toda a Europa. É rápido, eficiente e vende a ideia de que o consumidor inteligente compra “fora do sistema”. Às vezes, o que conta não é o sabor, mas o choque visual. O problema é que nem sempre o produto resiste ao teste do tempo — embora ninguém negue que dá conversa à caixa e não quer maus pagadores nas lojas.
A Iniciativa Liberal (IL) seria a marca recente que chegou com corredores limpos, iluminação branca e preços bem alinhados. O desafio é manter o estilo minimalista e a promessa de eficiência. O cliente típico da IL é racional, faz contas e gosta de sentir que está a escolher com liberdade. Sai da loja com poucos produtos, mas todos em embalagem própria.
O Bloco de Esquerda (BE) é mais uma Loja do Cidadão do que um supermercado ou hipermercado: tem balcões temáticos, é difícil de encontrar o que quer que seja, embarca em botes rumo a causas popularuchas e que tragam “gostos”. Mantém o espírito de proximidade, mas enfrenta a dificuldade de convencer o consumidor de que os seus produtos alternativos ainda têm lugar num mercado saturado. O catálogo é coerente na incoerência, o design apelativo para o TikTok — só falta o impulso da compra.
O PCP/CDU é o clássico supermercado de bairro, de letreiro antigo, onde os clientes se conhecem pelo nome. Teimosamente fiel à origem, não cede às modas nem às promoções importadas. Mas, ultimamente, as luzes do letreiro começam a falhar. As antigas lojas da rede foram sendo absorvidas por uma grande cadeia e o velho emblema com tons vermelhos vai desaparecendo das esquinas. Ainda assim, há quem entre todos os dias para comprar o pão e a memória.
O Livre seria a loja de produtos biológicos e de comércio justo. O espaço fala pausadamente, as prateleiras têm citações de filósofos e tudo cheira a sustentabilidade democrática. É agradável, com música ambiente e bons princípios — embora o público, em tempos de inflação, nem sempre esteja disposto a pagar mais por ideais com certificação ecológica.
O PAN ocupa a secção vegetariana da mesma galeria: discreta, cuidada, com clientela fiel. É uma marca ética, coerente e tranquila, que preenche bem o nicho, mas ainda luta para transformar curiosidade em hábito. É comprada mais por convicção do que por impulso.
O CDS-PP, por sua vez, lembra aquele antigo armazém elegante e em tons ocres que já teve grandes clientes e anúncios nas revistas, mas que hoje sobrevive entre memórias e campanhas de saldos. A loja resiste com estoicismo, mantendo o mesmo cheiro a cera e madeira encerada de outros tempos.
No fundo, cada partido tem o seu corredor, o seu público e a sua estratégia de marketing. Há os que apostam em fidelização, os que vivem de campanhas relâmpago e os que resistem à modernização. A política portuguesa é, cada vez mais, uma experiência de consumo: o eleitor entra, compara rótulos, vê as ofertas e, no fim, escolhe o que parece mais fresco.
Mas o problema das marcas é que, por mais que mudem de embalagem, continuam a vender o mesmo produto. E, por mais que o consumidor se irrite, acaba sempre por voltar — até porque ninguém gosta de chegar a casa e perceber que esqueceu de comprar governo.
Na altura em que este artigo for lido, já as urnas fecharam e as autárquicas são já passado, veremos quais as marcas que ganharam espaço na montra. Talvez o PS recupere o corredor central, o PSD perca alguns metros de exposição e o Chega conquiste mais prateleiras locais. Talvez o BE e o PCP se mantenham nas secções especializadas e a IL se apresente como marca “em reestruturação”. Ou talvez surja, lá ao fundo, uma nova etiqueta com design moderno e promessa de autenticidade.
Porque, no grande hipermercado da política portuguesa, o cliente — isto é, o eleitor — continua a ser o mesmo: queixoso, exigente, mas fiel à velha máxima nacional — “muda-se o rótulo, mas o sabor é o mesmo”.
Este artigo foi publicado na edição N.º 95 da Grande Consumo

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