“Foi um grande erro convencer-nos de que o cliente só queria preço”

Domingos Esteves, diretor geral Espanha e Portugal da C&A ©Nani Gutierrez
Domingos Esteves, diretor geral Espanha e Portugal da C&A ©Nani Gutierrez

No século XIX, reinventou o sector ao oferecer moda confecionada numa grande variedade de tamanhos. No século XX, tornou mais fácil o acesso à roupa prêt-à-porter. Agora, no século XXI, quer democratizar a moda sustentável. Falamos da C&A, insígnia que, em 2021, assinala os seus 180 anos e que completa três décadas de operação em Portugal, mercado onde se estabeleceu, em 1991, tendo também contribuído para o que foi o desenvolvimento e dinamização do retalho não alimentar desde então. Se muito mudou nestes 30 anos, há princípios e valores que continuam a nortear a atividade da C&A e dos quais não abdica, como o forte pilar da sustentabilidade. Uma sustentabilidade que não é apenas ambiental, mas também financeira e do próprio negócio. Ou como nos sublinha Domingos Esteves, diretor geral de Espanha e Portugal da C&A, sem se gerar capital, não há como investir e manter postos de trabalho. Noção que faz com que o foco da insígnia, cada vez mais, se desvie de aspetos como preço e promoção, insistindo, em contrapartida, na questão do valor. É este o paradigma que a C&A quer continuar a consolidar para o futuro: para comprar melhor, o cliente não tem necessariamente de pagar mais. É o primado do preço justo e correto.

 

Grande Consumo – No ano em que a C&A Europa assinala os seus 180 anos de história, a C&A Portugal completa 30 no mercado português, onde se estabeleceu em 1991, com a inauguração da sua primeira loja, no CascaiShopping. Ao longo destas três décadas, quais foram os principais marcos assinalados no mercado nacional?

Domingos Esteves – Foram 30 anos muito intensos. O CascaiShopping foi o segundo grande centro comercial a abrir em Portugal e foi nessa mesma época que começou o desenvolvimento do retalho como hoje o conhecemos. A C&A foi uma das primeiras marcas internacionais de não alimentar a entrar no mercado português e o grande marco é esse mesmo. É o facto de, hoje em dia, ser uma referência no retalho de moda em Portugal. Foi das primeiras marcas a apostar no conceito familiar e na democratização da moda. Hoje, é reconhecida, por muitos consumidores, pela primeira roupa que compraram. Muitos nos dizem: “o meu primeiro fato foi comprado na C&A”. Foram 30 anos de grande aprendizagem, a crescer e a conhecer o consumidor português. 

 

GC – O que trouxe, então, a C&A para o mercado português?

DE – Trouxe, precisamente, a democratização da moda de qualidade. Trouxe surpresa, oferta e preços acessíveis. Na altura, era das únicas marcas a oferecer, num espaço comum, uma roupa acessível para toda a família. Os clientes passavam horas na nossa loja a desfrutar da oferta.

A C&A também trouxe a inovação nas promoções, sem perder o registo de qualidade. Na altura, tínhamos um catálogo com algumas ofertas que fazíamos todos os meses. Nesses dias, a fila de caixa saída da loja. Essa atividade não existia no sector não alimentar. 

Trouxe também sustentabilidade. Desde sempre, a roupa de bebé é certificada, garantia da qualidade da produção e dos materiais utilizados. Trouxe preocupação com o ambiente. Na altura, a C&A já reciclava e recolhia a roupa usada e até oferecia os cabides, no sentido de desincentivar à compra de plástico adicional. E trouxe projetos sociais.

A C&A foi sempre uma marca que tentou marcar a diferença e que foi evoluindo ao encontro do que os clientes procuravam. Há 30 anos, chamávamos à nossa fórmula de vendas de autosserviço assistido. Basicamente, expúnhamos o produto no espaço comercial e o cliente tinha a liberdade de escolher, de provar e de comprar. Só atuávamos, ao nível do atendimento, quando realmente nos era solicitado. Completamente diferente do que, na época, faziam as boutiques de moda. Hoje, o atendimento já é mais personalizado. Por isso, a C&A trouxe também uma escola de vendas. Com a chegada de mais marcas internacionais, estas iam em busca dos nossos profissionais para formar as suas próprias equipas. 

 

GC – Os princípios que norteavam, então, a operação mantêm-se ao dia de hoje?

DE – Os valores de base mantêm-se. O léxico é diferente, há terminologias que são hoje usadas de uma outra maneira e a que damos um significado distinto – diversidade, inclusão, modernidade, inovação -, mas a base continua a ser oferecer a melhor relação qualidade/preço. Há 30 anos, chamávamo-nos do grande “value retailer” da moda em Portugal, porque oferecíamos uma qualidade muito boa para o melhor preço. Este princípio, ainda hoje, norteia a nossa operação. Hoje, introduzo como valor a palavra sustentabilidade, mas já a tínhamos antes, apenas não lhe dávamos essa terminologia. Sempre afirmámos que, para comprar melhor, não é preciso pagar mais. 

 

GC – Somos um mercado diferente dos outros? Em Portugal, quem é o cliente C&A e o que mais valoriza ele na vossa proposta de valor?

DE – Se dessemos um rosto e um corpo ao cliente português, não seriam muito diferentes do europeu. Seria uma mulher, com mais de 35 anos, que procura roupa cómoda tanto para trabalhar como para a sua vida social, que se preocupa em vestir-se e em sentir-se bem e que se sente cada vez mais responsável por comprar a empresas que cuidam do ambiente. 

Mas há algumas especificidades. Por exemplo, o cliente português procura, de uma maneira ainda mais forte, roupa de criança, desde o recém-nascido até aos 12 anos. Valoriza muito a C&A pela qualidade dos seus produtos e pela segurança dos elementos utilizados na produção. 

O cliente masculino também faz parte da nossa definição de cliente e procura muito comodidade. Quando encontra um ponto de venda em que confia que os seus tamanhos vão estar disponíveis, fideliza-se. 

 

Loja C&A Colombo ©Sara Matos
Loja C&A Colombo ©Sara Matos

 

GC – Ao falar dos marcos dos últimos 30 anos em Portugal, temos de mencionar inexoravelmente a pandemia. Sendo a C&A uma multinacional com presença em distintos mercados, como é que a pandemia foi vivida pela empresa? Houve mercados onde o impacto foi mais forte? Foi esse o caso do mercado português? 

DE – O mercado português foi claramente dos mais afetados pela pandemia, porque os períodos das restrições foram mais longos. Se dividirmos em grandes momentos, o período de março a junho de 2020 foi o primeiro de fecho das lojas, mas muitos países da Europa começaram a reabrir em abril ou no início de maio. Já no segundo período, de janeiro a março de 2021, tirando a Alemanha, que também tinha restrições rígidas, Portugal e Espanha foram os mercados mais afetados.

Claramente, o mercado português sofreu mais pela crise sanitária e pelas decisões políticas que foram tomadas, a que não podíamos fugir, mas que tiveram grandes implicações a nível laboral, dos stocks e dos produtos. Tivemos de gerir a mercadoria de uma maneira muito flexível e aí contámos com as diferenças entre Portugal e Espanha, movendo a mercadoria de um lado para o outro. Sem vender o produto, não há maneira possível de subsistir. 

Depois disso tudo, os impactos gerados, e aí já são mais genéricos, a nível europeu, devem-se a dinâmicas como o teletrabalho. Se as pessoas estão em casa adaptam a forma como se vestem e cuidam, o que tem reflexos diretos no que compram. Houve uma forte procura de peças mais confortáveis e casuais, o que teve repercussões também a nível da gestão de produto. Foram momentos de muita aprendizagem, de muita rapidez na execução e de procura de canais novos para venda, como, por exemplo, o WhatsApp.

 

“Claramente, o mercado português sofreu mais pela crise sanitária e pelas decisões políticas que foram tomadas, a que não podíamos fugir, mas que tiveram grandes implicações a nível laboral, dos stocks e dos produtos. Tivemos de gerir a mercadoria de uma maneira muito flexível e aí contámos com as diferenças entre Portugal e Espanha, movendo a mercadoria de um lado para o outro. Sem vender o produto, não há maneira possível de subsistir”

GC – Com a pandemia, houve um foco do retalho em tudo o que tem a ver com a digitalização e o sector da moda não foi exceção. De que modo a C&A navegou também a “onda” da digitalização?

DE – O que a pandemia veio fazer, no caso do digital da C&A, foi acelerar uma estratégia que já lá estava, já existia. A questão é que o digital coloca-nos numa situação em que é o consumidor que está à frente das marcas. A maneira como usa os canais digitais e as plataformas de que dispõe é muito mais avançada do que a das próprias empresas, uma vez que isso implica uma necessidade de transformação e de investimento, de recursos, também humanos, que levam o seu tempo. 

A pandemia obrigou-nos a encurtar caminho e ir ao encontro das novas necessidades dos clientes. Na C&A, estamos a fazer muito, mas ainda não é o suficiente. Cada vez mais, apostamos em aportar aos nossos diferentes canais uma boa experiência de compra e de utilização e que estes proporcionem vantagens compatíveis a que o crescimento passe também pelos mesmos. A verdade é que, através do online, adquirirmos muitos novos clientes que antes não consumiam a nossa marca. A loja online é a verdadeira “flagship”, porque permite oferecer tudo, as 24 horas do dia, a todos os consumidores. Hoje, quando tenho de definir quais as categorias em que apostar numa loja física, sofro menos com essa decisão, porque o cliente pode ir à loja online e encontrar o produto que deseja. Isso, realmente, dá outra confiança até em abraçar diferentes conceitos de loja. 

GC – Antigamente, comprar roupa era dar uma voltinha no centro comercial, mas, hoje, a jornada de compra é completamente diferente. Neste cenário, o que acontece à loja física, qual o seu papel? Numa altura em que se retoma já uma certa normalidade, considera que se reforçou o valor da loja física ou pelo contrário? E qual o papel do colaborador, das pessoas?

DE – À parte a minha responsabilidade profissional e comercial, sou um entusiasta das lojas físicas. Volto à questão do léxico: há novas palavras a surgir. Vivemos numa era de conceitos híbridos de físico e online, que vão ser compatíveis e permitir que os clientes descubram e que possam servir-se do modo que lhes for mais conveniente. Essa é, para mim, outra palavra-chave: conveniência. O tema do online não é tanto a rapidez. É a conveniência. É o facto de poder, 24 horas por dia, comprar e escolher um conjunto de produtos mais amplo. A conveniência saiu reforçada. 

As lojas físicas vão manter-se, logicamente, distintas. No entanto, basta remontar ao início da operação da C&A em Portugal, há 30 anos, para ver que, também então, eram diferentes do que são hoje. Portanto, a sua evolução e adaptação é normal e algo muito natural. 

Crescer no online não significa a morte das lojas físicas, nem nada do que se pareça. Até muito pelo contrário. A moda implica talvez uma das experiências de compra mais físicas, mesmo quando adquirimos o produto online. E, um ponto muito importante, o cliente tende a comprar online em insígnias onde encontra, precisamente nas lojas físicas, os atributos do serviço e da credibilidade. A confiança. A noção de fidelização está a alterar-se muito. Hoje em dia, continua a haver fidelização, mas existem novas cartas em jogo. A existência e complementaridade dos diferentes canais é que permite que continue a existir fidelização e que esta se solidifique.

 

“Crescer no online não significa a morte das lojas físicas, nem nada do que se pareça. Até muito pelo contrário. A moda implica talvez uma das experiências de compra mais físicas, mesmo quando adquirimos o produto online. E, um ponto muito importante, o cliente tende a comprar online em insígnias onde encontra, precisamente nas lojas físicas, os atributos do serviço e da credibilidade”

 

GC – Até onde chegará o online, particularmente no sector da moda? Portugal está distante de atingir o teto a este respeito?

DE – Portugal está ainda com percentagens de compra de moda online muito inferiores às de outros países europeus, já para nem falar da América ou da Ásia. O crescimento é significativo, mas ainda estamos muito longe do que são as médias de outros mercados mais maduros. Claramente, o online irá continuar a crescer em Portugal e a crescer bastante. Se olharmos para o ranking das vendas online, não encontramos marcas de moda no top 10. Ainda estamos longe dos dois dígitos e os mercados mais sérios já chegam quase aos 30%. 

O que não é necessariamente negativo, porque dá-nos mais tempo para ajustar e aprender o que melhor podemos implementar em Portugal. Não nos podemos esquecer que o online dá-nos um enorme campo de crescimento e de possibilidade de consolidação das empresas e das marcas. 

 

GC – Outro fator que recuperou a proeminência com a crise foi o preço, mas se há algo que a pandemia veio evidenciar é a necessidade de rentabilidade nos negócios. Como se equilibram estes dois vetores?

DE – Esse equilíbrio tem forçosamente que existir. Até porque um dos erros que a indústria têxtil cometeu, nos últimos anos, foi entrar numa concorrência desmedida pelo preço, pondo em causa o valor dos produtos vendidos e reduzindo, de uma maneira drástica, as margens. Isso fragilizou-nos muito. Com os produtos a serem adquiridos em todo o mundo e os pagamentos a serem feitos em várias divisas, quando as margens são muito reduzidas, ficamos muito fragilizados e há uma deterioração do consumo. Com a descida do preço, mesmo que se mantenha a cesta, o gasto médio baixa bastante. Foi um grande erro convencer-nos de que o cliente só queria preço. 

Agora, o equilíbrio passará não por uma subida de preço, mas pelo incremento do valor e pela comunicação desse mesmo valor. Se o cliente souber que está a comprar bem, aceita pagar aquilo que é o preço justo. 

Estamos, atualmente, numa situação complicada com todas as tensões existentes na cadeia de abastecimento. O que sublinha, ainda mais, a necessidade das empresas serem responsáveis. Isso significa que não queremos que o cliente tenha de pagar mais pelos produtos, mas não esquecemos o que é o preço justo. Temos de passar além da discussão do low cost. Do ponto de vista da gestão de uma marca, implica também uma nova abordagem à gestão de stocks. Já não se compra tanta quantidade, que possa gerar uma deterioração do produto, pela necessidade de levar a cabo tantas promoções, de modo a poder escoá-lo. Todo este equilíbrio vai permitir que a razão valor/preço tenha o sentido correto. 

 

GC – O consumidor nacional continua ainda muito focado no fator preço e no gatilho das promoções? É possível fugir a isto?

DE – Não podemos falar de promoções quando nos referimos ao ano de 2020. A C&A tinha três milhões de peças paradas, que eram da temporada anterior. Se esse dinheiro não fosse feito, não podia comprar novas coleções. Vamos ser claros: se o capital não entra, também não pode sair. Então, não chamamos a 2020 um ano de promoções. Foram ações de gestão que diferentes marcas fizeram de distintas formas.

Em 2019, a C&A tinha já tentado limitar ao máximo o número de campanhas comerciais. No nosso entender, está relacionado com uma gestão correta das coleções. Este ano, adotou-se a mesma política e foram feitas muito poucas ações. Aliás, os saldos de verão foram iniciados mais tarde, quase em agosto. Na C&A, estamos, realmente, a tentar que os clientes encontrem nos nossos espaços comerciais o preço correto do produto que oferecemos. Se o cliente tem essa confiança, não espera pelas promoções para comprar.

Claro que as promoções continuarão a existir na C&A, mas aquelas que são realmente necessárias e nos momentos adequados. Se forem bem direcionadas, as promoções permitem atrair novos clientes para a marca. Mas se houver um uso massivo da promoção, então, é contraproducente. O primeiro objetivo da C&A é que o cliente sinta que fez um bom negócio quando paga o preço original do produto. Se conseguir isso, já não há uma tão grande dependência da promoção. 

 

“Se forem bem direcionadas, as promoções permitem atrair novos clientes para a marca. Mas se houver um uso massivo da promoção, então, é contraproducente. O primeiro objetivo da C&A é que o cliente sinta que fez um bom negócio quando paga o preço original do produto. Se conseguir isso, já não há uma tão grande dependência da promoção”

 

GC – Perante este cenário, onde fica a fidelização? Ainda existem clientes fiéis? Os portugueses são clientes fiéis?

DE – O consumidor português é muito agradecido e, nesse sentido, muito fiel. Se for bem tratado, regressa. 

A fidelização tem também uma relação com o produto oferecido e com a consistência do mesmo. Assim como com o serviço. São vários os fenómenos que vão criando fidelização e isso é algo que não mudou.

Porém, hoje, as nossas vidas são mais agitadas, temos a sensação de que o tempo nos falta, temos menos paciência. Portanto, há marcas que têm uma oportunidade de criar fidelização pela experiência que permitem, pela relação que estabelecem e pela oferta de conveniência que vai gerar novos tipos de fidelização. 

 

Loja C&A Colombo ©Sara Matos
Loja C&A Colombo ©Sara Matos

 

GC – A consciência ambiental tornou-se também “moda” e não é para menos. São precisos cerca de 7.500 litros de água para fazer jeans, o equivalente à quantidade que uma pessoa média bebe em sete anos. Mas a indústria da moda tem feito um grande esforço, nos últimos anos, para procurar formas de produzir e de vender mais sustentáveis e, no caso da C&A, é firme o seu compromisso com a sustentabilidade. Na atual conjuntura, pensa que esta tendência vai abrandar ou, pelo contrário, poderá ser um acelerador de mudança?

DE – Para mim, a conjuntura é claramente um acelerador da consciencialização ambiental. Após este ano e meio, o consumidor está muito mais atento. Por isso, e como já referi, um dos nossos objetivos é ajudar os clientes a tomar a decisão de compra: “vou comprar esta marca não só porque encontro o produto que quero, mas também porque sei que foi produzido em respeito do ambiente e que a marca protege o planeta”. 

Neste momento, estamos a sofrer fenómenos naturais com grande impacto. Vejamos o que se está a passar, desde o verão, com inundações por toda a Europa e incêndios por toda a parte. O planeta está doente e a sofrer, por nossa responsabilidade, de todos nós. A indústria têxtil tem clara responsabilidade nessa área e, nesse sentido, pelo menos na C&A, estamos a fazer tudo o que é possível para sermos uma indústria menos poluidora, para que os produtos que vendemos nas nossas lojas sejam de matérias recicladas e recicláveis. Hoje em dia, cerca de 70% da nossa coleção é sustentável.

Um dos grandes valores positivos do que sofremos é esta maior consciência do que realmente é importante e do que temos de fazer para proteger o ambiente. E o consumidor tem aqui também uma responsabilidade, através das suas decisões de compra. 

Mas ainda temos muito que aprender. Li recentemente um artigo onde se fala da produção de peças de roupa a partir de garrafas de plástico. Não obstante esse plástico não deixará de ser microplástico. Nem tudo o que parece é e há que evoluir constantemente.

 

“O que todos os acontecimentos mais recentes vieram confirmar é que se pode vender mais em quantidade, mais em valor, mais em rentabilidade com menos stock. O segredo está na forma como se constrói o negócio, para que seja sustentável, não só do ponto de vista ambiental, mas também financeiro. Porque, no final de contas, é isso que permite manter postos de trabalho e investir”

 

GC – É esta a missão da C&A? Da mesma maneira que a marca, fundada em 1841 pelos irmãos Clemens e August Brenninkmeijer, reinventou o sector, no século XIX, ao oferecer moda confecionada numa grande variedade de tamanhos, e que, no século XX, tornou mais fácil o acesso à roupa prêt-à-porter, quer, agora, no século XXI, democratizar a moda sustentável?

DE – Fomos a primeira marca no mundo da moda a vender pronto-a-vestir. Há 180 anos, foi algo muito inovador. Fomos também a primeira marca a vender a minissaia ou fatos de banho. São tantos os episódios bonitos da nossa história que mostram como a C&A sempre foi uma marca inovadora. Hoje, juntamos à palavra democratização não só a moda, mas a moda sustentável. É essa a nossa missão. 

 

GC – Esta estratégia é compatível com um negócio de volume? 

DE – Tem que ser. Tem que existir uma correção do volume pelo valor. Por exemplo, será que, após toda esta dinâmica do teletrabalho, os homens vão deixar de usar fato e gravata? Não vão. Mas vão ter menos necessidade de os usar, daí, não precisarem de tantos, mas sim de melhores fatos. Vai haver espaço para as empresas que vendem volume procurarem o equilíbrio, tomando decisões racionais.

Esta foi uma das grandes confirmações da pandemia. Recordo-me que, quando comecei como responsável de loja, há quase 30 anos, uma das coisas que me ensinaram foi que tinha que ter 20% mais de stock para o caso de virem muitos clientes à loja. Andámos muitos anos em que não falávamos do Canal do Suez, nem dos contentores, porque havia outros aspetos e fomos ensinados a gerir stock em demasia. Mas o que todos os acontecimentos mais recentes vieram confirmar é que se pode vender mais em quantidade, mais em valor, mais em rentabilidade com menos stock. O segredo está na forma como se constrói o negócio, para que seja sustentável, não só do ponto de vista ambiental, mas também financeiro. Porque, no final de contas, é isso que permite manter postos de trabalho e investir.

 

GC – Na sua opinião, que elementos serão fundamentais no retalho da moda num futuro próximo?

DE – Há muitos elementos. Agora, fala-se muito em algoritmos e esses são importantes. Estamos inundados de dados que temos de aprender a ler, porque nos vão permitir conhecer, ainda melhor, o cliente, as suas necessidades, o que procura. Quando soubermos tratar todos esses dados, haverá uma evolução na relação entre as marcas e os clientes.

Mas o que vai ser fundamental, neste mundo dinâmico e de crescimento digital, é a capacidade que as marcas tenham de criar uma conexão com os clientes e inspirá-los. Se não se conseguir gerar essa inspiração, dificilmente se constrói uma relação. Sem esta, as marcas não subsistem. 

Temos também de ter muito presente o sentido de conveniência. Não são os consumidores que vêm às marcas, são as marcas que têm de ir ao encontro do consumidor. Antes, abríamos uma loja e os clientes vinham. Esse paradigma mudou. As marcas têm de ir para onde estão os consumidores e da maneira e no momento em que estes querem ser servidos.

João Amaral, Co-Managing Director AM Experience Group

O Natal é emoção

“É certo que somos uma multinacional, mas somos Lidl Portugal”