“Cabo Verde, ou outros países dos PALOP, não estavam na nossa rota inicial”

Juan Ramón Gallego Foto Sara Matos

Com um investimento anunciado de 3,5 milhões de euros para aberturas e remodelações de lojas, a Coviran anuncia a entrada no continente africano através da inauguração da primeira loja em Cabo Verde, mais concretamente na ilha do Sal. Ser uma referência de consumo para o “shopper” local e para o turista, mas também um parceiro de confiança para a hotelaria do país, é o objetivo da cooperativa granadina, que olha para esta abordagem como uma primeira aproximação a uma nova realidade e que pode levar à entrada em mercados como Angola ou Moçambique. Apesar da prioridade ser consolidar a sua posição a nível ibérico, a competitividade e o atingir de economias de escala não permitem enjeitar a expansão geográfica. Juan Ramón Freiría Gallego, diretor de vendas e expansão, aborda o presente e futuro da Coviran Portugal.

 

Grande Consumo – A Coviran anuncia um investimento de 3,5 milhões de euros, no primeiro semestre de 2019, decorrente da abertura de 16 novos supermercados e a remodelação de 14 lojas. A estes números juntam-se, ainda, 16 remodelações previstas até final do ano e 10 novas aberturas de loja. Pode-se considerar que este é o melhor semestre de sempre para a Coviran em Portugal, em termos de abertura de lojas? E em faturação? A que se deve toda esta dinâmica comercial?

Juan Ramón Gallego – Efetivamente, temos tido muito bons resultados. Ano após ano, o nosso projeto está a crescer e a somar sócios. A cooperativa está a fazer um esforço notável para oferecer aos retalhistas independentes todos os serviços necessários para incrementar a sua competitividade, com um modelo adaptado às necessidades, tanto do sócio, como do cliente local, e este esforço está a dar os seus frutos. Este exercício está a ser muito importante em relação a aberturas, mas também no capítulo de reformas de superfícies comerciais já existentes, que estão a permitir não apenas consolidar o negócio dos nossos sócios, como aumentar a nossa quota de mercado.

A experiência confirma-nos que, no momento em que melhoramos a experiência de compra ao consumidor final, aumentamos o grau de fidelização e isso afeta, diretamente, a rentabilidade do negócio e o aumento de vendas. No primeiro semestre de 2019, crescemos em vendas próximo de 20%, num mercado que não cresce, e isso significa que é à custa de outros operadores e da nossa proposta comercial diferenciadora.

Igualmente neste exercício, estamos a incorporar novos retalhistas independentes na organização. Devemos saber que, na Coviran, somos uma organização anti cíclica e que, quando o mercado “aperta” e aumenta a competitividade, nós crescemos. É nesse momento que o retalhista independente reconhece o grande valor que fornece a cooperativa e as ferramentas à sua disposição para poder competir em igualdade com a grande distribuição.

 

GC – Curiosamente, oito aberturas decorrem dentro de sócios que já detinham lojas. O que representa para a Coviran este facto? Como é vista a dispersão das mesmas aberturas e consequente reforço da cobertura geográfica? É algo positivo para a operação da cooperativa ou a criação de um problema logístico?

JRG – A Coviran caracteriza-se pela sua grande capilaridade e, por outro lado, pela sua capacidade de resposta perante o facto de que os seus sócios estão muito dispersos geograficamente. O que, para outros, pode ser uma debilidade, para nós é um benefício e um traço diferenciador, porque conseguimos, graças a uma rede logística eficiente, proporcionar um serviço de qualidade como poucos operadores podem oferecer. Portanto, é para nós muito positivo levar uma oferta comercial competitiva e de qualidade a territórios onde, em muitas ocasiões, nos convertemos na única insígnia.

O nosso modelo é diferente, os nossos sócios são muito diferentes entre si, estão localizados em territórios muito díspares, no entanto, a cooperativa oferece uma solução de rentabilidade para todos por igual.

Igualmente, devemos realçar que, na Coviran, temos a capacidade de adaptar a nossa oferta de produtos e serviços, tanto ao meio urbano, como ao meio rural, e este é um fator diferenciador da nossa organização. Por outro lado, quero realçar que uma das missões da organização passa por desenvolver a economia local e ajudar a fixar a população, assim como criar riqueza em zonas menos favorecidas, daí o nosso compromisso também com o interior de Portugal ou o comumente chamado Portugal despovoado.

Finalmente, destacar que, efetivamente, confirma-se também, após vários anos de implantação em Portugal, o facto de que existem sócios a abrir segundas e terceiras lojas, o que é um claro expoente da rentabilidade do nosso modelo de negócio.

 

GC – 2019 testemunhou, ainda, a abertura da primeira loja com o conceito Coviran Plus. Quantas lojas preveem abrir até 2020 ao abrigo deste novo conceito?

JRG – No mês de junho, conseguimos alcançar um importante feito na cooperativa, nomeadamente, a abertura da primeira loja Coviran Plus no país, pela mão do sócio Barreto&Filhos, na localidade de Patroves, em Albufeira.

Este novo conceito de loja permite adaptar a oferta ao novo perfil de consumidor, onde se destacam as secções de take away, alimentação saudável e o reforço das secções de frescos. Igualmente, o supermercado avança sob um conceito de sustentabilidade e maior adaptação às necessidades locais através do projeto “ponto de venda responsável”, que contempla ações em matéria de eficiência energética, contratação responsável, luta contra o desperdício alimentar, maior acessibilidade e uma colaboração permanente para dar resposta às necessidades do território onde se localizam estas lojas.

Para 2020, a Coviran tem como objetivo poder dispor de, pelo menos, 12 lojas com o novo conceito Coviran Plus por todo o território nacional, que sirvam como prescritores para os restantes de sócios. Esta progressiva evolução do novo conceito melhorará a rentabilidade do negócio graças a um novo modelo de gestão, que tem uma experiência de 10 anos em Espanha e que procura uma satisfação plena do consumidor final, assim como proporciona novos serviços e uma experiência de compra mais agradável. O modelo deu importantes passos em Portugal e será uma referência para os negócios em Espanha.

Juan Ramón Gallego
Foto Sara Matos

GC – Trata-se de um conceito para atrair novos sócios ou elevar a fasquia do serviço dentro do universo de sócios fidelizados à rede?

JRG – É um modelo com uma rentabilidade média acima dos estabelecimentos convencionais, pelo que estamos seguros de que pode, por um lado, atrair um novo modelo de investimento por parte daqueles que vejam nestas lojas uma boa oportunidade de negócio. Por outro lado, como não pode ser de outra maneira, os atuais sócios da cooperativa apostarão na Coviran Plus para as suas novas aberturas e renovações de lojas. Uma vez demonstrado o crescimento e as melhorias na gestão, ocorrerá, como em Espanha, onde o modelo cresce ano após ano. Além disso, é importante referir que, pela imagem projetada, são lojas que conectam muito bem com um público mais jovem que o do atual comprador, algo muito importante para somar novos clientes.

 

GC – O peso relativo da Coviran no universo do retalho em Portugal deixa-vos satisfeitos? A cooperativa está acima ou abaixo do plano de negócios previsto para Portugal?

JRG – Há que pensar que a nossa trajetória aqui tem mais de oito anos e que, nesse tempo, atingimos um bom grau de desenvolvimento, incrementando o nível de serviço ao sócio e adaptando-nos às necessidades do cliente em cada momento. Nesse tempo, convertemo-nos numa referência dentro dos pequenos empresários e, sobretudo, com um modelo como é o cooperativo, muito mais social e participativo.

Além disso, Portugal estava a passar por sérias dificuldades nos momentos da crise económica. Estamos, portanto, alinhados com os nossos objetivos, sabendo que, no entanto, existe resistência para o nosso modelo.

Obviamente, consideramos que temos o melhor modelo de negócio em termos de rentabilidade para o retalho independente, se nos posicionarmos face a outros modelos de franquia e, portanto, o nosso objetivo é ambicioso e não é outro que ser líder do retalho independente em Portugal.

 

GC – A Coviran chega, ou está mesmo, onde os concorrentes não estão (ou não querem estar)? Logisticamente, como se consegue servir sócios que, por vezes, se encontram tão dispersos e isolados? Essa decisão não penaliza a rentabilidade do negócio?

JRG – Como dizia antes, em Espanha, já contávamos com uma sólida experiência que valida este modelo, baseado na proximidade com o cliente, mas também com o sócio. A nossa rentabilidade e o nível de serviço que somos capazes de oferecer estão, em boa medida, sustentados numa estratégia muito bem definida e numa rede logística desenhada para dar resposta a essa capilaridade e às conhecidas particularidades dos nossos retalhistas.

Com mais de 58 anos de experiência acumulada, sabemos dar resposta a um estabelecimento tradicional de 100 metros assente num território rural e, igualmente, a um de 500 metros localizado na capital mais evoluída ou, inclusivamente, sob o formato da Coviran Plus. É um dos nossos grandes atributos, dar uma solução eficiente e rentável para todos, apesar das grandes diferenças que possam existir entre os nossos sócios.

 

GC – O facto de conseguirem trabalhar lojas com diversos formatos é sinal dessa mesma capacidade de adaptação?

JRG – Efetivamente, a Coviran Plus é um magnífico exemplo. Através dele somos capazes de adaptar um modelo de loja com determinados serviços, sortido ou “layout” a diferentes metragens ou localizações muito díspares. Desde uma loja com 100 metros a uma de 1.000 metros, este modelo é rentável e tem como objetivo oferecer ao cliente uma grata experiência de compra através desta adaptação, fidelizando-o e atingindo muito bons resultados.

 

GC – A que se deve a aposta em Cabo Verde? Como surgiu a mesma? Porquê Cabo Verde? Que balanço pode fazer do curto período de tempo que leva em funcionamento

JRG – Cabo Verde, ou outros países dos PALOP, não estavam na nossa rota inicial. Tudo surge a partir do interesse que começaram a apresentar empresários africanos no nosso modelo de negócio, dada a evolução e notoriedade que a nossa marca começa a ter em Portugal. A partir daí, a afinidade, importante nos hábitos de consumo, e a capacidade de poder aumentar significativamente o volume de negócios fez-nos avaliar positivamente o desembarque.

Temos que reconhecer que, na Coviran, já temos experiência em operações completas em territórios periféricos e insulares, dado que estamos presentes na Madeira, Açores ou Canárias, mas, efetivamente, este é um desafio maior, ao tratar-se de um terceiro país e no continente africano.

Com tudo isso, estamos profundamente animados com este projeto, pois acreditamos que a experiência em Cabo Verde vai-nos permitir aprender e dar o salto posterior a outros países de língua lusa, como Guiné Bissau, Angola ou Moçambique.

 

GC – Trata-se de um laboratório para expandir para o continente africano? Em termos alfandegários, logísticos e fiscais, como é que a cooperativa vai dar resposta a este desafio? É uma oportunidade, um desafio ou as duas coisas?

JRG – Efetivamente, como já comentei, consideramos que, para experimentar o nosso modelo de negócio em África, um país como Cabo Verde poderia ser um cenário ideal, por diferentes motivos. Fundamentalmente, valorizamos positivamente tratar-se de um país com condições de estabilidade política e jurídica. Igualmente, a moeda do país está indexada ao euro e não existe risco de câmbio, assim como a enorme projeção económica que o país está a sofrer com a eclosão do sector turístico, foi o que nos fez valorizar que este devia ser o nosso laboratório.

Consideramos que o modelo de negócio da Coviran, baseado no modelo cooperativo, é exportável e ainda faz mais sentido ao ser para o continente africano, onde se necessita criar economia local e promover o empreendimento. Razões pelas quais acreditamos que Cabo Verde pode ser a alavanca que nos lance a outros países, dado que a criação de uma estrutura empresarial privada é um dos objetivos do governo cabo-verdiano.

 

GC – Há algum número de lojas predefinido a abrir em Cabo Verde?

JRG – Inicialmente, abrimos a primeira loja na capital da ilha de Sal, Espargos. Esta é a ilha de todo o arquipélago com mais desenvolvimento a nível turístico e com maior presença de investimento estrangeiro.

 O objetivo é analisar a evolução do negócio e, se tudo for como esperamos, poder abrir uma segunda loja na segunda localidade com mais habitantes, Santa Maria, antes do final do ano. Posteriormente, não descartamos ampliar a chegada a outras ilhas, como Santiago (cidade da Praia, que é a capital do país) ou São Vicente.

 

GC – O facto da primeira loja se situar na ilha do Sal visa, também, tirar partido do seu potencial turístico?

JRG – Efetivamente, acreditamos que a ilha de Sal é uma das que tem maior potencial de crescimento económico, por esse motivo, e por termos detetado que existe a necessidade de criar uma rede de supermercados para dar oferta diferenciada, não apenas ao turista, como ao consumidor nativo.

 Atualmente, na ilha do Sal, não existe um mercado bem organizado e que ofereça produtos de qualidade, mantendo todos os critérios exaustivos de segurança alimentar a preços competitivos.

Adicionalmente, as nossas lojas podem servir de suporte para aprovisionamento dos múltiplos estabelecimentos de hotelaria que se estão a criar.

 

GC – Esta situação vem demonstrar que o modelo de negócio da Coviran é exportável. A mesma é complementar com a expansão prevista para o mercado interno?

JRG – Com o salto de Espanha para Portugal, e com os resultados conseguidos desde essa data, ficou demonstrado que o projeto é exportável de forma bem-sucedida e rentável para o sócio e para a cooperativa, que, desta forma, ganha volume e um peso inquestionável no mercado ibérico.

Por outro lado, num mercado global, onde a competitividade passa por conseguir grandes economias de escala, não nos permite renunciar a expansão geográfica e para o exterior.

Contudo, a prioridade para a cooperativa passa, nos próximos anos, por consolidar a sua posição a nível ibérico, tendo sempre em aberto outras sinergias em mercados que possam aparecer.

 

GC – O modelo cooperativo de negócio é rentável para as partes que o integram?

JRG – Efetivamente. É um modelo rentável para os seus sócios e para todos os elos da cadeia, como avaliam os dados de 2018. Assim, no plano económico, permita-me destacar o crescimento do valor de negócio em 5,6%, assim como as vendas brutas sob insígnia alcançadas no passado exercício, com 1.372 milhões de euros. Deste valor, cerca de 134 milhões correspondem às vendas realizadas em Portugal e 1.238 milhões de euros a Espanha. Em relação aos lucros antes de impostos da cooperativa, o valor eleva-se até aos 1,42 milhões de euros, 13,6% mais que o ano anterior. Se fizermos referência ao lucro líquido da cooperativa, o valor mantém-se em termos similares a 2017, ascendendo a 0,95 milhões de euros.

No entanto, existe algo que não devemos ignorar e é o impacto que a Coviran tem no seu meio mais próximo como motor gerador de emprego e riqueza local. Não devemos esquecer que a nossa empresa se converteu numa revolução em muitos territórios rurais que padecem de investimento, apostando em fornecedores da zona, em muitos casos, cooperativas que nos fornecem ou que entregam ao sócio diretamente, alcançando, assim, uma maior adaptação aos gostos e particularidades locais. O nosso negócio integra-se no seu meio, é sensível às necessidades locais e, portanto, reverte no território uma parte importante do lucro criado. É importante que o cliente saiba que, quando compra num supermercado da insígnia Coviran, está a contribuir para a sua economia mais próxima.

 

GC – Os objetivos previstos para 2020 continuam a ser atuais? Ou preveem que sejam concretizados antecipadamente?

JRG – Com a evolução que apresentámos no primeiro semestre deste ano, em termos de crescimento de vendas e em novas superfícies comerciais, tudo indica que o objetivo marcado para este exercício está garantido. A nossa aspiração é chegar ao exercício de 2020 com 400 pontos de venda, mantendo-se outros objetivos, como o de consolidar o novo projeto Coviran Plus, o desenvolvimento da Escola de Comércio Coviran, cuja sede em Sintra foi inaugurada há poucos meses, ou a implantação cada vez maior do nosso programa de fidelização Clube Família nos pontos de venda.

Estamos a trabalhar para que a marca Coviran seja, nos próximos anos, cada vez mais reconhecida pelo consumidor português como uma marca de qualidade, confiança e prestígio, ao mesmo tempo que o nosso modelo de negócio se consolida como a melhor opção para o retalhista independente pela sua rentabilidade e solvência e também por ser uma fórmula mais social que cria emprego e riqueza, facilitando uma maior redistribuição do lucro criado no meio.

Este artigo foi publicado na edição n.º 58 da Grande Consumo.

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