Confiança. Palavra poderosa, ambicionada e utilizada por muitos, mas efetiva e garantida por poucos. A confiança é algo de difícil conquista, sendo a sua manutenção ao longo dos tempos ainda mais desafiante. É algo que não se obtém gratuitamente, nem tão pouco de imediato. É um processo evolutivo e gradual, que se constrói passo a passo, numa longa jornada de consistência, onde, ao longo do tempo, o cliente vai criando as suas expectativas e fortalecendo a sua capacidade preditiva face aos comportamentos dos seus fornecedores, os quais, ao responder positivamente e de forma continuada e consistente, contribuem de forma inequívoca e pragmática para a conquista da confiança, que, hoje, mais do que nunca, se torna um fator distintivo no mercado, dada a sua extraordinária escassez.
VUCA
E se a confiança é, de facto, importante no “normal” dia-a-dia das pessoas e organizações, torna-se efetivamente crítica em momentos de incerteza, volatilidade, ambiguidade e complexidade (VUCA), como aqueles que temos vivido, onde muitos dos padrões, certezas e aspetos dados como adquiridos, repentinamente, e nalguns casos sem aviso prévio, deixaram de ocorrer. De repente, vemo-nos confrontados com uma incapacidade desconcertante de prever comportamentos e padrões, surgindo agora desafios e dúvidas em praticamente todos os processos organizacionais, onde a garantia de cumprimento dos nossos deveres, obrigações e compromissos deixa de estar “pré-confirmada ou assegurada”, essencialmente porque não dominamos – de todo – a imensa panóplia de (novas) variáveis que nos rodeiam e afetam, direta ou indiretamente, pois não existe “track record” deste tipo de situações.
Impacto na supply chain
É, precisamente, quando analisamos a vertente mais efetiva e pragmática do efeito da confiança, ou o lado “negro” da falta da mesma, na Supply Chain, nos tempos mais recentes, que se torna visível – mais do que nunca – o seu impacto em diferentes níveis, como a gestão de stocks, nomeadamente, no incremento dos níveis de stock de forma a mitigar o risco de possíveis incrementos futuros de preços, entropia no abastecimento ou mesmo escassez. Consequência direta deste tipo de comportamento/ação é o aumento dos níveis de “working capital”, na medida em que força as empresas a reforçar o seu investimento em matérias-primas, produtos acabados e/ou armazéns secundários de apoio, incrementando simultaneamente o risco das depreciações daí decorrentes. Por outro lado, filosofias como o Just in Time tornam-se cada vez menos atrativas e exequíveis, pois o risco operacional, nalguns casos, já se sobrepõe ao benefício financeiro e de eficiência deste tipo de estratégias, o que leva a que as empresas tenham de adaptar a sua filosofia e estratégia também ao nível do “procurement”, sendo um dos seus lados mais visíveis a necessidade de encontrar fornecedores e/ou matérias-primas/produtos complementares ou alternativos, preferencialmente de carácter local ou regional, mitigando o risco de falha no abastecimento e de lead-times não concretizáveis, o que, em muitos casos, origina a que os custos unitários de aquisição sejam potencialmente mais elevados.
Independentemente do impacto ou de ações decorrentes da falta de confiança de cada organização, é inequívoco o aumento do nível de stress nas organizações e esforços adicionais requeridos para as ações de mitigação e planos de contingência necessários, que frequentemente levam a que outras áreas organizacionais, simultaneamente críticas, sejam colocadas em segundo plano, com todos os riscos e consequências que daí podem advir.
Em jeito de conclusão, diria que a confiança, mais do que nunca, vale ouro e deve ser preservada e valorizada, pois permitirá às organizações lidarem, de uma forma bem mais segura, serena e suave, com os desafios atuais e futuros, pois quando sabemos que podemos contar com o nosso parceiro, não só deixa de ser um potencial problema, como nos permite manter a estrutura e estratégia em curso e, simultaneamente, alocar recursos e foco a outras áreas.