O Livro da Sustentabilidade: as aventuras de Mowgli e Shere Khan!

Armando Mateus, Chief Experience Office Touchpoint Consulting
Armando Mateus, Chief Experience Office da Touchpoint Consulting

Qualquer semelhança entre o tema da sustentabilidade e a estória d’ “O Livro da Selva” de Rudyard Kipling não é uma mera coincidência, mas sim o resultado de um conjunto de ações que muito se assemelham a uma luta entre o bem e o mal, a uma “busca do necessário apenas”, nas palavras do sábio urso Baloo.

Falar de sustentabilidade parece estar na ordem do dia e, por isso expressões, como “ESG”, “neutralidade carbónica”, “consumidor consciente” ou “pegada ecológica” passaram a fazer parte do nosso léxico. E o mundo do retalho e do grande consumo rapidamente se apressou a responder a esta tendência, levando a cabo um conjunto de ações e fazendo saber ao mundo que está a tomar estas ações.

 

Green Marketing vs Greenwashing

Saber onde se traça a linha que separa “Green Marketing” de “Greenwashing” é fundamental e traz-nos à lembrança a cobra Kaa, bonacheirona e interesseira, que salva Mowgli quando sente que pode ganhar com isso. O julgamento da boa-fé de cada ação e de cada marca é feito pelo consumidor e muitos são os exemplos que causam perplexidade, como se a mera compensação carbónica fosse a carta de “sair da prisão” do jogo do Monopólio.

Mas a escolha do momento é igualmente fundamental, já que “não basta ser, há que parecer”! Ainda recentemente, uma marca de desodorizantes justificava a diminuição do tamanho da embalagem com uma maior eficiência da sua fórmula e com argumentos ambientais. Mas a dúvida ficou instalada na mente do consumidor: será que seria mesmo verdade ou será que a marca está a fazer “shrinkflation”, diminuindo o tamanho da embalagem e mantendo o preço?

 

Em que ficamos Rei Louie?

A medida mais emblemática desta forma de engano e voracidade foi a muito badalada substituição dos copos de plástico por uma solução supostamente mais sustentável, os copos de papel. Uma medida que parece ter sido emanada pelos indisciplinados e barulhentos bandar-log, uma tribo de macacos chefiada pelo Rei Louie, que tenta que Mowgli abandone a razão. A obsessão pelo combate aos plásticos conduziu a um remédio pior do que a doença, substituindo-se um produto que era alvo de reciclagem seletiva por outro que irá acabar nos aterros, sem capacidade atual de reciclagem real. Ainda recentemente, as declarações de duas das empresas de tratamento de resíduos eram emblemáticas desta situação: enquanto uma das empresas dizia que os consumidores deviam depositar os copos “de papel” (com plástico incluído) no “amarelo”, a outra empresa dizia que deviam ser depositados junto com os resíduos indiferenciados. Em que ficamos Rei Louie?

 

Sustentabilidade é um critério de escolha?

Mas será que o consumidor está disponível a premiar as empresas e marcas que são verdadeiramente responsáveis? Será que a sustentabilidade é um critério de escolha de uma loja? Será que o consumidor tem disponibilidade para suportar custos acrescidos de sustentabilidade, num momento em que a inflação bate à porta?

Os mais diversos estudos dizem-nos que quase 40% dos consumidores está disponível para pagar um premium por produtos amigos do ambiente ou sustentáveis e 67% já fez, pelo menos, uma compra de um produto mais caro por achar que é melhor para o ambiente. Mas o caminho é longo e o mesmo consumidor diz-nos que a adoção de escolhas mais sustentáveis vai demorar, porque os produtos são caros (82%) e porque não existem opções suficientes no sortido das lojas (52%). E é esta questão do preço e da oferta que ameaça o futuro da sustentabilidade, qual Shere Khan escondido atrás de cada árvore, de cada arbusto.

 

Inflação faz repensar escolhas

Ao analisar por geração de consumidor, o futuro parecia risonho, com as gerações mais novas (Millennials e Gen Z) a aderirem ainda de forma mais expressiva à escolha de opções mais sustentáveis.

No entanto, os primeiros sinais de alerta estão a surgir em países como Portugal, onde apenas 15% a 20% dos inquiridos garantem que manterão a escolha de marcas amigas do ambiente num clima inflacionista e de redução de rendimentos (Kantar, julho de 2022).

A verdade é que, do lado das marcas e dos retalhistas, tem sido feito um enorme esforço de mudar a oferta ao consumidor, mas também no que respeita às políticas internas e à forma como se pensa sobre sustentabilidade, num tripé que vai muito além da responsabilidade ambiental, incluindo a necessidade de ser socialmente justo e financeiramente viável. Ser sustentável é um compromisso com o ambiente e a sociedade como um todo, sejam eles os consumidores, os colaboradores ou os investidores. É, por isso, fundamental que as políticas adotadas se foquem na garantia de uma sociedade equilibrada e que responda às preocupações de todos. Não pode haver responsabilidade ambiental sem garantir o futuro dos colaboradores, não pode haver justiça social sem apoio às comunidades locais e sem apoiar os consumidores em maior dificuldade durante as crises económicas e sociais.

 

Um pequeno passo

Reduzir plásticos na marca própria, aumentar a sustentabilidade do pescado, lançar alternativas de alimentação mais sustentáveis ou digitalizar processos são apenas uma pequena face do que marcas e retalhistas levam a cabo para responder às necessidades e exigências dos consumidores, mas um sinal de que o caminho a percorrer será longo e exigente, qual a hábil e valente pantera Bagheera que ensina a caçar e a viver na selva.

A música do urso Baloo é contagiante, mas no que à sustentabilidade diz respeito, as marcas e os retalhistas não se podem limitar ao “necessário apenas”, precisam de ser proativas e tomar medidas que contribuam de forma radicalmente positiva e significativa. Os consumidores e o planeta assim o exigem!

Armando Mateus, Chief Experience Officer da TouchPoint Consulting International
Armando Mateus
Chief Experience Officer da TouchPoint Consulting

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