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O que acontece quando se responde ao Aldi e Lidl na mesma moeda?

Chama-se Jack’s e quer ser a arma da Tesco para entrar em concorrência direta com Aldi e Lidl, as duas cadeias que mais crescem no Reino Unido. O nome presta homenagem a Jack Cohen, fundador do grupo de retalho britânico que, no próximo ano, celebra o seu centenário. “Alimentos de grande qualidade ao preço mais baixo possível”, assim se resume a proposta de valor da nova insígnia, que quer também apelar ao sentimento de patriotismo dos britânicos face à “ameaça” alemã e numa altura em que tanto se discute sobre a autossuficiência do Reino Unido num cenário pós-Brexit.

A Europa de Leste continua a ser terreno fértil para os operadores de discount, que aí conseguem uma quota de 27,4% das vendas de produtos de grande consumo. Esta quota é 10 pontos maior do que era há 10 anos, segundo mostram os dados da Kantar Worldpanel, no seu estudo “New Omnichannel: Finding growth in reinvented retail”.

A Polónia é o país onde o discount assume um maior protagonismo, cerca de 28,5% das vendas, e muito por “culpa” da Biedronka, insígnia com que a portuguesa Jerónimo Martins opera naquele mercado. Berço deste conceito de retalho, a Alemanha é o segundo país onde o discount é mais representativo, ao alcançar uma quota de 23,3%. Itália, com 20,2%, Espanha, com 15,7%, e Portugal, com 15,6%, são também mercados onde estes operadores têm uma presença relevante.

Mas no Reino Unido, anda tudo num alvoroço. São alianças de compras nacionais e internacionais, são fusões e aquisições. Tudo, porque Aldi e Lidl têm vindo, paulatinamente, a conquistar quota de mercado e a recrutar clientes, para prejuízo dos chamados Big Four. O Aldi, por exemplo, ultrapassou, no último ano fiscal, a barreira dos 10 mil milhões de libras de faturação no Reino Unido, ao atingir os 10.200 milhões, cerca de 11.495 milhões de euros, mais 16,4% que no exercício anterior. Face a estes resultados, quer continuar a crescer de forma orgânica, pelo que, entre 2019 e 2020, prevê abrir 130 novas lojas no país, ficando mais perto de atingir o objetivo de um milhar de pontos de venda, em 2022. Atualmente, o Aldi possui 775 lojas neste mercado. No ano passado, abriu 70, o mesmo número que prevê para 2018. Ocupa a quinta posição na distribuição alimentar no Reino Unido, com uma quota de 7,6%.

Como consequência desta aproximação dos operadores de discount, os grandes retalhistas britânicos estão a reagir e fazem-no usando as armas típicas daqueles. A começar pela redução significativa do sortido. De acordo com um estudo da consultora Scala, atualmente, o sortido médio de um operador de discount ascende a 7.500 referências, o que compara com as 30 mil de um supermercado. A Scala concluiu, contudo, que os grandes retalhistas estão a adotar as medidas de otimização do discount quanto à dimensão das encomendas para maximizar a capacidade da rede. John Perry, diretor geral da consultora, assegura que os grandes retalhistas “reconhecem que a sua quota de mercado está a contrair face à expansão das lojas de discount, com os clientes a preferirem a conveniência em detrimento do sortido, pelo que agora adotam esta abordagem”. Como resultado deste processo de otimização da oferta, a Scala antecipa que as referências reduzirão, em média, 10% para os fornecedores de produtos alimentares. A Tesco, por exemplo, já eliminou até 30% das suas linhas de produto, no âmbito do Project Reset, mas prepara-se para reduzir ainda mais o número de fornecedores com que trabalha, na próxima fase daquele programa.

Jack’s
Mas a Tesco foi ainda mais longe nesta sua luta com Aldi e Lidl. Enquanto muita da quota de mercado por estes conquistada se deveu a uma “supermercadirização” dos seus conceitos, a Tesco, um bastião do formato supermercado, preferiu fazer um “back to basics” e entrar em terreno do “inimigo”, através do lançamento da sua própria insígnia de discount. A 20 de setembro, inaugurou em Chatteris (Cambridgeshire) e Immingham (Lincolnshire) os dois primeiros pontos de venda Jack’s. Um conceito assente num modelo de negócio de baixo custo, desenvolvido para manter os custos controlados e os preços baixos.

Nos próximos seis meses, a retalhista britânica vai abrir 10 a 15 novas lojas, sob a nova insígnia, no Reino Unido. Os pontos de venda irão situar-se em locais completamente novos, em localizações adjacentes a lojas Tesco ou através da conversão de alguns espaços já existentes.

As lojas de aproximadamente 1.100 metros quadrados vendem cerca de 2.600 produtos, muito menos que uma típica loja Tesco, onde existem 35 mil, e apostam fortemente na marca própria – 1.800 referências – e na produção nacional, já que oito em cada 10 produtos à venda na Jack’s são “made in Britain”.

Com a concorrência claramente identificada, foi precisamente nela que a Tesco se inspirou para criar este conceito. A primeira coisa que se nota ao entrar numa loja Jack’s é o cheiro a pão fresco, o que é perfeitamente compreensível, uma vez que a zona de padaria está colocada logo à entrada da loja, a dar as boas-vindas aos clientes. Tal como acontece no Lidl. E a oferta de frutas e vegetais Fresh Five é muito semelhante à Super Six do Aldi. Além de que, tal como se verifica tanto neste como no Lidl, no centro das lojas Jack’s existe igualmente uma área dedicada às promoções em vigor até que o stock se esgote. Cartões de fidelização não são para aqui chamados, porque, apesar de pertencer à família Tesco, o cartão desta não é aceite nestes novos pontos de venda. E não haverá qualquer operação online.

À frente da nova insígnia está, coincidência das coincidências, um antigo diretor do Aldi no Reino Unido, Lawrence Harvey. Foi ele o responsável por encontrar alternativas que permitissem à Jack’s reduzir custos onde fosse possível. Por exemplo, os equipamentos de refrigeração custam menos 10% que os utilizados nos supermercados Tesco e no chão, em vez de ladrilhos, optou-se pelo cimento polido. Baseando-se no modelo dos operadores de discount, a Jack’s, que quer ser a mais barata de cada localidade onde estiver implantada, ambiciona operar com maior eficiência. Os corredores, por exemplo, são amplos o suficiente para que se possa fazer a reposição de stock, mesmo que a loja esteja cheia de clientes. A apoiar estão apenas 20 a 25 colaboradores em cada loja.

Perpetivas
Apesar das manifestas semelhanças entre a Jack’s e os seus concorrentes alemães, a grande questão que, neste momento, se coloca é se a Tesco poderá fazer funcionar este conceito e cumprir com a sua proposta de valor. O ceticismo é o sentimento dominante entre os analistas. Fraser McKevitt, da Kantar Worldpanel, não acredita que a Jack’s tenha impacto imediato no Aldi e o Lidl. “Já existem mais de 1.300 lojas de ambos no Reino Unido e têm uma quota de mercado combinada de 13,1%, pelo que a Jack’s terá de se concentrar no horizonte de longo prazo”. Já Nicholas Carrell, analista sénior na Mintel, defende que o verdadeiro teste à viabilidade do conceito para travar o crescimento de Aldi e Lidl estará na capacidade de cumprir a promessa do preço mais barato e expandir a sua presença física. Além de que não são só os operadores de discount que devem preocupar a líder do retalho britânico, que vê a sua liderança ameaçada pela fusão entre Sainsbury’s e Asda.

Poderá, então, a Tesco ser bem-sucedida num território onde Sainsbury’s e Netto não vingaram? A resposta a esta questão é, para já, desconhecida. Uma certeza, contudo, permanece, a vontade de se posicionar num dos mais dinâmicos canais de distribuição e onde os seus protagonistas não dão mostras de querer desacelerar o ritmo de crescimento e expansão imposto nos últimos tempos.

Efetivamente, os operadores de discount planeiam abrir até 10 milhões de metros quadrados de área de venda nos próximos cinco anos. Mesmo em mercados já saturados, existem oportunidades de crescimento, segundo um estudo da LZ Retailytics. Em 2021, o discount será um canal maior que o hipermercado. Enquanto o canal de desconto prevê abrir o equivalente à atual área de vendas do Carrefour na Europa, cerca de 10 milhões de metros quadrados, os hipermercados deverão ganhar apenas 1,8 milhões e os supermercados 4,1 milhões.

A expansão dos três maiores operadores – Lidl, Aldi Nord e Aldi Süd – não vai desacelerar e o seu crescimento é estimado em 6% ao ano, até 2023, com estes operadores de discount a continuarem a abrir lojas em simultâneo com a expansão das que já detêm e das gamas de produto, numa “supermercadirização” do seu conceito. O Lidl, por exemplo, prevê adicionar 20 metros de espaço em prateleira às suas lojas na Alemanha.

60% do crescimento do discount será feito na Europa Ocidental, com especial destaque para a Alemanha, um mercado supostamente saturado, mas onde os operadores continuarão a abrir novas lojas, sobretudo nos centros das cidades. Além disso, o crescimento poderá ser gerado via aquisições, como aconteceu recentemente com a Netto, a cadeia de discount da Edeka, que comprou lojas à Kaiser’s e Treff 3.000.

No Reino Unido, Aldi e Lidl estão envolvidos numa batalha pela liderança do canal, mas nenhum dos dois está presente no mercado de maior crescimento, a Rússia. A líder de mercado local, a Pyaterochka, quer fazer crescer as suas vendas em 18 mil milhões de euros. Também na Ucrânia e na Noruega, Aldi e Lidl não estão presentes, com o mercado entregue às cadeias locais.

No resto da Europa, o Lidl é a força dominante. O seu crescimento de 4,3% ao ano é inferior ao do Aldi Nord (5,4%) e da Pyaterochka (6,8%), mas em dimensão absoluta representa 2,5 milhões de metros quadrados de área de venda. A LZ Retayltics caracteriza o Lidl de “imparável”, a não ser que o Aldi, atualmente dividido em duas divisões, comece a trabalhar mais em conjunto.

Este artigo foi publicado na edição n.º 53 da Grande Consumo.

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