“Faz parte da nossa estratégia, e é um eixo fundamental da nossa atuação, apoiar a produção nacional”

Bruno Pereira, administrador de Compras Lidl Portugal
Admistrador de contas Lidl

Pelo menos desde 2014 que é conhecido e reconhecido o empenho do Lidl em levar mais longe o que de melhor se produz no país, conquistando pela qualidade consumidores cada vez mais informados e exigentes de todos os lugares da Europa. E fá-lo em conjunto com os fornecedores. Só em 2021, as exportações do Lidl Portugal representaram 2% do total das exportações nacionais de produtos alimentares para a União Europeia. Por cada euro gasto em produtos destinados à exportação, foram gerados 1,87 euros na economia portuguesa. Para Bruno Pereira, administrador de compras do Lidl Portugal, estes são números que geram bastante satisfação, mas que não deixam de representar um grande desafio para o futuro. A grande ambição é, “fazendo mais e melhor a cada dia”, continuar a ter um papel bastante relevante na dinamização das exportações portuguesas, contribuindo para um maior equilíbrio da balança comercial e para o desenvolvimento da competitividade da economia nacional e do emprego, designadamente junto das PME.

 

Grande Consumo – Apesar da pandemia e da guerra, o Lidl Portugal conseguiu subir as vendas ao exterior e continuar a apoiar a internacionalização dos produtores nacionais. Quanto representaram, no total das mercadorias agroalimentares exportadas pelo país para a União Europeia, as exportações potenciadas pelo Lidl?

Bruno Pereira Faz parte da nossa estratégia, e é um eixo fundamental da nossa atuação, apoiar a produção nacional, nomeadamente, neste aspeto particular da exportação para os mercados onde estamos presentes, que são 32. Estamos presentes nos Estados Unidos da América e somos líderes de mercado no conjunto da Europa.

No que diz respeito ao valor das exportações que os fornecedores do Lidl Portugal fizeram para países onde estamos presentes, estas representaram mais de 2% do total de exportações alimentares de Portugal para a União Europeia, o que representa um valor de 219 milhões de euros de impacto direto e indireto na economia portuguesa e, realmente, nos enche de muito orgulho.

 

GC – O estudo que apresentaram na Feira da Agricultura, realizada recentemente em Santarém, estima que, por cada euro gasto em produtos destinados à exportação, foram gerados 1,87 euros na economia portuguesa. Como chegaram a este número?

BPEm primeiro lugar, o valor foi calculado através de uma consultora externa e independente. Não é algo que seja feito internamente pelas nossas equipas, até de forma a garantirmos uma maior transparência e também comparabilidade para anos futuros. Em termos específicos, a metodologia assenta num modelo econométrico, totalmente auditado, considerando também dados disponíveis através do Instituto Nacional de Estatística (INE), o que lhe permite ser também facilmente auditável por uma terceira entidade, se assim for necessário.

Para nós, é muito importante manter a confiança nos valores, mas também a estabilidade em termos de crescimento dos mesmos, pelo que, este ano, optámos, então, por trabalhar com uma consultora externa e fazer a soma de todos os efeitos diretos e indiretos na exportação. E concluiu-se que, por exemplo, um euro de Pera Rocha tem um efeito superior a esse mesmo euro no total da economia nacional.

Quero também aproveitar para esclarecer que estes valores das exportações não estão relacionados com as vendas do Lidl Portugal. Atuamos como facilitador junto dos nossos colegas e existem contratos e relações diretos dos nossos produtores nacionais com os colegas nos restantes países. Não temos nenhuma vantagem direta, em termos das nossas vendas e dos nossos resultados, com este apoio.

Mesmo assim, estamos fortemente envolvidos, conscientes do imenso benefício que todos nós, portugueses, iremos colher em termos da nossa economia e do nosso país e é com muita satisfação que assumimos a responsabilidade de levar o melhor que fazemos em Portugal a todos os nossos clientes nas nossas, agora, mais de 12 mil lojas, já que acabámos de celebrar este marco com a mais recente abertura na Polónia. Temos um mercado com um potencial muito grande para os produtores e os produtos nacionais.

 

Bruno Pereira, administrador de Compras Lidl Portugal

 

GC – É, também, uma forma de responsabilidade social?

BPObviamente que sim. Temos a responsabilidade de atuar nos mercados onde estamos e de apoiar a produção nacional. Temos também estado muito focados em estabelecer relações sustentáveis, a todos os níveis, com os nossos produtores, quer ajudando-os a dar um salto qualitativo, especificamente, através da adoção de certificações, como a Global G.A.P., quer em termos de outra engenharia de produto, reformulação de teores de gordura e de sal, adaptação das embalagens aos mercados, legislação, apenas para dar alguns exemplos. Vejamos o caso da laranja. Em Portugal, estamos muito habituados a frutas e legumes a granel. Em mercados da Europa Central, o granel ainda não é tão bem valorizado, é associado a produto de menor valor acrescentado. Fizemos um trabalho com os nossos produtores de citrinos do Algarve para uma embalagem específica para o mercado alemão, que realmente permitiu a sua entrada com sucesso. Sentimos, de facto, uma grande responsabilidade com os nossos parceiros e temos total empenho que essa responsabilidade seja muito duradoura.

 

GC – É possível fazer criação de valor em cima destes 1,87 euros? Quais são as expectativas para o próximo ano fiscal?

BP – Acreditamos que existem sempre oportunidades para continuar a crescer em cima deste valor. Depende da evolução do atual contexto europeu e económico, mas também acredito que nosso modelo de negócio é de preço/qualidade, o chamado “value for money”, e que os clientes terão ainda maior aceitação nos próximos anos e num contexto de algumas dificuldades económicas.

Não estabelecemos um objetivo concreto. Como em tudo, todos os dias, trabalhamos para ser melhores e para apoiar ainda mais a produção nacional. Portanto, ficarei muito satisfeito se conseguirmos aumentar este valor de forma sustentada.

 

“Estes valores das exportações não estão relacionados com as vendas do Lidl Portugal. Atuamos como facilitador junto dos nossos colegas e existem contratos e relações diretos dos nossos produtores nacionais com os colegas nos restantes países. Não temos nenhuma vantagem direta, em termos das nossas vendas e dos nossos resultados, com este apoio”

 

GC – De que modo este contributo tem vindo a evoluir, ao longo dos últimos anos? Está dentro das vossas expectativas ou foram, de algum modo, surpreendidos com a recetividade dos outros países-Lidl à produção nacional?

BPUtilizando a metodologia já mencionada, fizemos uma comparação com 2020 e concluímos que subimos de 1,2% para 2% do total de exportações nacionais, o que é um crescimento relativo muito impressionante. E nos 219 milhões euros de impacto direto e indireto também contabilizamos um crescimento superior a 20%.

Em 2014, começou a parceria com a Portugal Fresh. Nos dois anos seguintes, começámos a tentar apoiar mais outras áreas que não apenas as frutas e legumes. Olhando em retrospetiva, é um crescimento bastante surpreendente e um valor que muito nos orgulha, mas também ver o salto qualitativo que a indústria agroalimentar, em Portugal, deu nos últimos anos e que ainda está em processo de atingir novos níveis de excelência.

Por outro lado, as 12 mil lojas que temos, ou seja, o potencial que temos no mercado interno Lidl, deixa-me muito confiante de que conseguiremos continuar a surpreender-nos, a cada ano que passa.

 

GC – O Lidl está presente em 32 países. O grande desafio é atingir a totalidade dos países-Lidl?

BPDo total de 32 países, em 2021, os produtores nacionais exportaram para 29, portanto, é quase a totalidade. Mas, mais do que estar fixo em objetivos do número de países, importa-nos realmente que exista um crescimento sustentável, quer do volume, quer da importância que temos nas exportações nacionais. E que esse mesmo seja assente na relação qualidade/preço. Por exemplo, em termos de frutas e legumes, já exportamos para 10 países, entre os quais mercados muito relevantes, como Alemanha, França, Espanha, Polónia e Reino Unido, a produção de 414 produtores. Sabemos que ainda existe potencial para crescer mais, de uma forma sustentável. Não queremos negócios casuísticos, queremos relações duradouras, como é o caso da parceria com a Portugal Fresh, desde 2014. Começámos com a Pera Rocha e acreditamos que esta expansão pode ser replicada por outros produtos, como, por exemplo, os citrinos do Algarve, que também estão com um crescimento muito significativo.

Não queremos competir com outros países apenas pelo preço. Devemos estar sempre atentos à relação preço/qualidade, porque uma laranja do Algarve nunca será mais barata que uma laranja espanhola. Ou uma Pera Rocha muito dificilmente será mais barata que uma pera, por exemplo, de Itália ou da Holanda. No entanto, a relação preço/qualidade, as características organoléticas e o nosso terroir permitem-nos ter produtos únicos.

 

“Do total de 32 países, em 2021, os produtores nacionais exportaram para 29, portanto, é quase a totalidade. Mas, mais do que estar fixo em objetivos do número de países, importa-nos realmente que exista um crescimento sustentável, quer do volume, quer da importância que temos nas exportações nacionais. E que esse mesmo seja assente na relação qualidade/preço”

 

GC – Quais são as categorias de produto que apresentam maior potencial futuro?

BPO vinho é uma delas. Em 2021, foram mais de cinco milhões de litros, o que representa um aumento de 15% face ao ano anterior. E, claro, as frutas e legumes, que em 2021 atingiram as 22 mil toneladas. Recordo-me que não foi assim há tanto tempo, foi em 2019, quando passámos das 10 mil. Hoje, já passámos a barreira das 20 mil.

Acredito que quer os vinhos, quer as frutas e legumes têm um potencial muito grande. Mas não são as únicas categorias. Por exemplo, no ano passado, exportámos 67 milhões de unidades de produtos de pastelaria e padaria, o que representa um crescimento de 31%. Estamos a exportar muitos pastéis de nata, mas também pão.

Portanto, existem outras áreas de negócio em que a nossa indústria agroalimentar, bem organizada, focada em qualidade e indo ao encontro do que os mercados necessitam, também consegue claramente triunfar.

 

GC – Estes números demonstram que, mesmo em tempos de crise, também há oportunidades?

BPComo já tive a oportunidade de referir, em primeiro lugar, estamos sempre focados em fazer mais e melhor. Em tempos de crise, há um maior foco dos clientes na relação preço/qualidade e, na minha opinião, o nosso modelo de negócio encaixa totalmente com essa preocupação crescente, mas também com um tema cada vez mais valorizado, que é a simplicidade de compra, a experiência de compra dentro da loja que, acredito, também conseguimos ter uma proposta quase única em termos de mercado europeu.

No que concerne, especificamente, as exportações, nas chamadas frutas de caroço, como o pêssego, a ameixa e o alperce, atingimos já valores bastante significativos e quase duas mil toneladas foram exportadas, em 2021. Começámos também a exportação da nectarina, o que mostra que estamos a aumentar o portfólio, em termos de produtos exportados, e que continuam a existir estas oportunidades, mesmo em tempo de crise.

 

GC – Tendo em conta as limitações do mercado interno, pela sua dimensão e poder de compra, a internacionalização é, para muitas empresas, o único caminho que permite crescer?

BPExistem muitas oportunidades de crescimento interno também. Diria que, quando se trabalha com qualidade, quer em termos internos, quer externos, as oportunidades existem.

Agora, estes nossos parceiros que trabalham numa lógica de exportação demonstram um maior potencial quer da capacidade produtiva, quer da capacidade de resposta às necessidades e de adaptação a essas mesmas necessidades. É muito importante ter esta capacidade produtiva, mas também estar disponível para iniciar este caminho de exportação, que é exigente, porque são mercados diferentes, regulamentações distintas e escalas de outra ordem de grandeza. Mas, sim, a exportação é muito importante para que os nossos parceiros consigam ter uma outra dimensão e capacidade de captar valor.

 

GC – Uma das maiores dificuldades dos produtores nacionais prende-se com a escala e capacidade de diversificar mercados, essencialmente pela pequena dimensão das empresas e pela falta de organização sectorial. De que modo o Lidl tem ajudado a inverter este ciclo?

BPTemos procurado ajudar a inverter este ciclo também a nível nacional, para além de todo o apoio que temos dado nas exportações. No final do verão de 2020, lançámos a iniciativa Da Minha Terra, com o objetivo de apoiar micro produtores regionais que enfrentavam graves dificuldades devido aos impactos da pandemia. Queríamos dar-lhes a oportunidade de estarem presentes nas nossas lojas, através de produtos que são de uma qualidade extraordinária. Tivemos contacto com cerca de 180 fornecedores, dos quais, 35 deram entrada de produtos nas nossas lojas. Gostaria de destacar, por exemplo, a Casa Paixão, em Serpa, que estava à beira de fechar portas, porque tinha perdido todos os seus mercados, e que, neste momento, irá mudar para instalações maiores para que possa dar resposta ao grande crescimento que, entretanto, teve. Estes fornecedores continuaram, assim, ativos e a alimentar a economia local, muitas vezes no interior do país, onde as dificuldades são maiores.

Mas queria também aproveitar para falar de um tema que é muito relevante, em relação à escala dos produtores, e que em Portugal não é muito relevado, que são as associações de produtores. A parceria com a Portugal Fresh é um exemplo extraordinário, assim como a parceria com produtores de citrinos do Algarve. Há muitos micro produtores que, se se associarem e se organizarem, passam a ter acesso às chamadas economias de escala. Seria importante que mais sectores de atividade e mais produtores pensassem nesta lógica.

 

“O que discutimos, até à exaustão, é sempre a qualidade. Tem que ter qualidade, é ponto fundamental. Internamente, estamos sempre a falar de qualidade: qualidade intrínseca do produto, na entrega do produto, sustentável ao longo do tempo”

 

GC – Das empresas que exportam “à boleia” do Lidl, qual é maioritariamente a sua tipologia? São empresas de que dimensão?

BP Mais de 80% são de pequena e média dimensão, o que espelha bem como é o tecido empresarial nacional, que necessitam muito do apoio de empresas como o Lidl. Como referencial, por exemplo, podemos dizer que, em 2020, o Lidl tinha uma importância relativa de 12%. Entretanto, conseguiu uma evolução de mais de três pontos percentuais em cima daquela relevância para essas empresas.

As micro e pequenas empresas são muito importantes, são o “core” do nosso negócio exportador e da nossa economia nacional e têm que ser apoiadas, de uma forma concreta e que permita alavancar o seu volume de negócios.

 

GC – Pode-se considerar que, a par do impacto económico, a capacidade de exportar através do Lidl contribui também para a criação de emprego?

BPNeste estudo realizado por uma consultora externa independente, apurámos que todo este volume de exportação representa, de uma forma direta ou indireta, mais de 4.500 postos de trabalho, tendo uma evolução de mais 100 postos de trabalho em relação ao ano anterior 40% destes parceiros confirma que este negócio de exportação fez com que aumentasse o volume de emprego. Também é muito relevante para a economia nacional.

A exportação é importante, tal como é importante o apoio às PMEs, especialmente quando vemos que 24% dos empregos está afeto a atividades de exportação.

 

Bruno Pereira, administrador de Compras Lidl Portugal

GC – De que modo são selecionados os produtos e os fornecedores envolvidos neste processo?

BPGostamos muito de ter planos e, sobretudo, de segui-los. Por exemplo, ao longo dos anos, tornámo-nos muito relevantes para os citrinos do Algarve. Há já algum tempo, tomámos a decisão estratégica de, sempre que existir disponibilidade de citrinos do Algarve, não vendemos citrinos de importação. Apenas importamos citrinos em alguma época do ano em que não exista citrinos do Algarve e, felizmente, o nosso terroir permite que a grande maioria do ano tenhamos, por exemplo, a laranja ou os limões do Algarve disponíveis nas nossas lojas. Portanto, começámos por estabilizar a relação com os fornecedores, nomeadamente, uma associação de produtores, através do mercado interno. Eles aprenderam o que é trabalhar com o Lidl, temos especificações internas ainda mais restritivas do que é imposto legalmente quer no mercado português, quer no mercado europeu. Começámos a avaliar o produto, a dar “insights”, a fazer melhorias no layout dos armazéns, das unidades de embalamento da própria fruta, da paletização, aspetos que não são tão “sexies”, mas que, realmente, são muito importantes para a eficiência, quer nossa, quer dos produtores, de modo a entregarmos mais valor ao cliente final. O trabalho dos citrinos do Algarve demorou três a quatro anos, mas, depois, a partir do momento em que os produtores estavam prontos, passaram apenas quatro meses para este produto começar a estar disponível na Alemanha.

O que discutimos, até à exaustão, é sempre a qualidade. Tem que ter qualidade, é ponto fundamental. Internamente, estamos sempre a falar de qualidade: qualidade intrínseca do produto, na entrega do produto, sustentável ao longo do tempo. Claro que, a seguir, vêm as exigências de certificações com que trabalhamos e a capacidade de produção, mas, acima de tudo, é a qualidade intrínseca do produto nas diferentes dimensões.

 

GC – É já possível fazer um primeiro balanço de como estão a decorrer as exportações, em 2022?

BPAinda é bastante cedo para estarmos a fazer alguma previsão. Existem aqui vários fatores com que não estávamos a contar, nomeadamente a inflação, e tudo isso tem que ser considerado, assim como o conflito na Europa de Leste. Mas acreditamos que, através desta qualidade sustentável dos nossos produtos, iremos trilhar o caminho do crescimento.

 

GC – Mas pensa que será possível superar os números de 2021?

BPO nosso objetivo, todos os dias, é, como já referi, fazer mais e melhor do que no dia anterior e, todos os anos, crescer também nesta dimensão das exportações. A nossa ambição é a de continuar a crescer, mas sempre considerando que existem alguns fatores bastante relevantes, dos quais destaco apenas o tema inflação e o dos conflitos que podem mudar o panorama nos mercados da Europa Central.

 

GC – Qual é a grande ambição do Lidl Portugal, no que às exportações de produtos nacionais diz respeito?

BPA médio e longo prazo, ambicionamos realmente que estes números da exportação sejam sustentáveis e trabalhar numa lógica sustentada na qualidade intrínseca do saber português e dos nossos produtos nacionais. Assim como, sempre que possível, conquistar novos mercados para novos segmentos de produto. É essa a nossa principal ambição: fazer mais com mais qualidade.

 

Oiça o podcast desta entrevista aqui:

Ricardo Torres Assunção, diretor de marketing e comunicação da DIA Portugal

“As marcas de distribuição têm de se comportar como se fossem marcas de fabricante”

Maria Cândida Marramaque, diretora geral da ANIL

“O consumidor português quer produto português”