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“A nossa ambição é normalizar a reutilização como uma escolha de consumo mainstream”

Entrevista com Rob Cassedy, CEO da Wallapop

Wallapop NAVER

Fundada em Barcelona há pouco mais de uma década, a Wallapop tornou-se um dos motores da economia circular no sul da Europa. Com mais de 19 milhões de utilizadores ativos e uma comunidade que gera 100 milhões de anúncios por ano, a plataforma quer ir além da simples revenda de artigos usados: ambiciona mudar a forma como consumimos. Em entrevista, Rob Cassedy, CEO da Wallapop, explica como a parceria com a NAVER vai acelerar a inovação tecnológica, reforçar a confiança e consolidar o papel da marca como referência europeia em re-commerce sustentável.

 

Wallapop NAVER
Rob Cassedy, CEO da Wallapop

A Wallapop tornou-se um dos principais impulsionadores do mercado de artigos em segunda mão no sul da Europa. Como vê a evolução do papel da Wallapop na economia circular europeia e global mais ampla nos próximos anos?

A Wallapop foi fundada em 2013, em Barcelona, e desde então expandimos as nossas raízes para o mercado italiano e português. Em pouco mais de uma década construímos uma comunidade sólida de mais de 19 milhões de utilizadores que nos visitam todos os meses e que, em conjunto, criam mais de 100 milhões de anúncios anualmente. Estes dados ilustram não só a nossa consolidação como um dos principais motores no mercado de re-commerce no Sul da Europa, mas também a crescente predisposição dos consumidores para a economia circular.

E o nosso papel vai muito além de conectar compradores e vendedores: estamos a criar um ecossistema vivo, com um inventário único que prolonga a vida útil de milhares de produtos, reduz o desperdício e democratiza o acesso dos consumidores a bens mais acessíveis. E este último ponto é especialmente relevante num contexto em que a economia global atravessa uma instabilidade crítica, com tensões geopolíticas, guerras comerciais, riscos de recessão e em que os orçamentos familiares são os primeiros a sentir o impacto. O mercado de segunda mão continuará a crescer como uma alternativa mais acessível, e a Wallapop manter-se-á não só como uma ponte que facilita escolhas de consumo mais responsáveis, mas também como uma ferramenta que apoia diretamente a economia quotidiana das pessoas.

 

O que diferencia a Wallapop de outras plataformas de revenda, como a Vinted, o eBay ou o Facebook Marketplace?

Em particular, o principal ponto de diferenciação da Wallapop é a ampla variedade de categorias de produtos que oferecemos. Os utilizadores podem encontrar e vender praticamente tudo, desde eletrónica a acessórios de moda, veículos e muito mais. Em Portugal, por exemplo, algumas das categorias mais populares incluem tecnologia, artigos para casa e jardim, acessórios para bebés e crianças e até moda, o que demonstra claramente a versatilidade da plataforma.

Outro pilar distintivo é a geolocalização, que permite aos utilizadores ligar-se de forma mais local ou, através do Wallapop Envios, a um espectro mais alargado. Esta flexibilidade gera valor real, ligando mercados e oferecendo uma experiência mais próxima do comércio eletrónico tradicional, mas com foco na reutilização.

 

A mentalidade cultural em torno dos produtos em segunda mão no sul da Europa está a mudar e o que está a impulsionar essa mudança?

Sem dúvida. Está em curso uma clara mudança cultural, mas o preço continua a ser o driver dominante. Em Portugal, por exemplo, segundo o nosso estudo La Red del Cambio, 94% dos portugueses indicam o custo como fator decisivo. No entanto, a sustentabilidade está a ganhar terreno, influenciando as escolhas de 80% dos

consumidores, o que reflete uma maior consciência do impacto ambiental das escolhas individuais. O que observamos é uma dupla motivação: poupar dinheiro e, ao mesmo tempo, adotar hábitos de consumo mais responsáveis, que se está a materializar para lá de puras intenções: 8 em cada 10 portugueses já compraram ou venderam artigos em segunda mão.

 

O mercado de segunda mão tem crescido globalmente. Quais são as tendências de comportamento do consumidor mais significativas que observa em Portugal e no sul da Europa?

Os padrões em Portugal são semelhantes a Espanha e Itália: consumidores cada vez mais conscientes, que valorizam tanto o preço como a sustentabilidade. Em termos de categorias de produtos, assistimos a uma adesão mais expressiva em produtos de moda, tecnologia, e mobiliário.

 

Que tecnologias ou capacidades específicas da NAVER espera integrar primeiro na plataforma?

A nossa prioridade é reforçar a posição da Wallapop como uma plataforma de confiança, ao mesmo tempo que potenciamos as nossas capacidades com a experiência tecnológica da NAVER. Esta parceria abre um novo capítulo de crescimento, inovação e liderança para a Wallapop no Sul da Europa. Embora ainda estejamos a explorar áreas específicas, a integração centrar-se-á em tecnologias que possam acelerar o nosso pipeline de inovação e proporcionar melhorias tangíveis na experiência do utilizador, garantindo que a Wallapop continua a crescer mantendo a confiança, a segurança e a comunidade no centro.

 

A NAVER tem um historial de capacitação de campeões locais. Como é que esta abordagem irá beneficiar a equipa, a marca e os utilizadores da Wallapop?

Esta abordagem da NAVER de capacitar campeões locais é uma enorme vantagem para a Wallapop, porque nos permite crescer mantendo a nossa identidade, cultura e ligação à nossa comunidade de utilizadores. Para a equipa, significa acesso a mais recursos, tecnologia e know-how. Para a marca, reforça a credibilidade e a força no mercado, mostrando que podemos expandir mantendo a essência que nos tornou relevantes. Para os nossos utilizadores, traduz-se numa experiência melhorada, com mais funcionalidades, maior confiança e mais oportunidades de participar numa economia circular cada vez mais robusta.

 

Como é que a Geração Z está a influenciar o crescimento do re-commerce e como é que a Wallapop se está a adaptar às suas expectativas?

A Geração Z é nativa digital e ambientalmente mais consciente. Para estes consumidores, comprar em segunda mão não é apenas uma questão de poupança, mas também de identidade e valores. No sector da economia circular, e em particular com vista a responder às exigências das novas gerações, existe um potencial significativo para alavancar novas tecnologias como a Inteligência Artificial (IA) e a Realidade Aumentada (RA) para transformar a forma como os consumidores fazem as suas escolhas. De acordo com um estudo recente da Wallapop, 79% dos consumidores portugueses acreditam que estas ferramentas podem ser cruciais para possibilitar decisões de compra mais informadas e ambientalmente responsáveis.

 

Para além das categorias tradicionais, como a moda e a eletrónica, que categorias de produtos emergentes estão a ganhar força na plataforma?

Além das categorias mencionadas, livros, artigos para casa e jardim e produtos para bebés e crianças estão entre os que registam maior tração na plataforma. A ampla variedade de produtos disponíveis no Wallapop permite que o catálogo se adapte a diferentes perfis de utilizadores, de acordo com os seus interesses.

 

Como é que a Wallapop planeia expandir o seu impacto ambiental para além da redução de CO₂ alcançada em 2024?

Não se trata apenas de CO₂. Ao promover a reutilização em larga escala e prolongar a vida dos produtos, a Wallapop ajuda a reduzir a extração de novas matérias-primas e a produção de novos bens, sejam plásticos, aço, alumínio ou até água. Mas talvez o mais importante seja estarmos a ajudar a mudar os hábitos de consumo dos indivíduos para escolhas mais sustentáveis.

De acordo com o nosso estudo Red del Cambio 2024, 70% dos portugueses compram regularmente produtos em segunda mão ao longo do ano, números que colocam Portugal ao nível de pioneiros da economia circular como a Suécia ou a Dinamarca.

O impacto ambiental desta mudança já é significativo. Só em 2024, a escolha da nossa comunidade de comprar em segunda mão em vez de novo ajudou a evitar 450 mil toneladas de CO₂. Olhando em frente, a nossa ambição é ampliar este impacto, continuando a normalizar a reutilização como uma escolha de consumo mainstream, garantindo que cada compra possa ser uma compra sustentável.

 

Como é que mede e comunica as suas contribuições ambientais aos utilizadores e decisores políticos?

Na Wallapop, acreditamos que a sustentabilidade deve ser simples e fazer parte do quotidiano. Por isso, integramo-la diretamente na experiência do utilizador, ajudando as pessoas a visualizarem o impacto positivo de cada transação de forma clara e tangível.

Para isso, desenvolvemos o nosso Modelo de Impacto com a Deloitte, uma metodologia rigorosa que quantifica os benefícios ambientais e económicos da reutilização — medindo não só o CO₂, mas também a poupança de água, plástico, metais e resíduos. Tornamos este impacto visível através de resumos personalizados na aplicação e traduzimos os dados em equivalências do dia-a-dia, para que qualquer pessoa possa compreender como as suas escolhas contribuem para uma mudança significativa.

Publicamos também estes resultados em relatórios anuais de sustentabilidade e partilhamos com os decisores políticos para evidenciar o potencial crescente dos mercados de segunda mão e apoiar a adoção de políticas de economia circular.

 

Além da sustentabilidade, como é que a Wallapop contribui para as comunidades locais e a inclusão económica?

A Wallapop está comprometida com a criação de oportunidades económicas inclusivas. Através de uma plataforma acessível, democratizamos o acesso a bens acessíveis, permitindo aos utilizadores poupar de imediato, ao mesmo tempo que capacitamos qualquer pessoa a vender artigos de que já não precisa e a gerar rendimento adicional.

 

Quão importante é para a Wallapop manter a sua sede e operações em Barcelona?

Barcelona continuará a ser o centro operacional da Wallapop, o que permite reforçar o valor da marca e preservar a sua identidade. A integração na estrutura de governação mais ampla da NAVER é feita protegendo o que torna a Wallapop única, em linha com o modelo da NAVER de manter a identidade e os valores dos seus parceiros.

 

Planeia expandir-se para novos mercados europeus sob a marca Wallapop ou adaptá-la regionalmente?

Por enquanto, estamos focados em consolidar a nossa presença nos mercados onde já operamos: Espanha, Itália e Portugal.

 

Como é que as inovações em pagamentos e logística estão a remodelar a plataforma?

Os Envios Wallapop, em parceria com operadores como os CTT e a DPD, já são um fator diferenciador, com preços competitivos a partir de €2,40. A aposta de melhoria contínua da logística e da integração de pagamentos seguros dentro da aplicação reforçam a confiança.

 

Podemos esperar que a Wallapop avance na integração de serviços mais circulares, como reparação, recondicionamento ou mercados de aluguer?

Atualmente, sabemos que várias lojas locais e, mais recentemente, marcas de referência como a Decathlon já estão a vender os seus produtos em segunda mão através da Wallapop. Na Wallapop, queremos ser o parceiro de eleição para as marcas que estão comprometidas com um modelo de consumo mais circular, prolongando a vida útil dos seus produtos e promovendo a reutilização.

 

Que oportunidades vê para parcerias estratégicas com marcas, retalhistas ou governos?

Na Wallapop, estamos convictos de que não é possível alcançar mudanças significativas sozinhos. A colaboração com partes interessadas está no centro da nossa visão de sustentabilidade. Orgulhamo-nos de fazer parte de alianças que ampliam a nossa visão, permitem partilhar aprendizagens, impulsionar quadros regulamentares mais ambiciosos e dar mais visibilidade à reutilização tanto na sociedade como na agenda pública.

Um exemplo claro é o Movimento “Re-úsalo”, lançado recentemente em Espanha. Esta aliança setorial foi criada para desbloquear todo o potencial da reutilização e promover um modelo de consumo mais resiliente e circular em todo o país.

Na Wallapop, orgulhamo-nos de colaborar com outras organizações-chave dentro do ecossistema de reutilização, incluindo a AERESS, a IKEA, a Milanuncios, a NESI e a Vinted, para avançar neste esforço coletivo.

A nossa ambição é ajudar a transformar o consumo para que a reutilização deixe de ser apenas uma alternativa e passe a ser a escolha preferida dos consumidores. Visualizamos um futuro em que milhões de pessoas escolham a reutilização em primeiro lugar, apoiadas por legislação que permita e fortaleça uma economia circular próspera.

 

Como mantém uma cultura empresarial forte enquanto navega por mudanças significativas, como aquisições e expansão?

Priorizamos uma comunicação transparente e contínua, para que todas as equipas compreendam não apenas o quê, mas também o porquê por detrás de cada mudança. Além disso, envolvemos ativamente as pessoas no processo, garantindo

que se sintam parte da transformação em vez de meras observadoras. Esta combinação permite-nos crescer e adaptar-nos sem perder a essência que nos trouxe até aqui.

 

Como CEO, o que o entusiasma pessoalmente mais nesta próxima fase do Wallapop?

O que mais me entusiasma é o que sempre me entusiasmou desde os primeiros passos da empresa: a possibilidade de elevar a Wallapop sempre a patamares mais altos e melhores, expandindo internacionalmente sem perder a nossa essência e a confiança dos nossos utilizadores, que estão no centro de todas as nossas decisões. Será interessante ver como podemos usar a inovação e a tecnologia para oferecer ainda mais valor aos utilizadores, ao mesmo tempo que reforçamos o nosso compromisso com a sustentabilidade e a economia circular. É inspirador pensar que podemos crescer enquanto temos um impacto positivo real na vida das pessoas.

 

Daqui a cinco anos, como será o sucesso do Wallapop sob a propriedade da NAVER?

Dentro de cinco anos, acredito que veremos a Wallapop consolidar-se ainda mais como uma plataforma europeia, com uma comunidade de utilizadores cada vez mais envolvida. Sob a propriedade da NAVER, teremos os recursos e a tecnologia para acelerar a inovação, melhorar a experiência do utilizador e expandir para novas soluções e oportunidades, mantendo sempre a nossa identidade e compromisso com a sustentabilidade.

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Por Bárbara Sousa

I am a journalist and news editor with eight years of experience in
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